Uma Ordem com saudades do futuro
Este ano haverá eleições para Bastonário da Ordem dos Advogados. É uma boa oportunidade, não para impor insígnias numa carreira longeva, mas para construir, ombro a ombro, a advocacia do Século XXI.
A Ordem dos Advogados (OA) exerce uma missão delegada pelo Estado. Além de representar os advogados, cabe-lhe, como primeira atribuição, defender o Estado de Direito e os direitos, liberdades e garantias dos cidadãos e colaborar na administração da justiça.
Infelizmente, ao longo dos anos, a OA tem-se posicionado como uma câmara corporativa, por vezes como um verdadeiro sindicato, desprezando a sua missão pública.
Na prática, acaba por defender apenas uma minoria de advogados cujo exercício profissional é mais confortável e para quem a OA é, afinal, indiferente. Isto enquanto ilude milhares de outros, muitos deles – é preciso dizê-lo – em situação precária ou de real desemprego, como se o sistema de acesso ao direito e aos tribunais pudesse ser, tal como está, uma saída profissional.
Esquecidos ficam, entre estas duas barricadas, muitos advogados que exercem diariamente a profissão com vocação liberal, batendo-se, dentro e fora dos tribunais, pelos seus clientes e pelo Estado de Direito. Milhares de advogados que tendo desistido de contar com a Ordem, pedem, apenas, que a Ordem não os atrapalhe.
Foi assim que a OA e, por consequência, as advogadas e os advogados portugueses perderam muita da sua respeitabilidade e influência, à boleia, também, de sucessivas eleições para Bastonário animadas por divisões pífias entre advogados em prática isolada e sociedades; entre Lisboa e a “província”; e outras coisas do género.
A Ordem dos Advogados deve servir todos, distinguindo-se mais pelo exemplo do que pela vozearia.
Deve ser um exemplo dentro de portas, tratando com dignidade os advogados estagiários e aqueles que prestam serviço em sociedades de advogados, pugnando pela justa retribuição do seu trabalho e por um regime de proteção laboral coerente com a sua situação de facto.
Deve ser um exemplo dentro de portas, pugnando para que todos os advogados tenham acesso a proteção na doença e na parentalidade, abrindo-lhes, afinal, as portas do Estado Social.
Deve sê-lo, também, desbravando o caminho necessário para que os Colegas que pretendam dedicar-se exclusivamente ao patrocínio dos mais desfavorecidos, tenham efetivamente uma carreira que lhes permita fazê-lo em condições de dignidade, segurança e estabilidade; ao mesmo tempo permitindo a participação graciosa no sistema aos que ali veem apenas um suplemento ético ao trabalho no escritório.
Deve sê-lo, igualmente, abstendo-se de alimentar guerras intestinas no seu seio, que a comunicação social logo trata de amplificar e que nos envergonham a todos.
Mas deve ser, também, um exemplo fora de portas, sabendo construir pontes com os Governos e com a sociedade civil, com coragem e independência, sem erguer muros que façam da OA uma parte do problema, em vez de ser parte da solução.
Este ano haverá eleições para Bastonário da Ordem dos Advogados. É uma boa oportunidade, não para impor insígnias numa carreira longeva, mas para construir, ombro a ombro, a advocacia do Século XXI. Orgulhosa do passado, com saudades do futuro.
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