Prova dos 9: Mandato de Joana Marques Vidal como PGR pode ser renovado?
Ministra da Justiça disse em entrevista à TSF que o mandato de Joana Marques Vidal não vai ser renovado. Lei não é clara quanto a isso: diz apenas que o mandato é de seis anos. Mas não diz se é único.
A ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, disse em entrevista à TSF que Joana Marques Vidal não vai ser reconduzida no cargo de Procuradora-Geral da República (PGR). A Constituição da República Portuguesa (CRP) e o Estatuto do Ministério Público (EMP) referem que o mandato do titular da investigação criminal é de seis anos. Mas é omisso sobre se o mandato é único ou se pode ser renovável. Sendo assim, poderia Joana Marques Vidal ser reconduzida no cargo?
A frase
“O mandato de Procurador-Geral da República deve ser longo e único.”
Os factos
Joana Marques Vidal foi nomeada Procuradora-Geral da República em outubro de 2011. Pedro Passos Coelho era o primeiro-ministro do Governo de coligação do PSD/CDS-PP. Os seus antecessores no cargo, Fernando Pinto Monteiro e José Souto Mouro, estiveram também seis anos na cadeira de titular da investigação criminal. Mas de 1984 a 2000, Cunha Rodrigues foi o Procurador-Geral da República. Precisamente para evitar mandatos tão longos, procedeu-se a uma alteração na Constituição da República Portuguesa (CRP) e no Estatuto do Ministério Público (EMP) de forma a esclarecer que o mandato de PGR teria a duração de seis anos. Mas é omisso num ponto essencial: o mandato é único ou renovável? Eis a questão.
"De acordo com a Constituição da República Portuguesa e o Estatuto do Ministério Público, trata-se de matéria da competência do Presidente da República e do Governo, não cabendo à Procuradora-Geral da República pronunciar-se sobre a mesma.
”
O que diz a lei?
A CRP diz no seu artigo 220.º/3 que o mandato da Procurador-Geral da República tem a duração de seis anos, não especificando se é um mandato único ou se pode ser renovado. O mesmo acontece no Estatuto do Ministério Público. Antes de 2000 a lei era totalmente omissa: não falava na duração do mandato sequer. Diz também a lei que este cargo é de nomeação política. E é o único cargo de magistrado do Ministério Público sujeito a designação pelo poder político e que assenta na dupla confiança do Presidente da República e do Governo: a respetiva nomeação e exoneração são feitas pelo primeiro, sob proposta do segundo (artigos 133.º/m), CRP e 131.º/1, Estatuto do Ministério Público/EMP), não estando a escolha vinculada a qualquer processo de recrutamento.
"A tradição é que o mandato seja longo e único e foi essa a intenção do legislador quando alterou a lei depois do mandato de 16 anos de Cunha Rodrigues. Para mim, não há qualquer dúvida de que o mandato é só um, independentemente de quem está no cargo.”
Análise
Recuemos no tempo. Em 2000, Cunha Rodrigues já ia no seu 16.º ano de mandato à frente dos destinos do Ministério Público como PGR. O Parlamento procedeu a uma revisão constitucional de forma a que situações como estas fossem evitadas: o cargo de PGR deve ter uma duração limitada no tempo e deverá ser único. As razões desta alteração também ao nível do Estatuto que rege a magistratura do MP prendiam-se igualmente com o facto de, sendo um cargo de nomeação política, a sua autonomia ficaria em risco se houvesse oportunidade de renovação sistemática do cargo. Investigação Criminal e poder político não se misturam e, por isso, o titular da investigação criminal não deve ficar refém do poder político.
Para António Ventinhas, dirigente do Sindicato dos Magistrados do Ministério Público (SMMP), não há dúvidas: “Independentemente de quem ocupa o cargo, a duração do mandato é de seis anos e é único”.
O que a ministra da Justiça vem agora dizer é que, na sua interpretação, o mandato é “único e de seis anos”. No debate quinzenal no Parlamento, António Costa reconheceu que concorda com a interpretação jurídica de Francisca Van Dunem. Contudo, frisou que o Governo não discutiu o assunto e que, por isso, não há qualquer decisão tomada. “Tenderei a concordar com a posição da ministra sobre a PGR”, disse o primeiro-ministro. Mas recusou-se a falar sobre o futuro do Ministério Público sem discutir com o Presidente da República e garantiu que o assunto ainda não foi discutido pelo Executivo. “Não vou decidir aqui em nome do Governo uma decisão que o Governo ainda não avaliou”.
O ECO questionou a PGR sobre qual a sua interpretação da lei. A explicação foi que, “de acordo com a Constituição da República Portuguesa e o Estatuto do Ministério Público, trata-se de matéria da competência do Presidente da República e do Governo, não cabendo à Procuradora-Geral da República pronunciar-se sobre a mesma”.
Conclusão
A lei é omissa e diz apenas que o mandato de PGR dura seis anos. Não especificando se é único ou não. Porém, em 2000, o espírito da revisão constitucional neste ponto — e também do Estatuto do Ministério Público — era de evitar a renovação de mandatos, depois do exemplo de Cunha Rodrigues que esteve 16 anos no cargo. A conclusão é que — apesar de na lei não estar escrito taxativamente — basta recuar no tempo e perceber que a intenção do legislador foi de não permitir a renovação de mandatos. De uma forma ou de outra, tendo já a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, referido que Joana Marques Vidal não será reconduzida e sendo este um cargo de nomeação política, em outubro de 2018, teremos um novo PGR.
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