Ondas de calor e maior concentração de gases. 2022 foi um ano de temperaturas recorde em Portugal e no mundo

Ondas de calor, seca, incêndios e aumento de emissões foram os ingredientes que levaram as temperaturas para máximos em 2022. Foi o ano mais quente em Portugal desde que há registo.

As temperaturas registadas em 2022 voltaram a bater recordes em Portugal e no mundo, valendo a 2022 um lugar no pódio dos anos mais quentes de sempre.

Segundo um relatório da Copernicus, o Programa de Observação da Terra da União Europeia, divulgado esta terça-feira, se o último verão foi considerado como o mais quente de sempre na Europaaltura em que se assistiram a sucessivas ondas de calor em Portugal e no continente, tendo os termómetros chegado, em algumas regiões do país, aos 46°C o ano de 2022 foi o segundo mais quente na Europa e o quinto mais quente de sempre em todo o mundo.

Em Portugal, o cenário não terá sido diferente. Os dados preliminares do Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), divulgados também esta terça-feira, indicam que o ano passado terá sido o ano mais quente de sempre a nível nacional, ou seja, desde 1931, altura em que o IPMA começou a fazer a análise dos dados. A conclusão acontece depois de Portugal ter vivido seis ondas de calor: quatro no verão, uma na primavera e outra no outono, indica o IPMA. Julho foi o mês mais quente de sempre em território nacional.

“O ano de 2022 teve uma temperatura média de 16,6°C, mais 1,4°C acima do valor médio. A temperatura máxima terá sido a segunda mais alta desde de que há registo, sendo que a mais elevada de sempre foi registada muito recentemente, em 2017. Não foi assim há tanto tempo“, revela ao ECO/Capital Verde a climatologista do IPMA, Vânia Pires, acrescentando que a temperatura mínima registada em 2022 foi a quarta mais alta desde 1931, “algo bastante significativo”.

Quanto à situação de seca severa e extrema que se prolongou durante os primeiros nove meses de 2022, esta terá sido anulada pelos eventos de precipitação intensa vividos durante o mês de novembro e dezembro.

"O facto de um ano ser seco não quer dizer que não possam haver estes momentos mais intensos de precipitação. Houve aqui uma recuperação grande em termos do balanço final da precipitação em 2022”

Vanda Pires, climatologista do Instituto Português do Mar e da Atmosfera

Face ao aumento da frequência e intensidade dos eventos climáticos extremos registados nos últimos anos, a especialista não descarta um agravamento da situação de seca, de ondas de calor, e, eventualmente, dos períodos de chuva “muito localizados e intensos” tal como aqueles vividos no ano passado. “Obviamente que os eventos extremos têm tido uma frequência maior. É uma tendência que em Portugal temos estado a verificar nos últimos 20, 30 anos“, sublinha.

Concentração de gases na atmosfera acelera em 2022

Os dados revelados pela Copernicus não deixam margem para dúvidas: as temperaturas estão a subir de forma acelerada e os eventos extremos climáticos estão a tornar-se cada vez mais frequentes, resultado de uma maior “concentração atmosférica de gases com efeito de estufa”.

Enquanto as concentrações de dióxido de carbono aumentaram, em 2022, em cerca de 2,1 partículas por milhão (ppm), as concentrações de metano na atmosfera aumentaram cerca de 12 partículas por milhar de milhão (ppb), “mais elevadas do que a média, mas abaixo dos máximos históricos dos últimos dois anos”.

Para ambos os gases, detalha a Copernicus, “estas são as concentrações mais elevadas” de acordo com o histórico do programa, e, se forem incluídos monitorizações realizadas por outras entidades certificadas, então “as concentrações em causa foram as mais elevadas em mais de 2 milhões de anos para o dióxido de carbono e mais de 800 mil anos para o metano”.

O agravamento dos níveis de concentração destes gases é um dado alarmante uma vez que os gases com efeito de estufa, incluindo dióxido de carbono e metano, são os principais motores das alterações climáticas. E, segundo os dados da Copernicus, não existem sinais de que os níveis de concentração vão abrandar.

Temperaturas 0,3°C acima da média

Segundo os cálculos da agência, em 2022, a temperatura média anual esteve 0,3°C acima da verificada no período de referência de 1991-2020, “o que equivale a aproximadamente 1,2°C acima do registado no período 1850-1900 da era pré-industrial”. Além de estar acima da era pré-industrial, a temperatura referida aproxima-se do limite previsto no Acordo de Paris. Em 2015, mais de 190 países assinaram o acordo que visava limitar o aumento da temperatura global a 1,5ºC até 2050.

Isto faz de 2022 o oitavo ano consecutivo de temperaturas superiores a 1°C acima do nível pré-industrial”, frisa a Copernicus.

Além de Portugal, também se verificaram ondas de calor um pouco por todo um mundo — nomeadamente no norte da Índia e na China central e oriental — fator que, na Europa, se aliou à “forte persistência dos baixos níveis de precipitação” e “levaram a condições de seca generalizadas”.

O verão, como tem sido regra, também ficou marcado pelos incêndios florestais. A diferença entre 2022 e os anos anteriores é que o ano passado voltaram a bater-se recordes em matéria de emissões resultantes dos fogos. Segundo a Copernicus, entre junho e agosto de 2022, registaram-se os níveis de emissões mais elevados na União Europeia e no Reino Unido dos últimos 15 anos.

PAULO CUNHA/LUSAPAULO CUNHA/LUSA

Se há maneira mais evidente de medir os efeitos do aquecimento global, é olhando para o degelo nas regiões polares que, em 2022, não escaparam à pressão climática.

Segundo a Copernicus, ambas as regiões polares viram episódios de temperaturas recorde durante 2022. Na estação Vostok, na Antártida Oriental, por exemplo, a temperatura registada atingiu os -17,7°C, a mais alta dos últimos 65 anos.

Por seu turno, na Gronelândia, durante o mês de setembro, as temperaturas estiveram 8°C acima da média. Segundo os dados da agência, quase todo o país sentiu temperaturas médias mais elevadas do que em qualquer outro mês de setembro desde pelo menos 1979. A causa? “Os ventos que vieram do sul e que eram mais quentes do que o normal”, explica o relatório.

Já a Antártida, viu as condições de gelo marinho “invulgarmente” baixas durante todo o ano, com especial destaque para a última metade de fevereiro, altura em que a extensão diária de gelo do mar Antártico atingiu um recorde e ultrapassou o valor mínimo anteriormente verificado em 2017.

Samantha Burgess, directora adjunta da Copernicus aponta que “2022 foi mais um ano de extremos climáticos em toda a Europa e a nível global”, fenómeno que permitiu sublinhar “que já estamos a sofrer as consequências devastadoras do aquecimento do planeta”.

Para a responsável, já não é possível ignorar os relatórios e alertas científicos: “os últimos Climate Highlights [da Copernicus] dão provas claras de que para evitarmos as piores consequências, a sociedade terá que reduzir, urgentemente, as emissões de carbono e adaptar-se, rapidamente, às alterações climáticas“.

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