Um risco político chamado Trump
Com a eleição de Trump, entrámos numa fase da economia global em que os riscos políticos estão a aumentar para todas as empresas que dependem das exportações e dos investimentos externos.
Cada vez mais as multinacionais e os fundos de investimento incluem a análise dos riscos geopolíticos e políticos nas suas estratégias de investimentos. Recentemente, a consultora Oxford Analytica publicou os resultados de um inquérito sobre riscos políticos a 20 CEOs de empresas globais. As conclusões do estudo não deixam dúvidas.
Cerca de 90% dos CEOs consideram que os riscos políticos aumentaram nos últimos cinco anos e deverão continuar a crescer. Cerca de 60% admitiram que os riscos políticos não só têm um impacto grande nas actividades das suas empresas como já causaram perdas financeiras. 70% afirmaram que usam de um modo sistemático análises, produzidas internamente ou por consultores externos, para mitigar os riscos políticos. Mais importante, e até surpreendente, metade dos inquiridos disseram que os acionistas esperam dos seus CEOs a preparação adequada para lidar com os riscos políticos. Há mesmo uma pressão mais forte por parte dos investidores para as equipas executivas incluírem a análise dos riscos políticos nas suas estratégias comerciais.
De acordo com a maioria dos participantes no estudo, nos últimos anos os riscos políticos deixaram de ser um exclusivo dos mercados emergentes e chegaram ao mundo desenvolvido e industrializado. O que se costumava chamar o ‘Ocidente’ deixou de estar imune aos riscos políticos. Os riscos na Europa e nos Estados Unidos preocupam cada vez mais os investidores e os executivos das empresas globais. Na Europa, os principais riscos políticos vão desde o Brexit ao crescimento dos populismos na Alemanha, em França e em Itália passando pelo risco de fragmentação da Espanha. Teremos muitas ocasiões para regressar aos riscos políticos europeus.
Hoje, interessa-me tratar do risco norte-americano causado pelo comportamento do seu presidente. Donald Trump anunciou no final da semana passada a imposição de tarifas alfandegárias de 25% às importações de aço e de 10% às de alumínio. Este anúncio decisão mostra desde logo o comportamento errático do presidente norte-americano. Sabe-se que os seus principais conselheiros dos assuntos económicos e para a segurança nacional são contra a adopção de medidas protecionistas. Mas, aparentemente, a oposição tem sido insuficiente. Além disso, Trump justificou a sua medida como uma defesa contra os produtores chineses. Mas os mais prejudicados serão as indústrias de países aliados, nomeadamente o Canadá, o México, o Brasil e os europeus, sobretudo a Alemanha. Estes são os principais exportadores de aço e de alumínio para os Estados Unidos.
Se Trump avançar com estas medidas, poderá iniciar uma guerra comercial com implicações globais. Os europeus já anunciaram que vão retaliar, começando por aumentar as tarifas de importação de produtos americanos como o Bourbon, as Levis e as Harley Davidson. Mas a União Europeia não ficará por aqui. A Comissão Europeia vai, muito provavelmente, fazer uma proposta legislativa para aumentar a carga fiscal sobre as grandes empresas de Silicon Valley, como a Google, o Facebook e outras gigantes tecnológicas como a Amazon e a Apple. Bruxelas já estava sob pressão vinda de Paris para apresentar legislação fiscal, mas se Trump avançar para o aumento das tarifas, tornar-se-á bem mais difícil resistir ao protecionismo europeu.
Para protegerem as suas indústrias, os europeus serão forçados a a adoptar medidas comerciais contra os produtores brasileiros, canadianos, japoneses, russos e chineses. Será o modo mais eficaz de defender a indústria europeia no curto prazo.
Mas a guerra comercial dificilmente ficará pela resposta europeia. As tarifas sobre produtos de consumo americanos e a nova legislação fiscal contra o sector tecnológico não ajudam em nada as empresas europeias de aço. Por isso mesmo, os países europeus já começaram a discutir o que na linguagem do comércio internacional se chama medidas de proteção para defender os produtores do aço e do alumínio. Para protegerem as suas indústrias, os europeus serão forçados a a adoptar medidas comerciais contra os produtores brasileiros, canadianos, japoneses, russos e chineses. Será o modo mais eficaz de defender a indústria europeia no curto prazo. Muito provavelmente, uma decisão protecionista de Trump acabará por afectar seriamente os sectores do aço e do alumínio provocando a multiplicação de medias protecionistas entre as maiores economias do mundo.
O ponto mais irónico de todo este caso é que, a prazo, o protecionismo de Trump vai prejudicar a economia americana. O aumento das taxas alfandegárias sobre a importação do aço e do alumínio vai aumentar o preço destes produtos. A factura será paga por outras indústrias e, em último caso, pelos consumidores americanos. Sobretudo, as indústrias automóvel e do gás e do petróleo pagarão um preço elevado.
Sob uma enorme pressão interna e externa, Trump poderá recuar. Este episódio é, no entanto, revelador da convicção do presidente americano de que possui um mandato democrático para adoptar medidas protecionistas. É esta legitimidade que constitui o verdadeiro risco político. Trump simboliza o combate entre a globalização e o comércio livre, de um lado, e o protecionismo político do outro. Dado o poder dos Estados Unidos, o nacionalismo económico norte americano irá provocar mais protecionismo em todo o mundo, incluindo na Europa.
Dito de outro modo, com a eleição de Trump, entrámos numa fase da economia global em que os riscos políticos estão a aumentar para todas as empresas cujas estratégias de crescimento assentam nas exportações e nos investimentos externos.
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