Apetite de investidores imobiliários pelas residências sénior está a voltar. Em Portugal decorre a aquisição da Domus Vida pela CUF e a Core Capital vai alocar 22 milhões em mais430 camas para idosos.
A economia de prata (silver economy) encontrou no investimento em imóveis para residências sénior um novo impulso. Os lares arrecadaram um volume de investimento imobiliário de seis mil milhões de euros na Europa em 2024, o corresponde a uma subida de 48% em relação ao ano anterior, de acordo com os dados da consultora Cushman & Wakefield enviados ao ECO. Perante esta aposta, entrar nalgumas casas de repouso passou a ser uma experiência premium – e inacessível a todos os bolsos – que quase se confunde com o ambiente e serviços oferecidos por hotéis de renome, desde a qualidade dos quartos aos espaços exteriores.
Em Portugal, somam-se aquisições neste mercado só desde dezembro, como a CUF à Domus Vida – cujo processo ainda a decorrer – até à da luxemburguesa Unik Capital a três imóveis da Orpea por 70 milhões de euros. Já a Core Capital, através da marca Ser, anunciou que irá alocar 22 milhões em mais 430 camas para séniores.
“Os investidores estão a voltar a este tipo de imóveis, porque nalguns países da Europa houve um aumento generalizado dos salários que fez com que as pessoas tivessem mais dinheiro disponível para poder pagar outro tipo de serviços. E face à curva ascendente do mercado imobiliário, está outra vez a interessar aos potenciais investidores”, afirma Ricardo Reis, sócio e diretor do departamento de Avaliação & Advisory da Cushman & Wakefield.
A impulsionar está também o facto de os custos de construção estarem a subir de forma significativamente menos expressiva do que na pandemia, quando houve escassez de matérias-primas. Apesar da crise de mão-de-obra, que elevou os custos de construção nova em 3,9% em junho, as empresas têm mais perceção dos valores que vão gastar e do lucro final, de acordo com Ricardo Reis.
As empresas que “iniciaram projetos a longo prazo durante a Covid-19, e que ainda estão numa fase antes do desenvolvimento, tiveram os seus cálculos totalmente revistos. Provavelmente, alguns não avançaram nos projetos por estarem a contar gastar X e gastarem duas vezes X. O custo de construção tende a estabilizar e conseguem fazer estimativas melhores”, diz Ricardo Reis ao ECO.
Houve ainda um outro fator mais cultural: foi-se dissipando uma antiga (e errónea) dicotomia entre saúde e residências de idosos. Um idoso saudável não contrasta com a ida para o lar. A indústria foi percebendo que o mercado precisa de oferta para os mais velhos que têm vidas ativas e autónomas, para quem vai à rua e não precisa de acompanhamento diário, fisioterapia e muito menos cuidados paliativos.
Por “falta de companhia ou necessidades específicas” simplesmente pretendem um espaço para dormir, conviver, receber a família e amigos e ter serviços de apoio que vão da ginástica e ao cabeleireiro, massagista e esteticista, passando pela piscina interior e biblioteca.
Residências Montepio, Emeis, DomusVi e Naturidade são os quatro principais operadores privados em Portugal, gerindo um total de 2.860 camas em 30 unidades de alojamento sénior, o que representa uma quota de mercado de 10%.
“Existem investidores que querem entrar nesta área antecipando tendências, nomeadamente a do coliving senior, estruturas residenciais especialmente desenhadas para uma parte da população mais idosa, mas ainda independente e com um estilo de vida ativo”, corrobora Nuno Saraiva de Ponte, CEO da Via Senior, uma espécie de Booking dos lares.
A disponibilização de atividades culturais, workshops de culinária ou musicoterapia são o género de extras nos quais os operadores privados se empenham especialmente. Ainda assim, só representam 25% do total de camas disponíveis no país, tendo em conta que as residências sénior em Portugal se caracterizam por uma predominância de instituições sem fins lucrativos, que gerem aproximadamente 75% do total de camas.
“Portugal vive baseado numa estrutura pública. Vai ter de haver um melhoramento do rácio privado, porque o Estado não tem capacidade para dar resposta – e resposta de qualidade – às necessidades de uma população cada vez mais envelhecida. Se queremos que as pessoas com mais idade tenham realmente uma vida sã e com qualidade, temos de ter um bom sistema, quer de saúde quer de residências”, alerta o sócio da Cushman & Wakefield, Ricardo Reis.
"Vai haver uma estratificação ao nível de serviços (fisioterapia, apoio médico e de enfermagem…) e hotelaria (quartos mais bem decoradas, com melhor vistas)”
Até porque, neste caso, qualidade não significa quantidade. “É um mercado onde a qualidade tem vindo a aumentar ao nível das infraestruturas, do serviço oferecido e da diversidade de soluções. No entanto, num país que tem cerca de 750 mil pessoas com mais de 80 anos, para pouco mais de 100 mil camas, é evidente que a oferta não responde à procura”, adverte o CEO da Via Senior, Nuno Saraiva de Ponte.

Atualmente, o número de residências e casas de cuidados em Portugal ascende a 2.580 unidades com uma capacidade total de aproximadamente 106.200 camas. O país encontra-se a meio da tabela europeia em termos da taxa de equipamento, que representa a proporção de camas em relação à população com mais de 80 anos. A percentagem de 14,3% fica no intermédio entre Itália, que tem a mais baixa (6,6%) e a Bélgica, que lidera o ranking com 23,3%.
No futuro, espera-se que parcerias público-privadas desempenhem um papel fundamental no desenvolvimento de novas infraestruturas de saúde, onde as dificuldades de financiamento têm levado a oportunidades de venda e arrendamento. “Portugal teve uma espécie de wait and see em termos de investimento no primeiro trimestre e primeiro semestre. Existem agora muitas hipóteses de investimento no segundo semestre”, antecipa o partner da Cushman & Wakefield.
Aquisições de lares superam os 74 milhões em 2024
Ricardo Reis, sócio e diretor do departamento de Avaliação & Advisory da Cushman & Wakefield, considera que as fusões e aquisições (M&A) nas residências sénior são “uma tendência generalizada” e uma maneira de “ganhar eficiência de escala” e internacionalizar. As empresas de grande dimensão estão optam por esta estratégia para “terem massa crítica” ou reestruturarem o negócio, como aconteceu com a Emeis.
Certo é que as compras de ativos ligados a lares no último ano confirmam um contexto de rentabilidade mais atrativo, uma vez que yields de transações abaixo dos 5% deixaram de ser uma realidade na maioria dos países europeus, estabilizando entre os 5% e 5,75% (Portugal incluído com a prime yield nos 5,75% a fixar-se entre as mais elevadas), segundo o relatório “Marketbeat Nursing Home 2025”.

O CEO da Via Senior vai mais longe e garante que o core do negócio, as residências sénior para idosos com um grau de dependência superior (e necessidade de técnicos auxiliares, enfermeiros e médicos, além da alimentação, higiene e limpeza de roupa e quartos) “continuará a oferecer uma rentabilidade interessante fruto da procura deste tipo de produto, nomeadamente não inferior a 6- 7%”.
“Existe a necessidade de consolidação, até para se poder dar um melhor serviço, que poderá ser futuramente aproveitado por algum operador internacional que queira entrar em Portugal com a casa mais arrumada”, acrescenta Nuno Saraiva de Ponte, antecipando um aumento da procura “sofisticada” com “utentes mais exigentes” que se vão render a estas soluções.
“Continuarão a existir segmentos menos favorecidos e que precisam de apoio, pelo que as IPSS continuam a ter um papel muito relevante nesta área”, ressalva.
Sustentabilidade importa aos investidores
A análise da Cushman & Wakefield concluiu ainda que os critérios de sustentabilidade ambiental, social e de governança corporativa (ESG) ganharam importância nos processos de investimento devido à maior consciencialização e à obrigatoriedade legal.
“A tendência é a diminuição de custos de operação, que passa por eficiências energética e tecnológica. Hoje em dia, os investidores estão a ter isso muito em atenção. Para alguns, talvez mais avessos ao risco, não compram imóveis dedicados a este uso se não tiverem critérios ESG já implementados. Outros o que fazem, muitas vezes, é comprar unidades que já estão um bocado antiquadas e investem na sua atualização e modernização para poder ter estas eficiências e responder aos critérios”, explica o diretor de Avaliação & Advisory da Cushman & Wakefield.
Foco na preservação ambiental terá, por exemplo, o lar com 120 camas que o fundo francês Lifento está a construir em Cascais (deverá ficar pronto em 2026) na sequência da 10ª aquisição em Portugal da gestora de fundos imobiliários especializada em saúde.
O índice de dependência, que compara o número de idosos (com 65 ou mais anos) com a população em idade ativa (15 a 64 anos), aumentou significativamente na UE nos últimos 20 anos. A 1 de janeiro de 2025, fixava-se nos 34,4%, o que significa que existem pouco menos de três adultos em idade ativa por cada pessoa com 65 anos ou mais.
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Negócio dos lares é pouco grisalho. Investimento atinge 6 mil milhões na Europa
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