Industriais do têxtil e calçado receiam que algumas empresas não aguentem aumento do salário mínimo

O salário mínimo será de 635 euros a partir de 1 de janeiro, mas os industriais do têxtil e do calçado antecipam que algumas empresas não aguentarão o aumento de custos e fechem as portas.

O aumento do salário mínimo para 635 euros já é oficial e vai entrar em vigor a 1 de janeiro de 2020, mas os industriais do têxtil e do calçado estão preocupados com o impacto que a medida poderá ter. Num encontro, à porta fechada, que decorreu sexta-feira, no Porto, os responsáveis da Associação Nacional das Indústrias de Vestuário e Confeção (ANIVEC) e da Associação Portuguesa dos Industriais de Calçado, Componentes, Artigos de Pele e seus Sucedâneos (APICCAPS) reuniram-se com António Saraiva e alertaram para o risco de falências.

A reunião já estava marcada, faz parte da estratégia de presidente da CIP, António Saraiva, para ouvir a opinião dos seus associados. O presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP) explicou ao ECO que, na reunião, os responsáveis associativos lhe deram conta da sua “preocupação por causa do aumento do salário mínimo”, e do “risco de falências, porque há empresas que não vão aguentar este aumento salarial”.

César Araújo, presidente da ANIVEC, (à esquerda), conversa com o presidente da CIP, António Saraiva (ao centro) e com Luís Onofre, que lidera a APICCAPS (à direita).22 Novembro, 2019

“Estamos preocupados”, afirma César Araújo ao ECO. O presidente da ANIVEC sublinha que as empresas têm encargos muito avultados porque apesar de o salário mínimo ser de 635 euros brutos (os trabalhadores levam para casa 565,15 euros líquidos, em 14 remunerações, a que acresce o subsídio de refeição (2,5 euros por dia). Os empregadores têm ainda de descontar todos os meses 150,81 euros referentes à Taxa Social Única (TSU). O industrial sente que o modo como está a ser feita a discussão do salário mínimo “é uma forma camuflada de denegrir a indústria”.

Este aumento nos custos de produção é um fator que vai “pesar na competitividade de empresas que trabalham essencialmente para o mercado global”, frisa César Araújo, recordando que a conjuntura não é a mais favorável tendo em conta “o abrandamento da Alemanha, que vai acabar por afetar Portugal direta ou indiretamente”, mas também as incertezas relacionadas com o Brexit.

Esta avaliação dos industriais contraria as declarações, e a decisão, do Presidente da República sobre o salário mínimo. Este sábado ao fim do dia, Marcelo deu uma espécie de resposta às dúvidas suscitadas pelo presidente da CIP. “O Presidente da República promulgou e, ao promulgar, disse que parecia razoável no contexto português. Eu não mudo de opinião em 15 dias, não chega a um mês. É razoável aquela decisão no contexto português”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa aos jornalistas, à margem da cerimónia de juramento de Hipócrates dos novos médicos da Região do Sul da Ordem dos Médicos, na Universidade de Lisboa.

Os riscos para a indústria não estão apenas no salário mínimo. A concorrência direta de países como a Turquia é outra das dores de cabeça destas indústrias. Até porque, no caso do têxtil as exportações nos primeiros nove meses do ano registaram uma quebra de 1% face ao período homólogo, com um valor acumulado em 3.957 milhões de euros. Sendo que Espanha e Alemanha foram os destinos que registaram maiores quedas absolutas, respetivamente de menos 49 milhões de euros, ou seja -3,8%, e menos 16 milhões de euros (equivalente a -4,5%).

A cinco dias da Concertação Social começar discutir o acordo sobre política de rendimentos e competitividade — um “acordo de médio prazo sobre salários, rendimentos e competitividade, em articulação com matérias prioritárias como a valorização dos jovens qualificados, a conciliação do trabalho, vida pessoal e familiar e a formação profissional” — os dirigentes associativos sublinharam nesta reunião a necessidade de o Governo avançar com “estímulos ao desenvolvimento económico português”. “Não se tratam de contrapartidas”, frisa César Araújo, mas de criar condições para que “as empresas possam criar bons empregos”. O presidente da ANIVEC lembra ainda que muitas das empresas do têxtil e do calçado estão no interior do país e desempenham um papel muito importante na fixação das populações, já que “grande parte dos contratos celebrados são sem termos” e “empregam muita mão-de-obra feminina”, o que “cria estabilidade familiar”.

Sem querer levantar a ponta do véu, o responsável disse ainda que vão “entregar um conjunto de medidas que poderão desenvolver o crescimento e a sustentabilidade das empresas nacionais” para que António Saraiva possa negociar com os restantes parceiros o acordo que “permita às empresas continuarem a ser competitivas a nível mundial”.

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