China alarga estradas da prosperidade ao oeste remoto, mas caminho é sinuoso
O terreno montanhoso, clima inóspito e as diferenças culturais tornam difícil erradicar e manter as comunidades fora da pobreza.
Xinwang anda há cinco anos a construir estradas, caminhos-de-ferro, pontes e túneis em regiões montanhosas no extremo oeste da China, personificando os esforços do Governo chinês para erradicar a pobreza no país até 2020.
A nova estação de comboios de Xining, capital da província de Qinghai, a quase 2.000 quilómetros da sua terra natal em Shandong, nordeste da China, foi a primeira obra em que trabalhou.
Com uma população composta sobretudo por minorias étnicas, incluindo tibetanos, Qinghai é das províncias mais remotas da China, mas novas linhas ferroviárias de alta velocidade conectam agora a região às províncias vizinhas de Sichuan e Gansu.
“Desde então, fiquei por aqui”, conta Xinwang, 31 anos, à agência Lusa, enumerando as obras em que trabalhou a seguir: a linha ferroviária entre Gansu e a região de Xinjiang ou uma autoestrada de 900 quilómetros que atravessa Qinghai de norte a sul.
Xinwang não entende os dialetos locais e desconfia dos tibetanos, mas gosta dos “verões agradáveis” em Qinghai. Os invernos, porém, são “duríssimos”, diz.
Longe do espetacular desenvolvimento económico que formou no litoral da China mega metrópoles, arranha-céus e uma classe média superior a 500 milhões de pessoas, o oeste da China permanece sobretudo pobre.
Mas quando se celebram sete décadas de governação do Partido Comunista, que assumiu o poder com promessas de prosperidade para todos, a liderança definiu como prioridade erradicar a pobreza do país.
Segundo dados oficiais, nos últimos seis anos, o país mais populoso do mundo, com cerca de 1.400 milhões de habitantes, retirou da pobreza 82,39 milhões de pessoas, reduzindo para 1,7% a população a viver com menos de 2.300 yuan (320 euros) anuais – a linha de pobreza estabelecida pelo Governo chinês.
O investimento massivo em infraestruturas tirou do isolamento várias comunidades, enquanto o projeto internacional lançado por Pequim “Uma Faixa, Uma Rota” tem reforçado as vias comerciais do oeste do país, com ligações ferroviárias e rodoviárias à Europa e Oceano Índico, cruzando Rússia e Ásia Central.
No oeste da China, o desenvolvimento económico, para além de servir como fonte de legitimidade para o Partido Comunista, é também imperativo no combate ao separatismo, sobretudo no Tibete ou Xinjiang.
No entanto, o terreno montanhoso, clima inóspito e diferenças culturais tornam difícil erradicar e manter as comunidades fora da pobreza.
Para chegar a casa da família dos Chou, na povoação de Angsai, prefeitura autónoma tibetana de Yushu, é preciso percorrer quase 100 quilómetros por estreitas estradas de terra batida, entre curvas e contracurvas, e com os pneus a roçar desfiladeiros.
A habitação, que consiste num aglomerado de três contentores, surge inclinada, face ao terreno acidentado, dando uma sensação inicial de desequilíbrio. A vida decorre ali como há cem anos.
As famílias passam o dia em tendas semelhantes aos ‘yurts’ mongóis: as mulheres, à volta do fogão, preparam refeições e chá de manteiga; os homens fumam e conversam durante horas a fio. Não há saneamento básico ou rede móvel.
Dong, o filho mais novo dos Chou, lembra à Lusa quando Angsai era uma terra “sem lei nem ordem”: discussões ou disputas por terrenos acabavam frequentemente “à facada”. Nos últimos anos, uma campanha contra o crime tornou a comunidade mais segura, conta.
Um projeto de ecoturismo permite agora às famílias locais hospedarem turistas, atraídos pela vida selvagem e singular paisagem do planalto Qinghai – Tibete.
A quatro mil metros de altitude, largas planícies pontuadas por lagos encerram-se entre montanhas. Na natureza intacta, observam-se leopardos das neves, ursos pardos asiáticos, lobos ou linces.
Mas a fé budista dos tibetanos, num país oficialmente ateísta e cujo pragmatismo e devoção ao dinheiro configuraram grande parte da sociedade, parece disputar a visão de “progresso” promovida por Pequim.
A família dos Chou, por exemplo, tem quarenta iaques – os bovinos típicos da região dos Himalaias – mas grande parte dos lucros da criação dos animais remete para os matadouros e retalhistas.
“A nossa fé não permite que matemos o animal”, explica uma tibetana. “Muitas famílias criam iaques, mas vendem-nos por pouco dinheiro, para que outros os matem”, diz.
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