(In)Tangíveis do ESG
Como, então, podemos sincronizar efetivamente as dimensões ambiental, social e de governança (E, S e G) para não apenas sobreviver, mas prosperarmos juntos?
No início do mês de maio assistimos às devastadoras inundações que tomaram conta do estado do Rio Grande do Sul, no Brasil, e tivemos a nossa capacidade de resposta coletiva ao aquecimento global ser severamente testada. Este desastre climático, que afetou aproximadamente 1,5 milhões de pessoas e 85% dos municípios do estado, serviu como um lembrete doloroso e urgente dos desafios ambientais atuais.
A necessidade de limitar o aquecimento global a 1,5 graus Celsius sempre foi uma prioridade, mas a cada evento extremo como este, sentimos a urgência de agir juntos de forma mais intensa e concreta. Atentos a tudo isto e integrando este ecossistema, partilhamos o desejo de ser parte da mudança.
Contudo, mesmo estando munidos de uma quantidade sem precedentes de informações, a confusão muitas vezes prevalece. Como, então, podemos sincronizar efetivamente as dimensões ambiental, social e de governança (E, S e G) para não apenas sobreviver, mas prosperarmos juntos? Entender como estas áreas estão interligadas é fundamental, pois elas são as bases para um desenvolvimento sustentável e que efetivamente pode pavimentar o caminho para um futuro mais resiliente.
Implementar mudanças tangíveis no âmbito do ESG implica definir ações concretas e mensuráveis para as empresas, e, apesar do tema já estar a ser amplamente discutido sob a ótica de diferentes indústrias, persistem ainda diversos desafios. Desde a definição de processos internos e medidas para que as empresas possam medir as suas pegadas de carbono, até à definição de métricas para aferir o bem-estar, o caminho para resultados tangíveis no ESG é complexo.
Os stakeholders enfrentam dificuldades em harmonizar padrões, cálculos e métodos de relatório. Além disso, o diálogo necessário entre as diversas entidades — empresas, governos e sociedades civis — é muitas vezes dificultado por desalinhamentos e falta de protocolos claros de comunicação.
Um exemplo prático é o que se observa com a Declaração Ambiental de Produto (DAP), um documento que está a ganhar cada vez mais foco no setor da construção civil. Esta declaração, que detalha o impacto ambiental de produtos, como materiais de construção, é fundamental na Análise de Ciclo de Vida (ACV) dos edifícios. Contudo, a digitalização incompleta das variantes dos produtos nas DAPs leva a inconsistências nos dados usados nas ACVs, comprometendo a precisão das análises. A precisão destas avaliações melhoraria significativamente se as normas que regem as DAPs fossem ajustadas de modo a considerar o processo de cálculo das ACVs.
Entretanto, mesmo que este seja um problema técnico que pode tornar a ACV menos precisa, isso não isenta o grande benefício de mensurar as emissões das edificações e definir estratégias para reduzi-las. E aqui revisitamos uma velha máxima: antes feito do que perfeito.
As mudanças intangíveis devem estar também no âmbito das medidas do ESG quando falamos, por exemplo, dos trabalhadores.
Olhando ao valor dos custos da perda de produtividade das empresas portuguesas devido ao absentismo e ao presentismo causados pelo stresse e problemas de saúde psicológica, publicado pela ordem dos psicólogos, falamos de 5,3 mil milhões de euros no ano de 2022. Já os valores de burnout, nos Milllenials, representam 53% da razão das faltas ao trabalho.
Em Portugal, os problemas de Saúde Psicológica mais comuns (stresse, depressão ou ansiedade) afetaram quase dois em cada cinco trabalhadores/(33%) no último ano devido ao trabalho, uma prevalência acima da média da União Europeia (27%), conforme refere o Eurobarómetro de 2022.
Factualmente os nossos trabalhadores estão no seu limite, assim como o planeta. Como trabalhar para reduzir e melhorar as condições de trabalho para que se possa baixar estes valores assustadores?
O desafio colocado às organizações não só passa por mudanças tangíveis como referimos na primeira parte do texto, relativas ao ambiente, mas por medidas concretas de investimento no bem-estar dos trabalhadores medindo à posteriori o intangível como a felicidade no trabalho. Se por um lado a felicidade no trabalho depende de relato do trabalhador e inclui por si só subjetividade, por outro, sabemos que ações concretas das organizações na criação de bem-estar tem correlação positiva no sentimento de felicidade.
Ao alcance de todas as empresas estão ações que podem atuar nos fatores de promoção de bem-estar (como refere a NP 4590:2023): necessidades físicas e necessidades psicossociais, sejam elas as expectativas de segurança; as expectativas de pertença; as expectativas de reconhecimento e as expectativas de autorrealização.
Sabemos que o bem-estar no trabalho pode também contribuir para a qualidade de vida fora do trabalho. Se pensarmos que um pai e uma mãe “de bem” com o seu trabalho podem ter capacidades melhoradas de envolvimento familiar que impacta diretamente na vida dos seus filhos, em processo de crescimento e desenvolvimento, estaremos a criar famílias mais saudáveis onde o ambiente para uma boa educação é propício. Assim, as gerações que vêm terão muito a ganhar com ambientes familiares mais seguros e tranquilos, consequência do cuidado que cada organização pode ter com os seus trabalhadores criando bem-estar e felicidade organizacional, por si só!
Como observámos tanto nas mudanças tangíveis, como nas intangíveis, necessitamos de uma governança capaz de entender todos estes múltiplos desafios complexos.
Apelamos aos líderes para que o foco das medidas do ESG esteja primeiramente na iniciativa. A precisão e a perfeição ficarão para depois. Precisamos de movimentações eficazes. É navegando por estes desafios que determinaremos o nosso sucesso em fazer avanços substanciais para um futuro sustentável e que estas mudanças não sejam apenas performáticas.
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