Empresas sociais – Vamos potenciar os negócios sociais?
Não seria mais fácil aprovar um regime que regulasse esta realidade, ao invés de se andar constantemente a adaptar regimes que estão pensados para outros fins?
Nos últimos anos temos testemunhado um crescente interesse por modelos de negócio direcionados à resolução de problemas sociais e ambientais, simultaneamente criando riqueza – os negócios sociais.
Pelo mundo fora, têm-se criado enquadramentos jurídicos mais favoráveis para dar resposta a estes problemas sociais e ambientais (e.g. Community Interest Companies, no Reino Unido, as Società Benefit, em Itália, e as Entreprises Sociales, na Bélgica), tendo, assim, “nascido” as empresas sociais, enquanto figura que combina viabilidade económica com responsabilidade social, numa abordagem comercial mais sustentável.
Em termos simples, e considerando aquela que é a experiência internacional relevante, as empresas sociais são sociedades comerciais que desenvolvem fins sociais / do interesse da comunidade e cujo lucro obtido é maioritariamente reinvestido naqueles fins e não distribuído pelos seus sócios.
Porém, em Portugal, a legislação vigente não prevê esta possibilidade, ficando assim vedado às sociedades comerciais prosseguir tais fins, porque considerados não lucrativos.
Esta circunstância, conjugada com a ausência de um regime específico – que já esteve em consideração aquando da aprovação da Lei de Bases da Economia Social em 2013 – faz com que os agentes da Economia Social acabem por ter de recorrer às figuras do setor não lucrativo, em particular das associações (mas também das fundações e cooperativas), para a prossecução de tais fins, figuras essas que não se encontram ajustadas às finalidades pretendidas, nem possuem a agilidade necessária, limitando o potencial que tais negócios sociais poderiam ter. Dois exemplos:
Estrutura de governo e funcionamento: se ao invés de uma sociedade comercial, formos forçados a utilizar uma forma jurídica diferente, tipicamente a de uma associação, o seu funcionamento não será tão ágil e eficiente.
Nas associações, a estrutura de governo baseia-se no princípio do associativismo, sendo a assembleia geral o órgão máximo de decisão, representando a vontade coletiva dos associados. Este modelo promove a participação democrática, mas pode resultar em processos de decisão mais lentos e burocráticos.
Por outro lado, nas sociedades comerciais, a gestão é mais centralizada, com as decisões frequentemente nas mãos dos órgãos de gestão, permitindo uma maior agilidade e eficiência operacional, sendo que esta estrutura pode ser mais eficaz para responder rapidamente às oportunidades e desafios do mercado.
Financiamento: as associações e fundações dependem largamente de (insuficientes) donativos, subsídios e financiamento público, o que pode limitar o seu crescimento e a sua sustentabilidade a longo prazo. Por outro lado, estas formas de financiamento tipicamente não trazem associado qualquer vínculo, tratando-se antes de atos isolados e com finalidade altruística.
Diversamente, nas sociedades comerciais a participação no capital social está normalmente associada a um compromisso no desenvolvimento da atividade da sociedade e na capitalização da mesma para a dotar dos meios para prosseguir a sua atividade. Esta capacidade de angariar capital é uma vantagem significativa para expandir operações e aumentar o impacto negócio.
Adicionalmente, numa estrutura societária o acesso a financiamento bancário também é tendencialmente mais facilitado.
Em contraponto, as associações (e demais entidades do setor não lucrativo) podem beneficiar de acesso a um tratamento fiscal mais favorável, sendo ainda elegíveis para se candidatar ao estatuto de utilidade pública ou equivalente, com os respetivos benefícios associados.
Acontece que estes benefícios não suplantam o que as entidades perdem. Além de que podem, se o legislador assim o quiser, vir a ser também atribuídos às empresas sociais.
Feito este enquadramento pergunta-se: não seria mais fácil aprovar um regime que regulasse esta realidade, ao invés de se andar constantemente a adaptar regimes que estão pensados para outros fins?
Parece-nos que sim, pelo que fica o convite a fazê-lo, não ignorando, no processo legislativo, os bons exemplos internacionais e a necessidade de ouvir os stakeholders relevantes do setor, para garantir que a legislação atende às necessidades e realidades específicas do mesmo.
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