Como acelerar a inclusão energética global

  • Martim Salgado
  • 7 Janeiro 2025

Só na África Subsariana encontram-se 80% das pessoas sem acesso à eletricidade. Esta dura realidade reflete como a crise climática afeta de forma mais severa aqueles que menos contribuíram para ela.

Entre 2030 e 2050, as alterações climáticas poderão causar cerca de 250 mil mortes adicionais por ano, ameaçando reverter cinco décadas de progresso em saúde, desenvolvimento e redução da pobreza. Os eventos climáticos extremos dos últimos anos são sinais inegáveis da urgência por ações climáticas robustas. Segundo dados do Copernicus é já certo que 2024 será o ano mais quente desde que há registo. Este aumento de temperatura agrava desastres naturais e aprofunda desigualdades: nas regiões mais vulneráveis, a mortalidade causada por fenómenos meteorológicos extremos é 15 vezes maior do que nas regiões mais desenvolvidas.

Acredito que a transição energética possa ser uma das chaves para mitigar esta crise climática e promover uma maior justiça social. Uma das soluções passa pelo aumento da inclusão energética e a expansão de energias limpas. No entanto, para ser eficaz, esta transição precisa de ser equitativa, alcançando as populações mais vulneráveis.

Aproximadamente 1,18 mil milhões de pessoas vivem em situação de pobreza energética, e cerca de 700 milhões ainda não têm acesso à eletricidade. Só na África Subsariana encontram-se 80% das pessoas sem acesso a este recurso essencial. Esta dura realidade reflete como a crise climática afeta de forma mais severa aqueles que menos contribuíram para ela.

De acordo com o discurso de Al Gore na recente COP29, “O estado da Flórida tem mais painéis solares do que todo o continente africano” e “África tem 60% do potencial solar de todo o mundo”. Enquanto algumas regiões avançam rapidamente, outras, como África, permanecem subaproveitadas, apesar do seu imenso potencial. Corrigir essa desigualdade deve ser uma prioridade global. Canalizar investimentos para explorar a energia renovável e aumentar o acesso à energia não é apenas uma solução para o déficit energético, mas uma oportunidade de liderança na transição global para fontes renováveis.

Iniciativas como o Fundo de Acesso à Energia (A2E) têm vindo a demonstrar como podemos direcionar esforços de forma eficiente. Em 2018, a EDP lançou este programa de financiamento para apoiar projetos de energias renováveis que promovam o desenvolvimento ambiental, social e económico das comunidades rurais nos países em desenvolvimento. O fundo já apoiou 47 projetos em países como Moçambique, Malawi, Nigéria, Quénia, Tanzânia, Angola e Ruanda. Desde o lançamento, o programa totaliza um investimento de 4,5 milhões de euros, beneficiando diretamente mais de meio milhão de pessoas e impactando indiretamente mais de 8 milhões.

Este ano, na sexta edição do programa, foram selecionados nove projetos de energia renovável que promovem a inclusão energética em países africanos, com foco na implementação de tecnologias de produção de energia solar descentralizada em diversos setores. Entre as iniciativas destacam-se a eletrificação de clínicas rurais e estabelecimentos de ensino, o fornecimento de ambulâncias movidas a energia solar, a instalação de sistemas solares em maternidades para garantir cuidados 24 horas por dia, o acesso à internet, a distribuição de lanternas solares ou a implementação de sistemas de energia para assegurar o acesso a água potável. O financiamento destes projetos traduz-se em impactos reais na vida de milhares de pessoas.

Por exemplo, várias crianças no bairro de lata de Dandora, em Nairobi, no Quénia, que agora têm luz na sua escola, podem aprender, ler e fazer os seus trabalhos escolares mesmo após o anoitecer. Além disso, duas comunidades em Nsanje, no Maláui, passaram a ter acesso a água potável graças a um sistema solar que filtra e depura a água dos poços. Outro exemplo é o de uma vendedora de peixe no mercado de Lagos que, com arcas refrigeradoras alimentadas por energia solar, consegue conservar os produtos por mais tempo, aumentando assim o rendimento familiar. Há também um sapateiro residente num campo de refugiados no Ruanda que duplicou o seu rendimento por ter máquinas ligadas ao sistema solar, o que lhe permite ser mais eficiente.

Precisamos de ações imediatas para enfrentar a crise climática e transformar desafios em oportunidades. O compromisso com a energia limpa não é apenas uma questão ambiental, mas também uma oportunidade para promover maior inclusão, independência e segurança energéticas. Para isso, são necessárias políticas bem definidas e financiamento adequado. Iniciativas como esta demonstram que uma transição energética justa é viável, mas ainda exige muitos esforços coordenados. O tempo para agir é agora – o futuro depende das decisões que tomarmos hoje.

  • Martim Salgado
  • Responsável Global de Impacto Social da EDP

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