Indústria de plásticos antecipa “tempos muito difíceis” face à crise energética
O presidente da APIP alerta que o aumento dos custos energéticos está a pesar sobre o setor dos plásticos. Empresários já consideram paragens na produção e despedimentos.
O presidente da Associação Portuguesa da Indústria de Plásticos (APIP) antecipa “tempos muito difíceis” para o setor na sequência do aumento dos preços da energia, alertando que a situação “torna as empresas inviáveis”.
“Afiguram-se tempos muito difíceis para esta indústria que necessite ou que vá ter preços de energia que, neste momento, são incomportáveis”, avisou Amaro Reis. Segundo Amaro Reis, toda a cadeia de valor dos plásticos que está a contas com o fim ou rescisão do contrato de energia “está a viver uma situação dramática”.
“Hoje, as empresas que ficam sem contrato de energia e têm de ir para o mercado livre vão pagar entre cinco a seis vezes mais do que o preço que tinham no passado, o que, em muitos casos, praticamente, torna as empresas inviáveis”, declarou Amaro Reis, administrador executivo da empresa Sacos 88, sediada no concelho de Leiria.
O presidente da APIP, que conta com cerca de 200 associados, referiu que as opções das empresas passam pelo aumento de preços, “mas depois podem não conseguir vender”, pela redução da sua atividade laboral, incluindo ‘lay-off’ (redução temporária dos períodos normais de trabalho ou suspensão dos contratos de trabalho), ou “tentar reestruturar a empresa para aquilo que conseguem vender”.
Considerando que a indústria do setor dos plásticos “sempre foi muito resiliente”, Amaro Reis disse que das empresas associadas nenhuma fechou, mas admitiu que “umas podem estar com redução de horários, outras poderão estar a trabalhar só em períodos em que a energia possa estar mais barata”.
Segundo o presidente da APIP, a única forma com que as empresas “podem atenuar um bocadinho isto, mas carece sempre de investimento, é continuar a reforçar – aquelas que já têm – a produção para autoconsumo de energia fotovoltaica” ou outras “acelerar os seus investimentos” em parques fotovoltaicos”.
“Mas, a maior parte da indústria do plástico trabalha por turnos e à noite não há sol. Por muito que se queira, não se consegue ter uma totalidade da necessidade de energia através das energias renováveis”, apontou, reconhecendo, contudo, que esta área requer investimento.
Esperando que “haja uma redução dos preços de energia o mais rápido possível”, o dirigente da APIP assinalou ainda que “o gás continua a ter uma importância muito grande na composição do preço” da eletricidade do mecanismo ibérico.
Amaro Reis considerou, por outro lado, a propósito do anúncio do Governo na semana passada que “todas as medidas são bem-vindas”, admitindo que o Estado “não pode dar tudo”, e que “as linhas de crédito disponibilizadas são importantes e têm de ser ajustadas às necessidades das empresas e com juros bonificados.
Ao executivo, sugeriu que o “custo acrescido que as empresas têm [agora] com a energia pudesse ser, no futuro, deduzido através de benefícios fiscais”.
O responsável da APIP defendeu também que o Governo deve olhar para as empresas que, na área da reciclagem de plástico, contribuem para a economia circular, redução dos resíduos e valorização destes, mas “estão a ser afetadas, enormemente, pelo aumento de custos energéticos”.
“Não sei até que ponto, também, este tipo de empresas podia ter algum benefício”, dado o seu compromisso ambiental relativamente à reciclagem, referiu, lembrando que há países na Europa que “estão a subsidiar os custos de energia destas empresas”.
De acordo com a APIP, o setor dos plásticos tem, em Portugal, 43 mil trabalhadores distribuídos por 1.150 empresas. O volume de negócios é de oito mil milhões de euros, cerca de 4% do Produto Interno Bruto.
Empresários do setor dos plásticos alertam para perda de competitividade
Empresários do setor dos plásticos alertaram para a perda de competitividade devido ao aumento dos custos da energia, que impede o crescimento das empresas e pode originar desemprego.
“Afeta muito a competitividade das empresas”, disse à agência Lusa o presidente do Conselho de Administração da Vizelpas, sediada em Vizela (Braga), que se dedica à produção de filmes técnicos flexíveis para as áreas alimentar e médico-cirúrgica, entre outras.
Segundo Modesto Araújo, em agosto do ano passado a fatura de eletricidade oscilava entre os 70 e os 80 mil euros. “Em agosto de 2022, passou para cerca de 300 mil euros”, declarou.
O empresário esclareceu que a Vizelpas tinha a possibilidade de no início do ano fazer “um contrato a oito ou a 10 anos a 0,85 euros o megawatt”, quando o preço então era de 0,50 euros. “Éramos para fechar o negócio, mas a operadora veio dizer em fevereiro ou março que era melhor não o fazermos, porque o Governo estava a negociar uma redução no preço da energia e ia pôr um teto para o gás que iria condicionar o preço da eletricidade e era melhor aguardarmos até agosto”, referiu.
Modesto Araújo esclareceu que a empresa esperou até final de junho e, “qual espanto, a fatura de julho é quase 250 mil euros”.
“Os nossos governantes negociaram um teto para o gás, mas meteram um mecanismo de ajuste que é pago pelas empresas, ao contrário de Espanha”, esclareceu, reconhecendo que se tivesse feito o contrato em fevereiro “a energia estava mais barata”.
O empresário equaciona “parar uma ou duas linhas de produção porque há produtos que deixam de ser competitivos”, admitindo: “Se calhar vamos parar e mandar pessoas para o desemprego”.
A Vizelpas, com 24 anos de existência, tem 210 funcionários e exporta 65% da produção.
“Tínhamos um projeto para outro concelho que vamos ponderar”, adiantou, salientando ainda que também iniciou a compra de terrenos para instalar energia renovável, mas a burocracia inerente é “um trinta e um”.
Modesto Araújo lembrou que “nunca na história da empresa se elaborou um orçamento que esteja sujeito à sorte, isto é, à variação do preço de energia”, pedindo ao Governo que olhe para a situação, porque é “preciso que haja uma uniformidade de preço” para todas as empresas.
“Estamos na União Europeia e, por isso, devemos ter regras similares para todos, não é uns terem energia a oito e outros a oitenta. Têm de ser tomadas medidas nesta área para haver mais equidade na competitividade das empresas”, defendeu.
No caso da RCDPLAS, de Vale de Cambra (Aveiro), empresa especializada na reciclagem de plásticos, em julho de 2021 a fatura da eletricidade era de 34 mil euros, passando para 88 mil euros em julho último.
“Em termos da estrutura de negócio, face aos preços de venda e ao volume de vendas, o negócio deixou de ser viável. Passamos a ter um prejuízo todos os meses”, afirmou o sócio-gerente Rui Carvalho, quando questionado sobre os impactos do aumento do custo da energia.
Rui Carvalho explicou que “a subida de preços que se tem de fazer e caso não haja aceitação dos clientes, a empresa deixa de ter mercado e em três, quatro meses, deixa de ter fundo de maneio para suportar os custos de energia e outros tantos custos”.
De acordo com este sócio-gerente, a empresa, que tem no estrangeiro o destino de 40% da produção, deixará de ter competitividade, pois “não consegue sequer concorrer” com empresas do mercado nacional.
“Há empresas que não estão a pagar o mecanismo de ajuste e têm metade do custo da energia que nós temos, porque têm contratos mais antigos”, declarou, assumindo “não ser fácil concorrer com estas empresas que não têm culpa desta situação”.
Diogo Mourão, também sócio-gerente da RCDPLAS, empresa com quatro anos e meio de existência e 20 funcionários, salientou que esta “vinha a ter um caminho sustentável”, apesar de a pandemia de covid-19 ter trazido mais dificuldades.
Reconhecendo que o aumento do preço da energia “põe em causa planos de crescimento e desenvolvimento da empresa” ou “até pagar melhor aos colaboradores”, Diogo Mourão concretizou: “A empresa fica estrangulada e a trabalhar para pagar uma fatura da eletricidade”.
“Ou seja, uma empresa que gerava um ‘cash-flow’ positivo, tinha visão e dinheiro para investir, boa carteira de clientes internacionais, de repente vai trabalhar para pagar a fatura de eletricidade”, lamentou.
Ao executivo, Diogo Mourão pede “um apoio que seja direcionado em concreto à diminuição da fatura da eletricidade”, porque o resto a RCDPLAS tem: “Uma boa gestão, um plano, pessoas e clientes”.
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