Desde 2015 que desemprego jovem é 2,5 vezes superior ao desemprego geral
Durante a pandemia, o desemprego jovem chegou mesmo a ser 3,5 vezes superior à taxa de desemprego da população em geral. Precaridade é um dos fatores que explica o agravamento do desemprego jovem.
Desde 2015 que a taxa de desemprego dos jovens com menos de 25 anos em Portugal tem sido mais do dobro da taxa de desemprego da população em geral. Durante a pandemia chegou mesmo a ser 3,5 vezes superior. Dificuldades na transição para o mercado de trabalho, incluindo entre os jovens mais instruídos, e a prevalência de relações contratuais não permanentes explicam o agravamento do desemprego jovem.
Já entre os graduados com idade compreendida entre os 25 e 34 anos que estão empregados, cerca de 30% são considerados sobrequalificados para a profissão que exercem, revela o Livro Branco “Mais e Melhores empregos para os jovens”, uma iniciativa da Fundação José Neves (FJN), do Observatório do Emprego Jovem e da Organização Internacional do Trabalho para Portugal.
Carlos Oliveira, presidente da Fundação José Neves, reconhece os “avanços de Portugal nos últimos anos ao nível da escolaridade da sua população, que se refletem nas competências das novas gerações de trabalhadores”, mas alerta que há ainda “um longo caminho a percorrer para dotar os jovens de hoje de melhores empregos, que lhes permitam realizar-se a nível profissional e pessoal”.
“Esse trabalho deve passar por uma articulação entre todos os agentes dos setores relevantes e os caminhos aqui apontados são um primeiro contributo que devem agora ser implementados e monitorizados de forma contínua para avaliar o impacto do seu desenvolvimento”, considera, em comunicado.
Entre 2019 e 2020, mais de 70% dos empregos que se perderam em Portugal eram ocupados por jovens. São vários os motivos por detrás destes números. Por um lado, o estudo defende que a diminuição do emprego jovem está relacionada com a disrupção dos sistemas de ensino e dos processos de transição da escola para o mercado de trabalho, que dá origem à especial penalização dos jovens com idades entre os 16 e os 24 anos. Entre estas idades, o desemprego aumentou muito entre os mais qualificados, o que não aconteceu entre os jovens dos 25 aos 29 anos.
Mas, para além das dificuldades crescentes na transição do ensino superior para o mercado de trabalho, a vulnerabilidade do emprego jovem é explicada através da prevalência de contratos de trabalho não-permanentes. Antes da pandemia da Covid-19, e apesar de esforços contínuos no combate ao emprego precário, 56% dos trabalhadores com menos de 25 anos tinham contratos a termo certo, face a apenas 18% na população em geral. Um indicador muito elevado quando comparado com as médias da União Europeia”, lê-se no documento.
Soma-se a esta situação os crónicos salários baixos dos portugueses e a sua estagnação, em termos reais, ao longo da última década, sendo que até o prémio salarial da educação — que continua a existir de forma clara — tem vindo a diminuir.
“Em 2020, a taxa de abandono escolar em Portugal foi de 8,9%, um valor abaixo da meta de 10% estabelecida pela União Europeia para esse ano. Esta progressiva redução tem sido acompanhada por um aumento acentuado do número de jovens que terminam o ensino secundário e por uma massificação do ensino superior. Num país com um histórico défice de qualificações da sua população ativa, esta tendência tem vindo a agravar as diferenças intergeracionais, no que diz respeito aos níveis de educação. Ainda assim, os fortes investimentos na qualificação da população portuguesa, ao longo das últimas décadas, nem sempre são suficientes para assegurar estabilidade e qualidade de emprego para os jovens portugueses”, conclui o estudo.
Estes fatores aprofundam a divergência entre as expectativas dos jovens e as oportunidades oferecidas pelo mercado de trabalho. O Livro Branco refere ainda que existe um verdadeiro desfasamento entre as competências dos jovens trabalhadores e as profissões que exercem, com cerca de 30% dos graduados, dos 25 aos 34 anos, a serem considerados sobrequalificados para a profissão que exercem.
Áreas de intervenção prioritárias
Para além do diagnóstico, o Livro Branco “Mais e melhores Empregos para os Jovens” aponta várias áreas de intervenção prioritárias para a criação de mais e melhores empregos para os jovens, nomeadamente apostar nos setores de atividade intensivos em conhecimento ou tecnologia e melhorar a articulação entre o sistema de ensino e o mercado de trabalho.
1) Apostar nos setores de atividade intensivos em conhecimento ou tecnologia
Nos últimos anos, o emprego tem crescido, sobretudo, em setores de atividade pouco intensivos em conhecimento ou tecnologia, que acabam por absorver boa parte da mão-de-obra jovem. Estes setores tendem a praticar salários mais baixos e a recorrer fortemente ao emprego temporário. Existem, por outro lado, setores intensivos em conhecimento que também têm vindo a crescer, e que oferecem salários mais elevados, como é o caso da área da consultoria ou da programação informática, revela o Livro Branco.
“Neste contexto, a promoção de emprego jovem de qualidade requer, também, uma forte articulação com a política industrial, de inovação e de apoio às empresas, no sentido de promover o crescimento de setores que oferecem melhores condições de trabalho. É importante que as políticas de emprego sejam coerentes com estas áreas das políticas públicas.”
2) Melhorar a articulação entre o sistema de ensino e o mercado de trabalho
Outra das prioridades identificadas pelo estudo é a articulação entre sistema de ensino e mercado de trabalho, nomeadamente através do reforço e diversificação das ofertas formativas, mas também através do envolvimento dos empregadores na comunicação e no desenvolvimento de competências procuradas.
“A valorização do ensino profissional é um passo nessa direção”, consideram as entidades envolvidas no Livro Branco, embora, em Portugal, estes percursos educativos tendam a sofrer de uma “fraca reputação”, com a percentagem de estudantes que seguem o ensino profissional bastante inferior à média europeia.
“Melhorar a qualidade do emprego jovem requer acelerar a modernização da economia portuguesa, tornando-a mais especializada em setores intensivos em conhecimento. Para isso, as políticas ativas de emprego, industrial, de apoio às empresas, de ciência e tecnologia e de educação têm de estar alinhadas com esse desígnio estratégico. Sem a implementação de uma agenda ambiciosa nesta área será difícil reter em Portugal a geração mais qualificada de sempre”, defende Paulo Marques, coordenador do Observatório do Emprego Jovem e Professor de Economia Política no ISCTE.
O Livro Branco, que reúne informação de modo a contribuir para a identificação de desafios e de recomendações sobre o emprego jovem, bem como promover o debate público, com o envolvimento de todos, na promoção de mais e melhores empregos para os jovens, foi objeto de uma auscultação pública, que incluiu representantes dos parceiros sociais e que decorreu no dia 15 de julho. O documento será apresentado publicamente no início do próximo ano.
A versão integral do Livro Branco pode ser consultada aqui.
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