Governo teme oito maiorias negativas com peso no Orçamento
Os partidos uniram-se à revelia do PS no primeiro dia de votações, em 21 maiorias negativas. Há mais oito maiorias negativas à vista esta semana, e que poderão fazer estragos orçamentais.
Uma das primeiras vezes em que o Governo PS minoritário foi surpreendido por uma maioria negativa aconteceu no início de 2017 quando o PSD de Passos Coelho votou ao lado da esquerda contra a descida da TSU, uma contrapartida que o Executivo dava às empresas pelo aumento do salário mínimo nesse ano. Desde então as maiorias negativas têm sido constantes, principalmente nos Orçamentos do Estado. O OE 2021 não é exceção, com 21 propostas já aprovadas com o voto contra do PS, sendo viabilizadas pelos outros partidos, e poderão vir mais oito a caminho que podem fazer mais estragos orçamentais.
O Governo teme novamente que os partidos se juntem para adicionar despesa ou diminuir receita ao OE 2021, complicando as contas públicas do próximo ano. O Ministério das Finanças até já fez os cálculos às 21 maiorias negativas aprovadas na sexta-feira: têm “um impacto preliminar negativo superior a 20 milhões de euros”, avançou ao ECO fonte oficial das Finanças, o que equivale a 0,01% do PIB ou a 0,02% da despesa pública prevista para 2021. O ministério sob a batuta de João Leão lança mesmo um apelo ao PSD: “O Governo espera que o PSD mostre maior sentido de responsabilidade nos próximos dias de votação em consonância com a mensagem do seu líder”.
Tanto o primeiro-ministro como o ministro das Finanças deixaram avisos à navegação, como em anos anteriores, especialmente apelando à “responsabilidade” do PSD. Os social-democratas garantem que “não haverá maiorias que ponham em causa a sustentabilidade das contas públicas”.
PS e PSD já pediram à Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) para calcular o impacto de algumas medidas, mas esse estudo só deverá chegar esta semana, na véspera da votação. Estes pedidos incidem exatamente sobre algumas das potenciais maiorias negativas. Por um lado, o PS está preocupado com o impacto orçamental da suspensão do pagamento por conta — o Ministério das Finanças diz que levaria a uma redução da receita de pelo menos 1,5 mil milhões em 2021 — e com a redução de portagens do interior e no Algarve e nas concessões da Costa de Prata, Grande Porto e Norte Litoral. Ambas propostas são feitas, com algumas diferenças, pelo PSD e pelo PCP, mas para que sejam aprovadas têm de contar também com pelo menos a abstenção do BE.
Já o PSD quer saber o impacto da redução do IVA das bebidas na restauração e o alargamento do subsídio de risco pago aos profissionais na linha da frente, ambas do PCP, e da exclusividade dos profissionais do SNS, uma proposta do BE (também partilhada pelo PCP), sendo que essa avaliação poderá determinar o sentido de voto dos social-democratas. O PSD não se compromete, mas há o risco de nestas propostas também formar-se uma maioria negativa. O partido poderá ainda ponderar a proposta do PCP para atualizar em 0,7% os escalões de IRS em 2021 e a dedução específica, o que se traduziria num desagravamento fiscal.
Perante este cenário, uma das maiorias negativas que poderá surgir nas votações da especialidade do OE 2021 é a suspensão do pagamento por conta, cuja votação acontecerá esta terça-feira (mas pode ser adiada para quarta-feira). Trata-se de um adiantamento do IRC de 2021 pago pelas empresas que tiveram lucro, sendo que com esta suspensão o que não for pago em 2021 será no ano seguinte, ou seja, no conjunto dos dois anos, o impacto orçamental é nulo em contabilidade nacional, a que interessa à Comissão Europeia. O PSD — que alterou a sua proposta para apenas incidir sobre pequenas e médias empresas e cooperativas — e o PCP têm propostas no mesmo sentido, mas o diabo pode estar nos detalhes. Além disso, o PS, segundo disse Ana Catarina Mendes ao Expresso, está a tentar convencer o PCP a votar contra a proposta do PSD.
A proposta do PSD passa por suspender o pagamento por conta “durante o período em que vigorarem as medidas restritivas ao funcionamento de atividades económicas, passando a aplicar-se consoante o resultado do exercício o pagamento real apurado de IRC“. Este ano, o pagamento por conta previsto para agosto foi suspenso para a maioria das empresas, mas até 15 de dezembro as empresas terão de regularizar o pagamento deste adiantamento de imposto.
No caso do PCP, a proposta define também que essa suspensão seja para as cooperativas ou micro, pequenas e médias empresas. E deixa uma ressalva que pode agradar ao PS: “As entidades abrangidas pela dispensa prevista no número anterior, que pretendam efetuar o Pagamento por Conta, podem realizar esse pagamento, nos termos e nos prazos definidos por lei”. Os comunistas argumentam, por causa das regras existentes, “o PPC de 2021 seria um adiantamento ao Estado que, em muitos casos, seria depois devolvido às empresas”, o que criaria problemas de tesouraria.
Mas poderão surgir ainda mais maiorias negativas. Há propostas do PSD na área da Administração Pública que podem ter a aprovação à esquerda. Segundo os cálculos do Ministério das Finanças, são três medidas que podem significar um aumento estrutural da despesa de 200 milhões de euros (neste caso a UTAO não terá uma avaliação independente do impacto). Em causa está o subsídio de risco para profissionais de segurança — o PCP tem uma proposta que engloba todos os profissionais da primeira linha –, a revisão do estatuto funcionários judiciais e a revisão da lei orgânica do Pessoal do SEF. Esta última proposta do PSD já foi aprovada no primeiro dia de votação com o voto contra do PS, a abstenção do CDS e o voto favorável dos restantes partidos.
Há, assim, pelo menos mais oito maiorias negativas à vista, sem prejuízo de ainda ser possível aparecer mais propostas que reúnam a direita e a esquerda contra o PS.
No primeiro dia de votações houve mais de 10 maiorias negativas
As maiorias negativas marcaram logo o primeiro dia de votações na especialidade do OE 2021. De acordo com a contabilização do ECO com base nas votações na comissão de orçamento e finanças, os partidos juntaram-se pelo menos mais de 10 vezes para aprovar propostas contra a vontade do PS. Eis a lista de algumas propostas aprovadas pela oposição, sendo que a maioria poderá ter um impacto orçamental limitado:
- A proposta do PAN que obriga o Governo a regular a profissão dos intérpretes de língua gestual no primeiro semestre de 2021;
- A proposta do PAN que obriga o Governo a fazer o levantamento do número de contratos de docentes convidados a lecionar nas Instituições de Ensino Superior;
- A proposta do CDS para um planeamento eficiente do recrutamento nas instituições de ensino superior públicas;
- A proposta do CDS que diz respeito à contagem da avaliação obtida pelos ex-militares, nos anos em que desempenharam funções nas forças armadas, após ingresso na administração pública;
- A proposta do PAN relativa à transparência do financiamento público a fundações, associações e demais entidades de direito privado;
- A proposta do PSD que trava as cativações a entidades reguladoras;
- A proposta do PSD sobre a obrigatoriedade de garantir equipamentos de proteção individual (EPI) aos estudantes do Ensino Superior dos cursos de saúde que estejam em estágios curriculares;
- A proposta do PSD que dita que “as verbas destinadas aos Deficientes das Forças Armadas ficam excecionadas de qualquer cativação ou retenção”;
- A proposta do PSD sobre a revisão da Lei Orgânica e do Estatuto do Pessoal do SEF;
- A proposta do PCP e outra do PSD Madeira que prevê a redução de taxas aeroportuárias nos aeroportos da Madeira e do Porto Santo;
- A proposta do PCP relativa ao Plano de Remodelação dos Tribunais na Região Autónoma dos Açores, que deverá ser feito em 2021;
- E ainda propostas do PSD e do PCP sobre o furacão Lorenzo.
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