BRANDS' ADVOCATUS O dilema das Direitas

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  • 13 Fevereiro 2023

Ando afastado da vida política e partidária por opção mas também por entusiasmo com o que se passa no espaço alternativo ao de António Costa.

Chega mesmo a ser bizarro chegarmos à conclusão que, depois de todas as trapalhadas governativas na escolha de membros do Governo (nunca visto igual nos últimos tempos), António Costa ainda se consegue apresentar como o político que aparentemente maior estabilidade governativa consegue oferecer ao País. É de facto bizarro.

É igualmente bizarro que o espaço do centro-direita não consiga capitalizar verdadeiramente o conjunto de trapalhadas associadas a membros do Governo, à inércia reformista ou mesmo à inexistência de alguns Ministros (alguém sabe do Ministro da Economia ou da Ministra da Justiça? Só para dar dois exemplos).

São tantas as trapalhadas que quase que é impossível recordarmo-nos de todas elas. O questionário de “bons modos e decência” é apresentado como se fosse a última descoberta da democracia portuguesa, com o visto presidencial, ignorando-se, por exemplo, que já no passado tivesse existido quem não pudesse tomar posse como governante por aplicação de um crivo de bom senso e razoabilidade governativa. Pasme-se, mas até foi o Governo de Passos Coelho (o tal Governo “demoníaco”) a dar provas dessa prática.

Parece extraordinário, de facto, que o bom senso e razoabilidade tenham que ser questionados. Neste Governo a última trapalhada apaga a anterior e assim sucessivamente. E, no auge da trapalhada maior da TAP (só aqui neste tema específico são tantas as trapalhadas que nem é fácil enunciá-las), o tema que é posto inteligentemente a circular é o do papel do Chega numa futura maioria de centro-direita. Um tema que verdadeiramente só interessa a António Costa e a André Ventura e que dificulta obviamente o entendimento à direita para uma alternativa estável e um projeto reformador para Portugal.

Esteve bem Luís Montenegro ao afirmar que o seu projeto é o País e o seu foco as Pessoas, mas também é verdade que não tem tempo a perder para demonstrar que o seu projeto é mobilizador e transformador. Diria mesmo que precisamos de acreditar, em geral, que os nossos políticos no Centro-Direita saberiam o que fazer se fossem Governo, que seriam capazes de se entender em prol de algo mais que não seja a mera aritmética governativa ou a sobrevivência desesperada de alguns, que conseguem ter uma visão de País e sobretudo um plano de como lá chegar.

No meio disto tudo, não se fala de reformas, não se fala das dificuldades económicas que empresas e famílias sentem, não se fala de nada mais do que a mera espuma dos dias. E é também por isso que o fosso entre a política e o mundo real se vai sentindo de forma cada vez mais acentuada.

O Centro Direita enfrenta hoje vários dilemas. Em vez de se entender na resposta à geringonça de António Costa, optou pela via da fragmentação, com o surgimento de novos Partidos e com a luta fratricida entre praticamente todos eles. A lição de 2015 deveria ter levado à formação de um Acordo de entendimento no Centro-Direita que, baseado no fermento político do “Portugal à Frente”, pudesse construir uma alternativa séria. Eu sou daqueles que reconhecem nesse Governo e nessa liderança o talento necessário para a tal alternativa que todos gostaríamos de ter, mas a verdade dos factos infelizmente é outra. A fusão ou federação do centro-direita democrático não é mais do que uma ilusão de alguns.

O PSD continuará dividido entre a tentação histórica hegemónica de ser a única alternativa à governação socialista ou o de assumir o seu papel central na fusão, federação ou reforma do espaço do centro-direita. Luís Montenegro tem argúcia política, tem talento e caminho a fazer, mas, ao contrário do que afirma, não poderá estar apenas “com a sua gente” porque essa estratégia será manifestamente insuficiente.

Por seu lado, a IL enfrenta os desafios naturais das dores de crescimento, da saída de um líder consistente e credível como Cotrim de Figueiredo e as fraturas quase inevitáveis das divisões internas que, num Partido de história curta, são sempre imprevisíveis. Quem quer ser diferente não pode cair nos mesmos vícios que tanto se criticou em outros.

O Chega enfrenta, por sua vez, o desafio de aproximação ao poder. A história demonstra que os partidos de protesto puro e duro morrem com as aproximações ao poder democrático e moderado. Por sua vez, a moderação forçada e calculista em troca de alguns Ministros é normalmente fortemente penalizada pelo eleitorado. Ventura, para cumprir a sua ambição, tem que conseguir o impossível: moderar o Chega, apesar da sua natureza e da sua razão de existência. Alternativamente, pode ambicionar crescer ainda mais capitalizando o descontentamento de todos os setores e sobretudo a inexistência de um bloco federador da direita moderada e democrática que mobilize todo o centro-direita.

O CDS tem o desafio da vida pela frente. Mostrar que, para além dos quadros extraordinários que continua a ter, também lhe consegue juntar votos. Mostrar que um Partido de Direita moderada, de matriz democrata-cristã, com história de responsabilidade e com um lastro de compromisso com o País ainda faz sentido em Portugal e que o espaço da Direita Democrática e Moderada, com preocupações sociais, continua a fazer sentido e a merecer representação.

Estes serão alguns dos dilemas do centro-direita.

O líder natural de todo este espaço está aparentemente retirado, mas o principal dilema continua a ser o mesmo de 2015: construir uma alternativa credível, com liderança, projeto e equipa. Enquanto isso não acontecer, António Costa continuará a navegar de forma mais ou menos tranquila mesmo que, dia sim dia não, tenha que mandar borda fora alguns dos seus companheiros de viagem.

Filipe Lobo d’Avila, Advogado

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