A Advocatus foi tentar saber junto das principais firmas o que vai mudar no escritório com a aprovação do novo regime das ordens profissionais, mas sem sucesso. Apenas duas firmas responderam.
Foi no dia 22 de dezembro de 2022 que foi aprovado em votação final global pelo Parlamento o projeto de lei relativo às ordens profissionais, que altera o regime jurídico das associações públicas profissionais, com votos favoráveis de PS, Iniciativa Liberal e PAN, votos contra de PSD, Chega e PCP e abstenções de BE e Livre. Esta aprovação gerou muitas críticas quer por parte dos partidos políticos, como o PSD e PCP, quer pelas Ordens Profissionais.
Quando chegou às “mãos” do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa decidiu pedir a fiscalização preventiva ao Tribunal Constitucional (TC). Uma ação que justificou com a necessidade de “certeza e segurança”.
Para o Presidente da República, o decreto da Assembleia da República (AR) suscitava dúvidas relativamente ao “respeito de princípios como os da igualdade e da proporcionalidade, da garantia de exercício de certos direitos, da autorregulação e democraticidade das associações profissionais, todos previstos na Constituição da República Portuguesa”. Desta forma, decidiu pedir a fiscalização ao TC.
Mas o TC, por unanimidade, considerou que a lei das Associações Públicas Profissionais é constitucional e que não desrespeita quaisquer princípios ou normas constitucionais.
Esta lei surge na sequência de inúmeros alertas da Comissão Europeia e da OCDE. Estes organismos consideravam que em Portugal existiam demasiadas restrições no acesso às atividades profissionais, prejudiciais à atividade económica do país.
Assim, a nova lei das Ordens Profissionais vai alterar questões como as condições de acesso às respetivas profissões, introduzir estágios profissionais remunerados e criar uma entidade externa para fiscalizar os profissionais. No texto final foram introduzidas alterações como precisões sobre as taxas cobradas durante o estágio e a possibilidade de serem reduzidas. A duração dos estágios fixou-se em 12 meses, podendo ser maior em casos excecionais. Outra das alterações foi a aprovação da existência de um órgão disciplinar, que não estava previsto na anterior lei-quadro, que prevê a fiscalização sobre a atuação dos membros das ordens profissionais, composto por elementos externos às profissões respetivas. Foram ainda introduzidas as sociedades multidisciplinares.
A Advocatus foi tentar saber junto das principais sociedades de advogados o que vai mudar nos seus escritórios, em concreto, com a aprovação do novo regime das ordens profissionais, mas sem sucesso. Abreu Advogados, CMS, Cuatrecasas, Miranda & Associados, Morais Leitão, Sérvulo & Associados e Vieira de Almeida não comentaram. Apenas duas firmas decidiram partilhar a sua posição.
Bruno Ferreira, managing partner da PLMJ, não antecipa que o novo regime mude “substancialmente” a realidade dos escritórios de advogados de maior dimensão, como a PLMJ.
“O tipo de atividade que desempenhamos e a natureza do trabalho que desenvolvemos e ainda a exigência do tipo de cliente – profissional, altamente exigente e sofisticado – já nos obriga a ter processos internos muito exigentes e uma organização interna robusta”, referiu.
O líder da PLMJ sublinhou ainda que para além da dimensão “mais operacional da prestação de serviços jurídicos” soma-se o “investimento” e o “cuidado” que colocam em desenvolver políticas focadas nas pessoas e que “vão beber às melhores práticas internacionais” e que fazem com que não antecipem mudanças significativas.
“A nosso ver, é bastante positivo que tenha deixado de existir incerteza em relação a esta temática e seria benéfico que se proceda o mais rapidamente possível às alterações para que exista clareza sobre as regras que se vão aplicar”, acrescentou.
José Luís Moreira da Silva, sócio da SRS Legal e presidente da Associação das Sociedades de Advogados de Portugal (ASAP), relembrou também que este novo regime ainda precisa de ser regulado em concreto para a Ordem dos Advogados, “em especial na parte relativa aos estágios profissionais e às sociedades multidisciplinares”. Assim, acredita que só depois dessa regulação é que é possível ter uma noção do que se terá de fazer.
“Em relação ao regime dos estágios, nada precisamos alterar, pois desde sempre remuneramos os estágios que se realizam na SRS. Se realmente o período do estágio se encurtar, o que ainda tem de ser regulado na Ordem dos Advogados também, estamos prontos para acolher os futuros colegas mais rápido”, explicou o advogado.
Já em relação às sociedades multidisciplinares, José Luís Moreira da Silva assegurou que neste momento a SRS não tem previsto nenhuma alteração, nem prevê transformar-se nesse tipo de sociedade. “Será um debate a abrir se e quando a questão realmente se colocar”, acrescentou.
Ordens Profissionais já começam a tomar posições
Segundo dados do Conselho Nacional das Ordens Profissionais (CNOP), existem atualmente em Portugal 20 ordens profissionais, tendo as duas últimas sido criadas em 2019, a Ordem dos Fisioterapeutas e a Ordem das Assistentes Sociais. Estas ordens regulam a atividade de mais de 430 mil profissionais. Descontentes, já começaram a manifestar-se.
Face à decisão do TC, a Ordem dos Advogados (OA) discordou e avançou que irá analisar a decisão e avaliar quais as melhores medidas a adotar.
“A OA não deixa de manifestar desde já a sua discordância em relação ao referido acórdão do Tribunal Constitucional, na medida em que é nosso entendimento que este diploma legal é atentatório do Estado de Direito, da autorregulação das associações públicas profissionais, bem como da defesa do interesse público”, referiram numa publicação do Facebook.
Já o bastonário da Ordem dos Médicos (OM), Miguel Guimarães, defendeu que o CNOP deve encontrar “outras alternativas” para contestar a nova lei das ordens profissionais.
“Vamos manter, obviamente, esta união, vamos caminhar juntos nessa situação e vamos ter de encontrar outras alternativas para contestar a legislação” que altera a regulação das ordens profissionais, adiantou Miguel Guimarães.
O bastonário da OM acredita que com a nova lei, ao nível da autorregulação, as “ordens perdem a essência daquilo para que foram criadas”. Ainda assim, assume que não vai desistir.
A Ordem dos Notários (ON) também anunciou que vai iniciar o processo interno de alteração dos Estatutos. Jorge Batista da Silva, bastonário da ON, sublinhou que quer garantir a “defesa do interesse público, intrínseco à função de notário, cuja natureza pública não deve ser colocada em causa”.
A ON referiu ainda que estão disponíveis para trabalhar com o Governo e com a Assembleia da República “num novo diploma regulatório que permita a prestação de mais e melhores serviços a cidadãos e empresas” e que garanta “a defesa do interesse público, intrínseco à função de notário, cuja natureza pública não deve ser colocada em causa”, disse Jorge Batista da Silva.
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Firmas de advogados não prevêem grandes mudanças com nova lei das Ordens Profissionais
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