Bloco diz que Cabrita não pode continuar. PCP defende reestruturação do SEF, mas não de “cabeça quente”
O Bloco reafirmou que o ministro da Administração Interna “perdeu as condições para o lugar que ocupa”. Já o PCP defendeu a necessidade de uma reestruturação, mas não de "cabeça quente".
A coordenadora do Bloco de Esquerda reafirmou este domingo, em Alcanena (Santarém), que o ministro da Administração Interna “perdeu as condições para o lugar que ocupa”, dada a forma como lidou com a atuação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras.
Falando no final de uma reunião com ativistas ambientais do distrito de Santarém, realizada hoje no Centro de Ciência Viva do Alviela, em Alcanena, e questionada a propósito da atuação do ministro da Administração Interna no caso do cidadão ucraniano alegadamente assassinado no aeroporto de Lisboa por elementos do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras (SEF), Catarina Martins lamentou que, em vez de anunciar “transformações profundas” na segurança das fronteiras e na política de imigração, “para que os direitos humanos fossem respeitados”, Eduardo Cabrita tenha escolhido “vitimizar-se”.
“No momento em que era preciso dizer ao país das transformações profundas, profundas, que é necessário na segurança das fronteiras e na política de imigração para que os Direitos Humanos fossem respeitados, o ministro decidiu vir à televisão vitimizar-se e isso mostra uma incapacidade destas alterações que o país precisa e nós julgamos que, assim sendo, não tem condições para continuar”, declarou.
Lembrando que o líder parlamentar do BE, Pedro Filipe Soares, já se pronunciou neste sentido “no momento em que o ministro veio falar ao país na semana passada”, Catarina Martins sublinhou que, ao escolher vitimizar-se em vez de proferir “uma palavra de solidariedade para com a família da vítimas” e de anunciar uma reformulação de políticas, Eduardo Cabrita “perdeu as condições para o lugar que ocupa”.
A líder bloquista recordou ainda que, quando esteve no Parlamento em 8 de abril, na sequência de um pedido de audição apresentado pelo BE, o ministro “prometeu tirar consequências muito fortes do que tinha acontecido”. Contudo, “quase nove meses depois”, o país é confrontado com “as notícias de uma família que foi deixada sozinha, de consequências que não foram retiradas sobre o próprio funcionamento dos centros do SEF”, que, sublinhou, “não seguiram sequer as recomendações da Provedoria de Justiça”.
“Julgamos que isso é uma prova de incapacidade face a um dos casos mais graves da democracia portuguesa: um homem foi torturado até à morte por forças de segurança do nosso país. É difícil lembrarmo-nos de alguma coisa mais grave numa democracia”, salientou. Para Catarina Martins, o problema do SEF “não é pontual, é sistémico, até porque as várias entidades nacionais e internacionais têm vindo a denunciar há muitos anos os abusos, os atropelos aos direitos humanos”.
“Como o problema é sistémico, julgo que colocar a questão [como fez o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa] é inútil. É preciso é tirar as conclusões. Isso exige uma profunda remodelação de toda a política de imigração e de fronteiras do Estado português e na verdade o ministro não mostrou até agora os planos para o fazer e aquilo que Portugal precisa é de um ministro que queira fazer essa mudança e não que queira fazer umas poucas mudanças decorativas e deixar tudo na mesma”, declarou.
PCP defende reestruturação do SEF, mas não “de cabeça quente”
O secretário-geral do PCP defendeu este domingo a necessidade de uma reestruturação do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras por causa da morte de um cidadão ucraniano às mãos de inspetores, mas recomendou que não se faça “de cabeça quente”.
Em conferência de imprensa após uma reunião do Comité Central do partido, Jerónimo de Sousa considerou que deve haver “uma reconsideração em relação em relação ao funcionamento desse serviço” mas salientou que é preciso “não envolver todos os funcionários do SEF como se tivessem cometido crimes, porque isso não é verdade”.
“Agir com a cabeça quente muitas vezes não ajuda a resolver o problema”, afirmou, ressalvando que é precisa uma reestruturação do SEF, a apuração de responsabilidades e um “virar de página” no que toca ao acompanhamento e fiscalização da sua atividade”. Para o PCP, “é fundamental que esses serviços se mantenham e respeitem, em particular, os imigrantes e aqueles que procuram asilo político”.
O homicídio do cidadão ucraniano Ihor Homenyuk, que morreu depois de ter sido torturado nas instalações do SEF no aeroporto de Lisboa em março passado, é “um facto muito grave a exigir responsabilidades políticas, criminais e disciplinares”, defendeu Jerónimo de Sousa, apontando ainda que o facto de só agora o Estado português determinar uma indemnização à família é “um atraso inaceitável”.
Jerónimo de Sousa reconheceu que a continuidade da ex-diretora do SEF Cristina Gatões, que se demitiu na semana passada, se tornou “insustentável”. Questionado sobre a continuidade do ministro da Administração Interna, Eduardo Cabrita, bem como de outros ministros do governo alvo de críticas pela sua atuação, o secretário-geral comunista defendeu que “despedir ministros ‘à peça’ não é um caminho que se trilhe”.
“As críticas ao Governo devem ser feitas ao Governo e, naturalmente, ao principal responsável, que é o primeiro-ministro. Não acompanhamos essa ideia peregrina de irmos enxotando os ministros mais ou menos incómodos”, declarou.
A morte de Ihor Homenyuk levou à acusação de três inspetores do SEF por homicídio qualificado, que estão em prisão domiciliária e cujo julgamento está previsto começar a 20 de janeiro de 2021, no tribunal criminal de Lisboa. O caso de Homenyuk levou também à demissão do diretor e do subdiretor de Fronteiras do aeroporto de Lisboa e também à instauração de 12 processos disciplinares a inspetores do SEF.
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