Entretanto e entre praias
Quando finalmente deixo o Tofo, que afinal é das praias menos naiçes (do inglês nice) que tenho pela frente, faço escala em Inhambane.
Inhambane é adorada em todo o país, cidade alentejana a bater sorna à beira mar. Eu cá, dou voltas às ruas pintadas, a jogar à apanhada com a corrente de ar. As paredes têm cor de tinta com água e quem está bem atento, sabe que aqui o tudo acontece entre o quase e o nada.
A fama de Inhambane começou com Vasco da Gama que aqui chegou num dia de chuva e foi convidado a entrar em casa dos locais, com uma frase em Bitonga que soava a “Inhambane”. O convite virou cidade e Vasco ofereceu-lhes o cognome “Terra de Boa Gente”. A confirmar por quem quer que cá venha. Esta gente tem sorriso mais fácil que tabuada do um.
Daqui sai-se num ferry bem “vintage” para Maxixe, onde se apanha um chapa no qual vou passar as próximas seis horas a roer o assento da frente e a contar ultrapassagens insanas. “Nem carta para conduzir rebanhos esta gente devia ter.” É o pensamento que a cabra que levamos a espernear em cima do tejadilho, deve estar a ter.
Mas depois chegamos à praia de Vilankulo e temos que ir buscar um ser mitológico para descrever o que vemos. Uma praia fénix. Que todos os dias morre e renasce da areia. Cemitério de barcos e berço de aquário. Um milagre à Moisés para chegarmos às ilhas prometidas. Podíamos ir a pé mas íamos precisar de muita fé. E por 60€ vamos de barco e é uma fezada.
Bazaruto, Benguerra, Santa Carolina, Bangue e Magaruque não são sítios na terra: são produtores mundiais de postais, catálogos de agência de viagem e fundos de computador. É nestas ilhas que os recém-casados vêm fazer aquelas 5432 fotografias de Lua de Mel que ninguém vai ter pachorra para ver.
Há mangais, corais, dunas e dugongos (é uma espécie de golfinho sem paciência). Areia em pó, água azul-néon e um snorkeling tão hipnotizante que uma pessoa vai precisar de uma semana só para curar o escaldão nas “costas”.
Na verdade, não há razão nenhuma para um ser vivo deixar este paraíso. Muito menos para arriscar três dias de Moçambique-Dakar (a estrada foi feita pelos mesmos tipos que empedraram a Lua). Nenhuma razão para ver a espetacularidade da Gorongosa a 120 km à hora, em sentido contrário, debaixo de chuva intensa. Nenhuma razão para ficar apeado, em cruzamentos manhosos, ao cair da noite, sem sítio para dormir. Nenhuma razão para ficar em motéis de filmes de terror, daqueles onde se dorme de luz acesa. Nem uma razão para tanta irracionalidade.
Bom, na verdade…até há uma.
Mas qual será?
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Crónicas africanas são impressões, detalhes e apontamentos de viagem da autora e viajante Mami Pereira. Durante quatro meses, o ECO vai publicar as melhores histórias da viagem, que pode ir acompanhando também aqui e aqui.
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