Soares dos Santos: “Se não fosse português, não investia aqui”
O líder do grupo Jerónimo Martins foi o primeiro convidado do ECO24. Reconhece o trabalho do governo de Costa, mas quer mais iniciativa privada. E afirma que o que se passa na Autoeuropa é grave.
Alexandre Soares dos Santos vê com bons olhos o papel que o atual Governo tem assumido na condução do país, e elogia o trabalho feito pelo ministro das Finanças, Mário Centeno, mas diz que a ação do Estado na economia está a ser feita à custa dos lucros das empresas. Na entrevista que marca o arranque do ECO24, parceria entre o ECO e a TVI24, o “patrão” da Jerónimo Martins diz mesmo que, se não fosse português, não investiria em Portugal.
“Avalio a quadratura do circulo à custa do lucro reduzido das empresas. Estamos sobrecarregados com impostos de toda a espécie. Fala-se muito no IRC, mas há todas as outras taxas. Em condições normais, não fosse eu português, não fazia sentido termos um investimento no Pingo Doce”, afirmou Alexandre Soares dos Santos.
O empresário diz que em resultado dos impostos que são cobrados em Portugal, o lucro da empresa de distribuição “é baixíssimo”. “Trabalhámos com uma margem baixíssima, porque há concorrência, há uma crise no bolso das pessoas e não temos crescimento. O nosso crescimento é de 2% ao ano. Isso não é nada. Não cobre o aumento de custos e os aumentos salariais”, acrescenta neste âmbito.
Alexandre Soares dos Santos salienta que a Polónia e a Colômbia, onde a Jerónimo Martins está presente, tem ajudado a empresa a resolver esse tipo de dificuldades. “Não crescendo, fico com uma equipa de management sem promoção. A única coisa que nos tem ajudado é a Polónia e a Colômbia, para onde temos transferido o nosso pessoal. Não vejo oportunidades em Portugal, isto no meu campo de consumer goods“, complementa o dono da retalhista Pingo Doce.
Mas apesar das dificuldades, Alexandre Soares dos Santos assegura que a ambição da Jerónimo Martins é continuar no negócio da distribuição, apesar de não descartar a possibilidade de a estratégia se poder alterar no futuro. “Nos próximos dez anos não [possibilidade de deixar a distribuição], mas não sei se no próximo país onde entrarmos se não será noutra área“,desabafa o empresário.
Não podemos continuar no stop and go
Relativamente à atual situação do país, o líder histórico da Jerónimo Martins diz que o balanço é positivo. “Neste momento, as coisas estão a correr francamente melhor: o défice foi reduzido, há crescimento económico. Portanto, estamos todos felizes”, diz. No entanto, salienta que tal faz parte da “economia portuguesa do stop and go“. “Para crescer e criarmos investimento, e podermos criar emprego, temos de ter um consenso sobre que país queremos. Não podemos continuar no stop and go. As empresas não aceitam mais isso”, desafia, apelando à necessidade de serem criados consensos e de um plano que seja “rigorosamente cumprido”.
"Para crescer e criarmos investimento, e podermos criar emprego, temos de ter um consenso sobre que país queremos. Não podemos continuar no stop and go. As empresas não aceitam mais isso.”
Ainda assim, relativamente à ação governativa, o empresário diz que o balanço é positivo. “Acho que o governo tem dado conta do recado na medida em que tem continuado aquilo que já tinha começado antes [no governo de Passos Coelho], que é reduzir o défice e reduzir o desemprego. No início, disse que tinha algumas dúvidas sobre o ministro das Finanças, mas não há dúvida que fizeram um muito bom trabalho”, refere a esse propósito.
Apesar disso, Alexandre Soares dos Santos defende que a austeridade não deve acabar. “Acho que Portugal está e tem de continuar no bom caminho. Tem de continuar, e não dizer amanhã se vier uma maioria absoluta, ou um novo governo, “toca a gastar”. Não podemos sair do clima de austeridade. Temos de continuar, mas uma austeridade diferente”, refere. Neste âmbito, o empresário apela a que sejam dados mais incentivos à iniciativa privada. “Temos de incentivar cada vez mais a iniciativa privada. Não há relatório nenhum feito sobre empresas privadas que não demonstrem que são as empresas familiares que fazem crescer o país. São elas que criam emprego, que pagam mais impostos”, comenta.
Relativamente à remuneração dos trabalhadores, e apesar de dizer ser a favor de um salário mínimo muito mais alto, o empresário diz que deve haver limites nesse âmbito. “Não podemos andar permanentemente a subir o salário mínimo e a desajustar cada vez mais a classe média”, refere. “Sou a favor de um salário mínimo muito mais alto, porque as pessoas têm de viver com dignidade, mas isso impõe também uma maior responsabilidade. Em Portugal, a taxa de absentismo na maior parte das empresas é enorme“, afirma.
AutoEuropa é muito grave
Relativamente aquelas que considera deveriam ser as prioridades em Portugal, o “patrão” diz que deveriam passar por apostar nos serviços e no turismo e em tentar trazer holdings para o país. Relativamente à presença de empresas em Portugal, Soares dos Santos, mostra-se preocupado com a situação da AutoEuropa.
“É muito grave. E não me surpreenderia que a Volkswagen, que tem hoje problemas grandes de caixa, desistisse do investimento em Portugal. Ou resolvem o problema rapidamente, e como os alemães querem, ou temos o risco de ver a produção passar-se para a Polónia, para a Itália ou para outro país. Isso não está a ser levado a sério. As pessoas têm de perceber que, se querem investimento, também temos de flexibilidade”, remata a este propósito.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Soares dos Santos: “Se não fosse português, não investia aqui”
{{ noCommentsLabel }}