No Dia Internacional das Raparigas nas TIC, a Pessoas falou com a presidente do .PT sobre os desafios no mundo digital, o perigo de agravar desigualdades e a possibilidade de criar oportunidades.
Depois de um significativo retrocesso no que toca à representação feminina na indústria das Tecnologias de Informação e Comunicação (TIC), Portugal conseguiu, no ano passado, elevar em 1.9 pontos percentuais o número de mulheres profissionais neste setor para 22%. Ainda assim está longe dos 26,2% registados há mais de 20 anos, e ainda mais distante da paridade de género na indústria. “Portugal tem vindo a fazer progressos nos últimos anos”, diz Luísa Ribeiro, mas “o caminho a percorrer é ainda longo e temos de o encurtar com medidas concretas e ações positivas”, reflete a presidente do .PT e a coordenadora-geral do INCoDe.2030, no Dia Internacional das Raparigas nas TIC.
Apesar de dizer com certeza que as metas no que toca à igualdade de género não serão atingidas já em 2023, ano estabelecido pela Organização das Nações Unidas com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável ODS), Luísa Ribeiro Lopes considera urgente “fazer um esforço para contrariar os números que dizem que só daqui a 60 anos podemos falar de igualdade nas profissões”. “A educação, o conhecimento e a liberdade de escolha são fundamentais para termos um mundo mais justo para todos”, acrescenta.
No Dia Internacional das Raparigas nas TIC — criado em 2011 pela agência especializada das Nações Unidas para as TIC com o objetivo de dar visibilidade à importância do empoderamento de raparigas e jovens mulheres e da sua participação nestas áreas científicas — a Pessoas falou com a presidente do .PT e a coordenadora-geral do INCoDe.2030 sobre os principais desafios no mundo digital, o perigo de agravar desigualdades, mas também da possibilidade de criar oportunidades.
Em Portugal, as mulheres especialistas em TIC representam apenas 1,8% do emprego total, face a 6,2% entre os homens. As profissionais nesta indústria passaram mesmo de 26,2%, em 1999, para 20,1%, em 2020. Em 2021, o número aumentou ligeiramente, para 22%. O que está a falhar?
Este é um problema global que temos de combater à escala mundial. Depois de algum retrocesso, Portugal tem vindo a fazer progressos nos últimos anos, ultrapassando a média europeia e alcançando os 22% de mulheres profissionais TIC, conforme os dados do Índice de Digitalidade da Economia e Sociedade (DESI) de 2021.
Não obstante, o caminho a percorrer é ainda longo e temos de o encurtar com medidas concretas e ações positivas no combate aos estereótipos de género que teimam em considerar as TIC profissões masculinas.
De que forma e com que tipo de medidas é que podemos eliminar o gender digital gap?
Eliminar o digital gender gap é uma prioridade de todos, do Estado, das empresas e do terceiro setor. O exercício pleno da cidadania passa pelo digital e só pode existir se houver igualdade no acesso, na educação, e no exercício das profissões TIC. Para que tal aconteça, são necessárias medidas e ações concretas. São exemplo disso: o programa Engenheiras Por Um Dia que promove, junto das estudantes de ensino não superior, a opção pelas engenharias e pelas tecnologias, desconstruindo a ideia de que estas são domínios masculinos, e que envolve uma rede de 81 entidades parceiras (11 das quais municípios), 47 escolas básicas e secundárias e 19 instituições de ensino superior.
De forma a robustecer o programa e a sua rede de parceiras, foi criada, em dezembro de 2021, a Aliança para a Igualdade nas TIC com a parceria de muitas empresas, incluindo o .PT, com foco na formação, capacitação, contratação e retenção de mais raparigas e mais mulheres para a área das tecnologias e engenharias. Ambos os projetos estão integrados na Estratégia Nacional para a Igualdade e Não Discriminação – Portugal Mais Igual em articulação com o Programa INCoDe.2030.
Existem ainda muitas empresas com políticas efetivas de atração e retenção de mais mulheres para as áreas tecnológicas e que estão a ditar a diferença.
De quanto tempo estima que vamos precisar ainda para ter paridade de género nas TIC?
Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável definem as prioridades e aspirações globais para 2030 e o ODS 5 é precisamente a igualdade de género. Pretende-se um planeta mais sustentável, ao mesmo tempo que a igualdade de género assume um papel fundamental para o futuro do planeta. Retirar as pessoas da pobreza e empoderar as mulheres é a via mais rápida para garantir a sustentabilidade do planeta. O empoderamento traz liberdade de escolha e quando a vida oferece mais opções às mulheres, elas fazem opções mais sustentáveis.
Já sabemos que não iremos alcançar estas metas em 2030, mas temos de fazer um esforço para contrariar os números que dizem que só daqui a 60 anos podemos falar de igualdade nas profissões.
A educação, o conhecimento e a liberdade de escolha são fundamentais para termos um mundo mais justo para todos. Já sabemos que não iremos alcançar estas metas em 2030, mas temos de fazer um esforço para contrariar os números que dizem que só daqui a 60 anos podemos falar de igualdade nas profissões.
Eliminar este gap é também uma questão urgente, face à escassez de talento digital sem precedentes que enfrentamos…
Sem dúvida. O mundo, a Europa e Portugal enfrentam um desafio enorme na captação de talento para o digital, e não podemos, nem devemos desperdiçar metade da população apenas e só por uma questão de desigualdade de oportunidades na escolha, exercício e liderança nas profissões TIC.
Esta revolução digital abre imensas possibilidades, no sentido de reter talento português e atrair estrangeiros. As empresas portuguesas estão a levar a sério esta possibilidade?
O processo de transição digital da economia e da sociedade constitui, a par da transição sustentável, os desafios que podem e devem colocar Portugal na linha da frente, sendo para isso essencial o processo de capacitação, sem deixar ninguém para trás e atraindo e retendo o talento essencial para o efeito.
As novas formas de trabalho que a digitalização permite são um potenciador para a atração de jovens qualificados a viver no nosso país, que oferece excelentes condições naturais, climáticas, de segurança, inovação e empreendedorismo.
A pandemia funcionou como um acelerador digital, mas também como um impulsionador da desigualdade. Qual dos lados da balança mais pesou?
É verdade que assim é. Mais do que nunca, temos hoje uma oportunidade única para optar entre aproveitar a aceleração da transição digital para melhorar as competências dos cidadãos, sem esquecer este importante fator de inclusão social que é a inclusão de género; ou deixar que esta crise, potenciada agora também por uma guerra na Europa, gere uma nova crise dentro da crise, e que vejamos o aprofundar das desigualdades com o aumento da percentagem de excluídos do digital por falta de competências.
A este ritmo corremos o risco de agravar ainda mais as desigualdades sociais? Qual o papel das políticas públicas?
Todas as crises sejam elas pandémicas, geradas por uma guerra, ou inflacionistas, tendem a aumentar as desigualdades e a potenciar retrocessos civilizacionais. Neste Dia das Raparigas nas TIC cumpre apelar a que o caminho feito seja caminho conquistado. As políticas públicas são essenciais para garantir a igualdade de acesso e, neste sentido, a Iniciativa Nacional de Competências Digitais (INCoDe.2030), a maior iniciativa de política pública nesta matéria, é fundamental para garantir que se ruma em prol de mais capacitação e maior igualdade.
Qual diria que é o maior desafio que Portugal tem pela frente agora, no que toca à transformação digital?
O maior desafio de Portugal é aumentar o nível de competências digitais dos cidadãos. Garantir que se reduz a exclusão digital, se aumenta o nível de qualificações digitais e se aposta na qualificação avançada em áreas como inteligência artificial, dados, blockchain, cibersegurança ou computação avançada.
O maior desafio de Portugal é aumentar o nível de competências digitais dos cidadãos. Garantir que se reduz a exclusão digital, se aumenta o nível de qualificações digitais e se aposta na qualificação avançada.
Tudo isto sempre com a garantia de que a igualdade de género estará sempre presente em todas as componentes de capacitação.
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“Não iremos alcançar a igualdade nas profissões em 2030”, diz Luísa Ribeiro Lopes
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