O dever de confidencialidade dos administradores não acaba com o fim do mandato

  • Tomás Almeida Ribeiro e Manuel Sequeira
  • 29 Maio 2023

Tanto a sociedade como os administradores ficam a ganhar em clareza e certeza jurídicas com a celebração de um contrato de administração, onde fiquem expressamente acordados os direitos e deveres.

A cessação do mandato dos membros do órgão de administração de uma sociedade comercial, (independentemente da causa) é usualmente um momento delicado e relevante. No exercício das suas funções de gestão, os administradores (e os gerentes, mas para simplificação da leitura serão conjuntamente designados por administradores) devem observar deveres fiduciários, sendo os mais importantes o dever de cuidado e o dever de lealdade.

Uma vez que os administradores têm interesses próprios que podem nem sempre estar completamente alinhados com os interesses dos acionistas, o dever de lealdade dos administradores assume um papel proeminente. Por essa razão, as informações sensíveis a que os administradores têm acesso no desempenho das suas funções têm de ser juridicamente protegidas, para salvaguarda do negócio da empresa

É cada vez mais importante as sociedades regularem as relações com os seus administradores, através de contratos de administração onde se prevejam os principais direitos e deveres do administrador durante o exercício das funções, bem como após o termo do mandato. Tipicamente, as empresas preocupam-se em assegurar que, durante um determinado período após a cessação de funções, o administrador tem uma obrigação de não concorrência (non-compete), não solicitação e aliciamento de colaboradores (non-solicitation) e de confidencialidade (confidentiality), mediante uma remuneração. No entanto, entre nós, a celebração destes contratos de administração é infelizmente escassa, pelo que a generalidade das relações da sociedade com o ex-administrador é regulada apenas pelas disposições legais aplicáveis.

Ainda assim, apesar de tal não se encontrar expressamente previsto na lei, os deveres fiduciários (incluindo o de sigilo) não terminam com o fim do mandato, não podendo os administradores usar informações confidenciais da empresa em benefício próprio ou de terceiros, nem em prejuízo da sociedade e dos respetivos acionistas onde previamente exerceram o cargo. Mesmo após deixarem os seus cargos, os administradores continuam obrigados a manter a lealdade perante os acionistas e a sociedade, embora naturalmente com uma intensidade diferente em virtude do termo das suas funções. No entanto, o dever de confidencialidade e sigilo sobre informações sensíveis e/ou confidenciais da sociedade a que os administradores acederam durante o seu mandato, mantêm-se durante o período posterior, com uma intensidade proporcional à sensibilidade da informação conhecida.

Assim sendo, a violação dos deveres de confidencialidade, mesmo após a cessação do mandato, pode gerar responsabilidade dos (ex-)administradores, podendo a sociedade onde anteriormente exerceram funções exigir-lhes uma indemnização para compensar quaisquer danos que sofra em resultado da violação do referido dever de confidencialidade. Por não haver lei expressa sobre o tema, terá de se analisar no caso concreto se o dever ainda estava em vigor e qual a sua intensidade no momento da prática dos atos pelo ex-administrador, para verificar se esses atos (ainda) são ilegais e, se danosos, indemnizáveis nos termos gerais do direito.

Sem prejuízo, reforçamos que tanto a sociedade como os administradores ficam a ganhar em clareza e certeza jurídicas com a celebração de um contrato de administração, onde fiquem expressamente acordados os direitos e deveres de cada parte, durante e após o termo do mandato.

  • Tomás Almeida Ribeiro
  • Associado coordenador da área de Corporate M&A da PLMJ
  • Manuel Sequeira
  • Associado sénior da área de Corporate M&A da PLMJ

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