Taxa sobre embalagens de alumínio “preocupa” restauração, sem alternativas a preços acessíveis

Setor considera que alternativas às embalagens descartáveis de alumínio no mercado são "mais caras" e que as reutilizáveis ou pessoais levantam questões de saúde pública e de logística.

Com a inflação a pressionar a economia logo no arranque do ano, o setor da restauração pôde respirar de alívio depois de o Governo ter decidido adiar a cobrança da taxa sobre as embalagens de utilização única à base de alumínio, prevista para entrar em vigor em janeiro de 2023.

Mas esse alívio será de pouca dura e a taxa, que começará a ser cobrada em setembro, deverá começar a produzir impactos “elevados” e “negativos” num setor que diz estar “preocupado”, pois não encontra alternativas mais baratas, e igualmente resistentes, às embalagens de alumínio. Tudo isto, ao mesmo tempo que se antecipa que a inflação continue em alta, tal como o preço das matérias-primas, dois fatores que terão pesado na decisão do Executivo de António Costa.

Ao ECO/Capital Verde, a Associação Nacional de Restaurantes (PRO.VAR) explica que a decisão do Governo de adiar a cobrança não terá sido tomada de ânimo leve e prende-se com a “dificuldade [do setor] na obtenção de embalagens ecológicas a preços adequados“, tarefa agravada devido à inflação, que faz com que “as alternativas existentes no mercado” se mantenham “a preços ainda elevados“. Além disso, a entidade aponta ainda que o setor regista “stocks elevados de embalagens de alumínio”.

Em causa está a contribuição no valor de 30 cêntimos, que atualmente vigora sobre as embalagens de utilização única de plástico ou multimaterial com plástico, e que, em setembro, passará a abranger também as embalagens de utilização única de alumínio ou multimaterial com plástico ou alumínio usadas no take away ou entrega ao domicílio, tal como estava previsto no Orçamento do Estado para 2022, documento que previa que ambas as taxas permitissem ao Estado arrecadar 10 milhões de euros.

No despacho publicado no início do ano, o Governo explica que o adiamento da cobrança resulta da “necessidade de revisão do seu regime jurídico, que se encontra em preparação”.

A associação de restaurantes recorda que as embalagens de utilização única de alumínio “são as mais utilizadas pelo setor para o transporte de refeições” e argumenta que “nesta área, em específico, ainda não foram encontradas soluções tão efetivas considerando o custo-benefício”. “Por isso, a implementação desta medida tendo em conta o contexto atual de inflação e aumento de custos”, ainda que tenha sido adiada, “preocupa muito os empresários”, indica a entidade.

Já a secretária-geral da Associação da Hotelaria, Restauração e Similares de Portugal (AHRESP), Ana Jacinto, ressalva que a restauração será “das mais atingidas” pela decisão do Governo de taxar as embalagens de alumínio, em setembro, por considerar que esta contribuição, considerando todos os custos adicionais, “gera um impacto direto no preço da refeição e, por conseguinte, no negócio“.

Além disso, refere a responsável ao ECO/Capital Verde, as empresas do setor têm de assegurar e antecipar o pagamento da contribuição no momento da compra das embalagens, “o que exige uma capacidade financeira de que muitas empresas não dispõem atualmente”.

Ana Paula, proprietária do restaurante Os CarluchosHugo Amaral/ECO

O impacto da inflação foi assinalado como alerta pela restauração ao Governo. Ao ECO/Capital Verde, o Ministério do Ambiente e da Ação Climática ressalva que a “esta preocupação foi levantada por vários agentes do setor e ponderada” na tomada de decisão, porém, argumenta que, uma vez que a taxa tem como objetivo fomentar uma “alteração de comportamentos”, o Governo entendeu que “existem alternativas” a serem consideradas.

Para a PRO.VAR, a expectativa é que o impacto económico além de “muito elevado” seja, também, “negativo para os empresários que operam nos segmentos das refeições económicas“, argumentando que o valor da taxa ou a compra de embalagens mais sustentáveis acabará por ter “um maior peso sobre os custos, podendo levar a uma diminuição das margens, ou caso de ajustamento do preço final, levar a uma quebra nas vendas”. Tal como aconteceu quando foi adotada a taxa sobre as embalagens de plásticos take away, aponta a AHRESP.

Mas os impactos económicos são um argumento que a Zero rejeita, argumentando que nem os estabelecimentos comerciais, nem os os consumidores serão penalizados se se recorrer à utilização de embalagens reutilizáveis, alternativa apontada, também, pelo Governo.

“Desde julho de 2021 que é possível aos consumidores usarem as suas próprias embalagens/recipientes quando vão a um pronto a comer, pelo que é possível evitar ter de pagar a taxa. Assim, o impacto para os consumidores pode ser zero, caso alterem a sua prática. No caso dos restaurantes, este valor deve ser cobrado aos consumidores, pelo que, à partida, será neutro”, afirma a associação.

Perante a possibilidade de levar as suas próprias embalagens, os consumidores podem evitar pagar esta taxa, pelo que não é um fator dissuasor da utilização do serviço, nem penalizador do ponto de vista financeiro

Zero

Mas para as entidades do setor da restauração as embalagens pessoais ou reutilizáveis levantam questões de segurança alimentar e higiene, que podem “dar origem a graves contaminações”, e também criam dificuldades a nível de logística.

Segundo Ana Jacinto, a reutilização de recipientes em substituição das embalagens de alumínio “implica uma série de requisitos complexos que devem ser cumpridos”, nomeadamente, a criação de um sistema de gestão de embalagens a funcionar em circuito fechado; a cobrança de um valor de depósito ao cliente; a higienização da própria embalagem para esta ser novamente colocada em circulação e, ainda, a comunicação de dados à Agência Portuguesa do Ambiente.

Tudo isto acaba por dificultar a utilização destas embalagens por parte dos estabelecimentos”, frisa a secretária-geral da AHRESP, ao passo que a PRO.VAR refere também que “a inexistência de formatos e dimensões estandardizados, será necessário que o estabelecimento tenha medidores de quantidades de acordo com as doses que comercializa”.

Apesar da contestação, o setor garante ter noção de que as embalagens reutilizáveis tornar-se-ão numa questão “incontornável” e que esta alternativa terá que ser implementada eventualmente, tendo em conta que os regulamentos em Portugal e na União Europeia já obrigam “à sua implementação parcial” a partir de 2024.

Ainda assim, argumenta a secretária-geral da AHRESP, “ainda existe um longo caminho a percorrer para que esta alternativa seja considerada uma verdadeira opção para o setor”.

Além de ter decidido adiar a cobrança da taxa sobre os alumínios, o também Governo decidiu que os copos de plástico deixariam de ser abrangidos pela contribuição aplicada às embalagens de plástico por entender que “embora possam constituir embalagens de utilização única”, “a sua aplicação é desajustada na aquisição isolada de uma bebida”.

Ao ECO/Capital Verde, a Zero considerou que as duas decisões são “lamentáveis” e uma “má forma de começar o ano” uma vez que demonstram “que os nossos representantes políticos ainda não compreenderam o espírito da iniciativa e à mínima dificuldade alteram, adiam, em vez de procurar reforçar” — opinião que contrasta com a da restauração, que considera o adiamento como “positivo” uma vez que “o setor tem enfrentado, nestes últimos dois anos, enormes constrangimentos“.

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