Mudam-se os tempos… mudam-se as vontades?
O teletrabalho pode contribuir ativamente para que ambos os elementos do casal tenham uma atitude igualmente ativa face ao trabalho, mas também face à esfera privada.
A normalidade, aquela que conhecíamos, foi abruptamente interrompida em março do ano passado, quando, de um dia para o outro, fomos confrontados com um confinamento inesperado.
Subitamente, tudo mudou nas mais variadas áreas das nossas vidas: as escolas fecharam e o ensino passou a fazer-se on-line, as lojas de bens considerados não essenciais fecharam e as compras passaram a fazer-se on-line, os ginásios fecharam e as plataformas digitais de treinos proliferaram e o teletrabalho tornou-se obrigatório sempre que fosse compatível com a atividade desempenhada e o trabalhador dispusesse de condições para as exercer.
Hoje, vivendo novo estado de emergência e novo confinamento em moldes muito semelhantes ao vivido nos meses de março e abril do ano passado, o on-line parece tornar-se o “novo normal” e o teletrabalho, figura que até aqui tinha encontrado bastante resistência por parte de algumas empresas que não prescindiam do exercício direto e imediato do poder de direção sobre o trabalhador, instalou-se.
Diria que se instalou de forma diferente em cada casa. Se muitas o acolheram de bom grado, pois encaram-no como um instrumento que contribui para a melhoria da sua qualidade de vida e para uma melhor conciliação entre a vida profissional e a vida privada, outras só o concebem num cenário em que as escolas estejam abertas e possa haver uma separação entre o plano profissional e o plano familiar.
Admito que o contexto em que o teletrabalho foi implementado nos últimos meses não foi, assim, o ideal para que a sua imagem seja imaculada. Mas a verdade é que bem utilizado e num contexto de voluntariedade (que não é o atual), o teletrabalho revela-se uma ferramenta que apresenta enumeras vantagens transversais: contribui para uma melhoria ambiental, nomeadamente pela redução da poluição e do trânsito, as empresas vêm uma redução considerável dos custos fixos associados à presença contínua do trabalhador nas suas instalações (será mesmo necessária a existência de instalações com as dimensões que muitas organizações suportam atualmente?), e permite aos trabalhadores a redução ou mesmo eliminação do tempo gasto na deslocação entre casa e trabalho-casa e uma preciosa flexibilização da gestão/organização do seu tempo de trabalho.
Para além destes benefícios, o teletrabalho surte até efeitos em áreas talvez (infelizmente) menos óbvias como a promoção da igualdade de género (entendido como a construção social dos papéis masculinos e femininos, refira-se) no mercado de trabalho.
Na verdade, o teletrabalho pode contribuir ativamente para que ambos os elementos do casal tenham uma atitude igualmente ativa face ao trabalho, mas também face à esfera privada. Atualmente, arrisco dizer, que são já muitos os homens que querem desempenhar de forma mais ativa o seu papel de pai e que muitas vezes lhes é vedado pelo cumprimento de um horário rígido e uma ausência física imposta pelo desempenho de funções nas instalações da sua empresa. Permite, por exemplo, no caso de famílias monoparentais, em que existe uma óbvia sobrecarga das responsabilidades familiares no pai ou na mãe, uma maior e mais fácil conciliação entre a vida profissional e a vida familiar.
Porém, apesar das vantagens inegáveis, será que esta implementação forçada do teletrabalho contribui para quebrar as antigas resistências a esta figura, que mais não é do que um instrumento de flexibilização do modo como se desenvolve a relação laboral?
Os tempos estão a mudar e torna-se essencial acompanhar a mudança.
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