Perante a crescente automatização do trabalho, o economista Sérgio Rebelo considera fundamental a aposta na educação e formação dos trabalhadores para evitar a criação de grandes desigualdades.
A automação é há muito discutida pelo seu impacto no trabalho e nas relações laborais, pelo menos desde 1930 — relembra o economista Sérgio Rebelo –, ano em que John Maynard Keynes já previa para os seus netos um horário de trabalho muito reduzido graças em parte aos robôs.
O economista e professor universitário vai participar, estes dias 14, 15 e 16 de setembro, no encontro da Fundação Francisco Manuel dos Santos com o tema O Trabalho Dá Que Pensar, em Lisboa. O economista, juntamente com o cofundador da Wikipédia Jimmy Wales, o especialista em inteligência artificial Arlindo Oliveira ou o economista Jean Pisani-Ferry, ajudará a pensar os impactos das transformações sociais e económicas que mudam o mundo do trabalho.
Sérgio Rebelo é o Tokai Bank Distinguished Professor para a área de Finanças Internacionais na Kellogg School of Management, um ramo da prestigiada Universidade Northwestern e, em entrevista ao ECO, contemplou a possibilidade de que a maior automação — e presença de robôs — no local de trabalho venha aumentar as desigualdades salariais, assim como formas de prevenir estes impactos.
De que forma lhe parece que o mercado de trabalho tem de se adaptar a modelos de crescente automatização de tarefas? Redução de horas, por exemplo, seria uma solução?
Sim, essa tem sido uma das respostas ao progresso tecnológico. Nos últimos 150 anos, o número de horas de trabalho por trabalhador caiu cerca de 50%. O economista John Maynard Keynes escreveu em 1930 um livro chamado “As Possibilidades Económicas dos Nossos Netos”, em que previu que passadas duas gerações as pessoas trabalhariam apenas 15 horas por semana. Isso não aconteceu, mas a automação pode vir a tornar as previsões de Keynes mais próximas da realidade.
Referiu numa investigação recente a possibilidade de taxar os robôs para reduzir a desigualdade de rendimentos que se gera com a automatização. Em que situações poderia uma taxa deste tipo funcionar?
A automação aumenta a quantidade de bens produzidos na economia. Mas reduz os salários dos trabalhadores empregues em tarefas de rotina que podem ser feitas por robôs. Ao mesmo tempo, a automação aumenta os salários dos trabalhadores que fazem tarefas que não são de rotina.
Tributar a utilização de robôs introduz ineficiências na produção. Mas reduz a desigualdade de rendimento criada pela automação, sendo assim um instrumento útil quanto há automatização parcial. Quando todas as tarefas de rotinas forem automatizadas, deixa de fazer sentido tributar a utilização de robôs. Nessa altura, deixa de haver empregos de rotina pelo que tributar os robots torna a produção mais ineficiente sem melhorar a distribuição do rendimento.
Existem outras formas de combater as desigualdades que parecem estar subjacentes a um mercado de trabalho com maior automatização?
Sim, o investimento em educação e em formação profissional que permita aos trabalhadores encontrar outros empregos. Mas é um processo que demora tempo e que pode não resultar para todos os trabalhadores.
Os atuais modelos de medição da prosperidade económica dependem da produtividade humana? Como vai o futuro do trabalho afetar como medimos o sucesso de uma economia?
A medida de produtividade mais utilizada pelos economistas, a produtividade total dos fatores de produção continua a ser válida porque toma em consideração a contribuição do capital e do trabalho na produção. Mas esta medida é difícil de calcular com precisão. Por esta razão, utiliza-se muitas vezes como alternativa a produtividade média do trabalho que é simplesmente o produto produzido por hora trabalhada. Numa economia em que o capital venha a ser cada vez mais importante por causa da automação, esta medida será cada vez menos relevante.
Como vê a orientação do atual Governo para o crescimento? Parece-lhe que a longo prazo a sustentação nas exportações e no consumo interno é uma boa aposta?
Com a entrada de Portugal no euro, o acesso ao crédito externo melhorou e as taxas de juro baixaram. Esta baixa acabou por levar a grandes aumentos da despesa pública e do consumo privado financiados com dívida externa. Este processo de endividamento insustentável colocou Portugal numa situação muito difícil quando perdeu acesso ao mercado de capitais em 2011. A procura interna caiu e a reorientação para as exportações foi a única solução para a crise económica que o país viveu.
Estamos agora a assistir à continuação da recuperação da economia com algum crescimento do consumo interno em termos reais. Os trabalhadores e as empresas portugueses fizeram grandes sacrifícios para ultrapassar a crise. É importante continuar a implementar políticas que ajudem na criação de emprego e na continuação da redução do peso da dívida externa na economia nacional.
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Sérgio Rebelo: “Tributar o uso de robôs pode servir para reduzir desigualdades salariais”
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