Defesa entrega documentos a juiz que negam controlo de Salgado sobre a Shu Tian
Diz a pronúncia que, em 2014, terão sido transferidos 2 milhões para a Shu Tian, sociedade controlada por Salgado, em Macau, para “contra-balançar a devolução dos 2 milhões de euros à Enterprises.
Um dos três crimes de abuso de confiança que é imputado a Ricardo Salgado na decisão instrutória de Ivo Rosa consiste numa transferência do valor de quatro milhões de euros da Enterprises para a Savoices (cujo beneficiário era Ricardo Salgado), em outubro de 2011.
Mas esta transferência, ao contrário do que é referido na decisão instrutória de Ivo Rosa, corresponde a um empréstimo contraído por Ricardo Salgado junto da Enterprises, conforme documentos consultados pelo ECO, apresentados pela defesa do ex-banqueiro e juntos ao processo. Com empréstimos semelhantes feitos a outros membros da família Espírito Santo, sem que tenham sido considerados ilícitos. O que é alegado na contestação dos advogados do ex-banqueiro.
Esta quinta-feira decorre a segunda sessão de julgamento de Ricardo Salgado, o ex- homem forte do BES e que responde agora por três crimes de abuso de confiança, depois da pronúncia de Ivo Rosa no âmbito da Operação Marquês. Com Paulo Silva, o inspetor tributário da Operação Marquês, a testemunhar.
Assim, para saldar o referido empréstimo, Ricardo Salgado efetuou o reembolso de dois milhões de euros à Enterprises um ano depois (31 de outubro de 2012). A defesa reforça que, à data em que faz esta amortização, “Ricardo Salgado nem sequer era arguido, o que só reforça a intenção de pagar o empréstimo (Ricardo Salgado começou a ser investigado nestes autos, tendo sido constituído arguido apenas em janeiro de 2017)”. A data prevista para amortizar o empréstimo remanescente seria outubro de 2015, “o que não chegou a suceder, tendo em conta que nesta altura – agosto de 2014 – Ricardo Salgado já tinha os seus bens arrestados. Em todo o caso, o não pagamento de uma prestação nunca poderá configurar um crime de abuso de confiança”, segundo os autos, consultados pelo ECO, na parte em que a defesa justifica que o seu cliente não deverá ser condenado por este crime.
Em julgamento está em apreciação o facto de Salgado ter utilizado a ES Enterprises para transferir cerca de quatro milhões de euros para a Savoices, uma empresa offshore da qual o ex-líder do BES era o beneficiário e que tinha conta noutro banco suíço. Um segundo alegado crime está relacionado com transferências que a ES Enterprises fez para Henrique Granadeiro, tendo o ex-líder da PT transferido depois mais cerca de quatro milhões de euros para uma conta no banco Lombard Odier aberta em nome de uma sociedade offshore chamada Begolino, que pertence a Ricardo Salgado e à sua mulher Maria João Bastos. No terceiro, estarão em causa cerca de dois milhões e 750 mil euros que tiveram origem no Banco Espírito Santo (BES) Angola, que passaram por uma conta do empresário Hélder Bataglia e acabaram na Savoices de Ricardo Salgado.
Na contestação, que foi entregue a ao juiz Francisco Henriques em junho, Francisco Proença de Carvalho e Adriano Squilacce consideram que “falha o pressuposto básico do crime de abuso de confiança: a realização de uma conduta do agente que consista no domínio do facto de fazer a coisa entrar no seu domínio”.
A contestação alega que havia várias pessoas — não só Ricardo Salgado — que davam ordens na ES Enterprises e que também receberam dinheiro e empréstimos e que isto não estava concentrado só no arguido. Entre essas pessoas que constavam da lista de assinaturas autorizadas a realizar movimentos está Jean-Luc Schneider, José Castella, Francisco Machado da Cruz e Roland Cottier.
Sobre a Shu Tian
Consta também da pronúncia que, no início de 2014, terão sido transferidos 2 milhões de euros para a Shu Tian, sociedade alegadamente controlada por Ricardo Salgado, com registo em Macau, para “contra-balançar” a devolução dos 2 milhões de euros que Ricardo Salgado fez à Enterprises em outubro de 2012. “Apesar de a própria pronúncia nunca dizer que teria sido Ricardo Salgado a ordenar essa transferência no início de 2014”, conforme tese da contestação.
Mas, segundo documentos consultados pelo ECO — como a certidão comercial da Shu Tian — a mesma é controlada pelos sócios-gerentes Michel Ostertag e Ricardo Gaspar Rosado de Carvalho.
Em agosto de 2015 — já depois do colapso do GES — era Michel-Joseph Ostertag que controlava e dava instruções quanto à movimentação das contas bancárias da Shu Tian, conforme documentos apensados ao processo. Numa altura em que o GES e o BES tinham caído há um ano e Ricardo Salgado estava afastado de todos os cargos.
Segundo os mesmos documentos, a Shu Tian realizou empréstimos à sociedade RAIMUL Holdings . no valor de 12 milhões, controlada por José Manuel Espírito Santo e Ricardo Abecassis, não a Ricardo Salgado. Concluindo que não existe qualquer controlo de Ricardo Salgado sobre a Shu Tian, pelo que também não houve qualquer apropriação de valores que a Enterprises tivesse transferido para esta sociedade.
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