BRANDS' CAPITAL VERDE Os grandes desafios do licenciamento de projetos de eletricidade renovável
Susana Serôdio, da APREN, reflete sobre os entraves ao licenciamento de projetos de eletrcidade renovável em Portugal no seguimento da última sessão da iniciativa Debates Renováveis.
A APREN – Associação Portuguesa de Energias Renováveis – tem em curso um projeto, em parceria com a Bioinsight, que pretende definir um conjunto de propostas de otimização e simplificação do processo de licenciamento de projetos de eletricidade renovável em Portugal.
Trata-se de uma iniciativa que surge na sequência de um trabalho já iniciado pela associação junto da Agência Portuguesa do Ambiente e Direção Geral de Energia e Geologia, e promovido pela Secretaria de Estado da Energia. A associação acredita que é possível simplificar processos e desbloquear os principais entraves que se verificam no momento, e assim alinhar o cronograma do processo de licenciamento, que hoje se prolonga, em média por quase quatro anos, com os requisitos da Diretiva das Energias Renováveis (RED II), que estabelece um limite de dois anos para este processo, podendo ascender, no máximo aos três anos.
Numa reflexão entre o passado e o presente do processo de licenciamento de projetos de eletricidade renovável em Portugal, o presidente da Assembleia Geral da APREN, António Sá da Costa, constatou que nunca foi tão “moroso, complicado e imprevisível”, o qual foi um dos oradores da iniciativa Debates Renováveis 3 – Licenciamento em Portugal, que a Associação organizou a 8 de março e que me coube moderar.
Há 10 anos era mais simples licenciar um projeto, concordou Ana Guerreiro da Generg. Os prazos eram cumpridos e o desfecho mais previsível, ainda que fossem necessárias muitas vezes medidas adicionais de minimização de impactes. Uma década depois verifica-se que os níveis de burocracia aumentaram, tal como a entropia entre entidades, conduzindo a elevados níveis de incerteza.
Uma questão que tem agravado os prazos e dificuldade de licenciamento recai na possibilidade de expropriação de terrenos e posse administrativa para a passagem das linhas de interligação deixou de existir, o que em nada ajuda a agilizar processos, lembrou António Sá da Costa.
Timóteo Monteiro, da EDP Renováveis, reforçou que o licenciamento também se tornou mais complicado devido à escassez de sítios adequados para novos projetos. Tendo em conta esta dificuldade perspetiva-se que seja difícil cumprir as metas do PNEC (Plano Nacional de Energia e Clima) que prevê mais 15 GW de capacidade renovável instalada no sistema eletroprodutor renovável até 2030.
Nesta perspetiva, uma possibilidade seria uma reavaliação das cartas existentes e identificação de áreas especificas onde se pudessem realizar novos projetos. Mas, na ótica de António Sá da Costa, esta abordagem pode não ser a mais fiável, já que levaria ao aumento especulativo do custo dos terrenos.
Importa sobretudo olhar para os locais onde estão os recursos e depois para a rede – e não o contrário – de forma a garantir que os projetos são implementados da forma mais custo-eficiente possível. Libertar terrenos para a construção de centrais de natureza renovável é, agora mais do que nunca, uma aventura kafkiana.
Outra barreira que surge presentemente é, ao nível local, alguns municípios começam a levantar dificuldades ao desenvolvimento de novos projetos através da introdução nos seus regulamentos de taxas desincentivadoras à instalação de centros eletroprodutores, nomeadamente, para a tecnologia solar fotovoltaica.
Os municípios não vislumbram grande interesse em ter grandes áreas ocupadas com centrais solares ou eólicas, onde os impactos ambientais e visuais, locais ou regionais, são palpáveis, mas os positivos são maioritariamente mesuráveis ao nível nacional ou global. Cria-se o cenário ideal para o chamado efeito “no meu quintal, não!”.
Timóteo Monteiro admite que um dos fatores de sucesso da expansão eólica em Portugal foi o pagamento de 2,5% por cento da tarifa a nível local, que funcionou como uma compensação às autarquias pelos impactos locais associados às centrais.
Para António Sá da Costa mais vale tarde do que nunca e, por isso, com vista a corrigir procedimentos, seria uma boa ideia sentar à mesa Governo, autarquias e a APREN de forma a chegar a um consenso. É importante garantir que se cumprem as metas do PNEC, por um lado, mas urge evitar transformar os promotores nos financiadores de ambições municipais de investimento que podem inviabilizar alguns projetos renováveis.
Se as centrais eólicas beneficiavam de uma tarifa feed-in, que já considerava os 2,5% da receita bruta a pagar aos municípios, o mesmo modelo não pode ser seguido atualmente numa altura em que é o mercado que dita as regras.
A limitação de recursos das entidades licenciadores é outro entrave ao licenciamento, a par da falta de consenso entre as próprias entidades, sublinha Ana Guerreiro, mas nem tudo se resume a números, observa Sá da Costa.
O ritmo a que evolui este setor não se compadece com constrangimentos de secretaria. O lugar que deixarmos em branco será ocupado por outros. Obter o licenciamento amanhã poderá ser tarde e por isso estamos empenhados em ajudar a propor medidas que tornem mais célere, transparente e democrático o processo de licenciamento.
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