Novobanco avança para tribunal para recuperar 100 milhões a membro da família Ibraimo, dona do grupo Tricos
Banco colocou duas ações de execução contra Abdul Majid Ibraimo (da família que controla o grupo Tricos) e a sua mulher, Fawzia Hamid Mussa Ibraimo, no valor de 100 milhões de euros.
O Novobanco está a tentar recuperar 100 milhões de euros a um membro da família Ibraimo, dona do grupo Tricos. Há anos que Abdul Majid Ibraimo e o banco tentam chegar a um acordo para resolver uma dívida contraída ainda no tempo do BES, para financiar um negócio de comércio automóvel que correu mal no Brasil, mas sem sucesso. Sem terem chegado a um entendimento, o banco avançou agora para a Justiça para reaver o dinheiro. Já o devedor deverá requerer a insolvência pessoal, de acordo com as informações recolhidas pelo ECO.
A instituição financeira liderada por António Ramalho acabou de colocar duas ações no Tribunal da Comarca de Lisboa: uma contra Abdul Majid Ibraimo e a sua mulher, Fawzia Hamid Mussa Ibraimo, no valor de 61,7 milhões de euros, e outra visando apenas Abdul Majid Ibraimo, no valor de cerca de 40 milhões. As duas petições deram entrada na Justiça na semana passada e apresentam o mesmo agente de execução: Manuel Vaz de São Payo.
Em nenhuma delas o grupo Tricos SGPS, holding detida pela família Ibraimo, e que está presente em vários mercados, nomeadamente em Portugal, Moçambique e Brasil, entre outros pontos, surge como alvo do banco.
Em causa está, segundo apurou o ECO, o facto de Abdul e Fawzia Ibraimo serem avalistas de um financiamento a rondar os 60 milhões de dólares concedido pelo BES para negócios relacionados com o comércio de automóveis no Brasil, onde Abdul era representante das marcas sulcoreana SsangYong e chinesa Haima. Contudo, o negócio não correu bem.
O ECO tentou contactar Abdul Ibraimo através do grupo Tricos, mas não obteve uma resposta. O Novobanco também não respondeu.
Problemas no Brasil e depois em Angola
A aposta no Brasil correu bem inicialmente, mas as coisas começaram a complicar-se depois de uma alteração legislativa introduzida em 2012 ter obrigado os importadores de automóveis no país a criarem unidades de montagem das marcas que representavam. Para contornar este obstáculo, a Districar, a importadora e distribuidora de veículos de Abdul Majid Ibraimo, ainda tentou negociar uma fábrica de montagem num estado brasileiro, no Rio Grande do Sul, mas não arranjou um sócio para avançar com o projeto.
A importação de carros tornou-se então numa atividade inviável para a Districar perante as elevadas taxas aduaneiras que se passaram a aplicar nas compras às marcas estrangeiras, e todo o negócio foi arrastado.
Nos últimos anos, a família tentou resolver a dívida junto o banco tendo apresentado propostas para o pagamento de uma verba (abaixo do valor devido, ainda assim) que iria permitir libertar os avales de Abdul e a mulher, mas não houve entendimento entre as partes.
Além dos problemas no Brasil, surgiram depois dificuldades nos negócios em Angola, onde tinha interesses no imobiliário, que vieram reduzir as possibilidades de pagamento ao banco. A última proposta de Abdul Ibraimo apresentada junto do banco já terá rondado os seis milhões de euros, muito abaixo das propostas de algumas dezenas de milhões que tinha feito inicialmente e ainda mais baixo do valor que é reclamado agora pelo banco, cerca de 100 milhões e que incluirá também os juros vencidos.
Sem um acordo com o Novobanco, Abdul Ibraimo e a mulher deverão apresentar-se à insolvência pessoal, que lhes permitirá virar este capítulo com o banco. Um passo que deverá ser ainda mais provável depois de o banco ter avançado com ações de execução contra ambos.
Novobanco tentou vender dívida associada ao grupo
Abdul Ibraimo já foi sócio do grupo Tricos, a holding criada pela família Ibraimo em 1978, que detém várias empresas e é liderada pelo irmão Gulamhussen Ibraimo, desde 2017. Agora, já só deterá uma pequena participação numa das empresas do grupo, a Tricos Trading, que já não tem atividade.
O grupo Tricos está presente em Portugal, Espanha, Angola, Moçambique e Brasil, e outros mercados. Tem interesses em vários setores, incluindo imobiliário e hotelaria, indústria mineira e petrolífera, entre outros, de acordo com a informação disponibilizada no seu site.
Em Portugal, são sobretudo conhecidos os projetos que empreendeu na década de 2000, com o Saldanha Prestige (Saldanha), Two Hundred (Campo Grande) ou o Edifício D. Pedro V (Príncipe Real), todos localizados em importantes zonas de Lisboa. Em Espanha tem o hotel de 5 estrelas em Marbella, o Senator Banus Spa Hotel, arrendado ao grupo Playa Senator e que está a operar desde maio de 2006. Também desenvolveu vários projetos em Luanda, Angola, de acordo com as informações disponibilizadas no seu site: Torres Imporáfrica, Luanda Inn, Edifício Monumental e Villa de Luanda.
Há três anos, o Novobanco tentou vender um crédito malparado associado ao grupo Tricos, na ordem dos 82 milhões de euros, na carteira Nata II, juntamente com outros créditos de centenas de milhões de euros outros grandes devedores em incumprimento.
Porém, a operação foi retirada à última hora do pacote pelo Fundo de Resolução – pois faz parte dos ativos cobertos pelo mecanismo de capitalização contingente e, havendo perdas, são imputadas ao fundo de Máximo dos Santos — por considerar que o valor oferecido pelo comprador – o fundo americano Davidson Kempner – era muito baixo, tendo solicitado ao banco para explorar outras vias de recuperação que permitissem um encaixe superior.
No ano passado, em audição da comissão de inquérito ao Novobanco, Rui Fontes, administrador do banco que surge agora nas escutas no âmbito da Operação Cartão Vermelho, indicou aos deputados que o grupo Tricos estava num grupo de devedores que fizeram “defaults estratégicos” à instituição, que também incluía com o Grupo Alves Ribeiro e o grupo brasileiro da construção civil Asperbras.
“O grupo Tricos também alegou as perdas que teve no BES para não liquidar parte da dívida ao Novobanco”, disse o administrador aos deputados.
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