Salários, impostos e habitação. É isto que patrões e sindicatos querem ver no OE2024
O Orçamento do Estado dá entrada no Parlamento na próxima semana. Patrões e sindicatos já fizeram saber ao Governo o que reivindicam. Alívio da carga fiscal é uma das principais propostas.
Faltam oito dias para o ministro das Finanças entregar no Parlamento a proposta de Orçamento do Estado para 2024. Do alívio da carga fiscal ao aumento dos salários, as confederações patronais e as centrais sindicais já deram a conhecer as suas propostas para o próximo ano, tendo o Governo mostrado abertura para discutir e ponderar o que foi colocado em cima da mesa. Do lado dos empregadores, o foco tem estado sobretudo nos impostos, enquanto do lado dos trabalhadores são os salários que estão em destaque, numa altura em que as famílias portuguesas têm estado confrontadas com um recuo do poder de compra.
No que diz respeito aos impostos, há que distinguir os tributos que são aplicados às empresas daqueles que são exigidos aos trabalhadores.
Comecemos por estes últimos: no seu caderno de encargos, o Conselho Nacional das Confederações Patronais (CNCP) sublinha que é preciso rever os escalões do IRS para reduzir o nível de tributação. “Urge enfrentar de uma vez por todas a necessidade de reduzir a tributação em sede de IRS para aumentar o rendimento líquido disponível das famílias”, salientam os patrões, que não avançam com números concretos para esse alívio.
Também os sindicatos defendem uma redução fiscal, no âmbito do Orçamento do Estado para 2024. “A UGT defende a prioridade da descida do IRS e um novo reequilíbrio face a outros impostos”, realça a central sindical liderada por Mário Mourão.
Em detalhe, a UGT argumenta que o anunciado recuo de dois mil milhões de IRS “tem de se sentir no imediato e no Orçamento do Estado para 2024“, rejeitando um adiamento desse alívio para os anos mais próximos do fim da legislatura.
Mais, esta central sindical quer que os escalões de IRS, bem como as deduções e isenções em sede de IRS, sejam atualizados em linha com os salários e “pelo menos em linha com a inflação prevista”.
A UGT defende ainda a atualização das tabelas de retenção na fonte, o reforço e alargamento do IRS Jovem – o Governo já anunciou a melhoria das condições desse regime, mas o universo de beneficiários será o mesmo – e a manutenção da relação entre o salário mínimo e o mínimo de existência. “Quem recebe o salário mínimo não deve pagar IRS”, considera a central sindical. Esta hipótese chegou a ser colocada, uma vez que o Governo desligou a evolução do mínimo de existência da retribuição mínima garantida, mas o ministro das Finanças e o primeiro-ministro já vieram, entretanto, afastá-la.
Também no capítulo fiscal, a UGT quer que seja criado um benefício fiscal para a realização de formação profissional, em linha com o acordado em sede Concertação Social, que seja aumentado de 50% para 150% do benefício fiscal associado ao pagamento de quotizações sindicais e que sejam reforçadas as deduções em sede de IRS com educação, saúde e lares.
Quanto à CGTP, em entrevista ao ECO, a secretária-geral defendeu um maior equilíbrio entre os vários impostos, mas frisou que a prioridade deve ser mesmo aumentar os salários. No seu caderno reivindicativo, a central sindical defende alterações no IRS como a aplicação de mais escalões e a redução das taxas, bem como o englobamento obrigatório de todos os rendimentos, “garantindo que a progressividade se aplica independentemente da origem dos rendimentos”.
O Governo já disse que vai avançar mesmo com uma redução da carga fiscal aplicada aos rendimentos do trabalho, mas não explicou em que moldes. Em princípio, a criação de mais escalões está afastada, uma vez que Portugal já é dos países com mais patamares de rendimentos no IRS.
Menos custos para as empresas
Do lado da tributação aplicada às empresas, foram também feitas propostas para o Orçamento do Estado por parte dos parceiros sociais.
Os patrões querem a redução da taxa normal de IRC de 21% para 17% (e para 15%, no caso das pequenas e médias empresas), bem como a eliminação progressiva da derrama estadual, “de modo a abranger apenas as empresas com lucro superior a 5 milhões de euros”.
As confederações que representam os empresários exigem também que, enquanto não for possível abolir as tributações autónomas por razões orçamentais, a tabela deste tributo deve ser atualizada, “passando a incidir apenas sobre os encargos dedutíveis“. A este nível, querem também que seja abolido a norma do Código do IRC que prevê a majoração destas taxas, quando os sujeitos passivos apresentam prejuízos fiscais.
Ainda do lado dos custos para as empresas, destaque para uma proposta antiga que os patrões decidiram recuperar: querem que a Taxa Social Única (TSU) a cargo dos empregadores desça em 1%, sendo ” acompanhada de um reforço equitativo do valor do imposto sobre o valor acrescentado (IVA)”. Ou seja, propõem que paguem menos contribuições sobre os salários e que a Segurança Social receba, em alternativa, mais receita do IVA. O Governo já fechou a porta a esta proposta, alegando que colocaria em causa a sustentabilidade da Segurança Social.
Já nos cadernos reivindicativos das centrais sindicais, a CGTP defende a “aplicação da taxa efectiva de IRC às grandes empresas, incidido sobre os resultados contabilísticos por estas apresentados”, bem como a exclusão, como regra, das grandes empresas dos privilégios atribuídos ao abrigo do Estatuto dos Benefícios Fiscais, “em quaisquer outros instrumentos usados para abater as obrigações fiscais do grande capital”.
A UGT não tem propostas relativas à tributação das empresas.
Salários são prioridade dos sindicatos
“Prioridade máxima“. É essa a expressão usada para o aumento dos salários pela secretária-geral da CGTP, na referida entrevista ao ECO. A central sindical defende aumentos de 150 euros para todos os trabalhadores e entende que o salário mínimo nacional deve chegar aos 910 euros em janeiro, atingindo os mil euros ainda no curso do próximo ano.
Ainda que os salários não sejam uma matéria diretamente relacionada com o Orçamento do Estado (na medida em que fazem, sobretudo, parte das contas dos privados), é importante discuti-los neste âmbito, já que o que for decidido para o globalidade do mercado de trabalho terá impacto nos ordenados pagos aos funcionários públicos e, consequentemente, nas contas do Estado.
Quanto à UGT, a proposta passa pela aplicação do referencial acordado há um ano com o Governo e os patrões: aumentos de 4,8%. A central sindical diz, porém, que há condições para ir mais longe do que estava previsto nesse entendimento no que concerne o salário mínimo nacional: em vez dos 810 euros projetados para janeiro, a UGT está a defender uma subida dos atuais 760 euros para 830 euros.
No pacote de propostas dos patrões, não há menção a este tema, mas, por exemplo, o presidente da Confederação Empresarial de Portugal (CIP), Armindo Monteiro, já disse que as empresas podem ser mais generosas do que ficou acordado há um ano, desde que haja um alívio da carga fiscal.
Parceiros não esquecem crise na habitação
Num ano marcado pela crise na habitação, os parceiros sociais não esqueceram este tema nas suas propostas para o Orçamento do Estado para 2024.
Por exemplo, a UGT defende a criação de um regime de moratória aplicável a contratos de crédito à habitação garantidos por hipoteca, sem penalizações, o fomento de alternativas no sistema bancário, a criação de linhas de crédito a juros reduzidos com a finalidade de apoiar o pagamento do aumento dos encargos nos contratos de crédito para aquisição de habitação, a retoma da dedução fiscal dos encargos com crédito à habitação, a manutenção da política de limitação do aumento do valor das rendas e a regulação do acesso às medidas de apoio mediante a modulação do critério de rendimento mensal dos agregados com critérios de perda de rendimento disponível.
Já da parte da CGTP, chegam as seguintes propostas: a alteração da lei do arrendamento urbano, nomeadamente no que toca aos despejos; Medidas de controlo das quebras, fixando tetos máximos em função dos rendimentos dos arrendatários; A adoção de medidas que travem a subida dos juros com empréstimos à habitação “e que responsabilizem o sector financeiro, nomeadamente mobilizando os lucros da banca para suportar o aumento das taxas de juro“.
Quanto às confederações patronais, a proposta apresentada por tornar extensiva a todos os contratos, independentemente da data da sua celebração, a dedução dos juros de empréstimos com a aquisição, construção ou beneficiação de imóveis para habitação própria e permanente. Para os casos em que a casa é entidade patronal, pedem que, “enquanto perdurar a crise habitacional que o país atravessa, os valores correspondentes não sejam alvo de tributação nem de descontos para a Segurança Social“.
IVA zero, mais férias e subsídio de refeição maior
À parte das propostas já referidas, a UGT defende, por exemplo, a manutenção e o alargamento do regime do IVA Zero para bens essenciais. “[Deve haver] a revisão com caráter mais permanente dos bens a que se aplica taxa reduzida”, sublinha a central sindical, que propõe ainda o aumento do aumento do valor do subsídio de refeição. Sobre este último ponto, na Administração Pública, o Governo não avançou com nenhuma proposta, o que deve significar que o limite até ao qual essa componente salarial está isenta de descontos não deverá mexer, despromovendo os aumentos pedidos pela UGT.
Da parte do CGTP, além das medidas já mencionadas, há também a realçar, por exemplo, a reivindicação do reforço do papel do Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) na formação de trabalhadores ativos empregados e desempregados “que ficam à mercê das empresas e do mercado” e a eliminação de todas as taxas moderadoras na saúde, bem como o aumento do subsídio por doença, a universalidade do abono de família e o reforço da “almofada” das pensões, o Fundo de Estabilização Financeira da Segurança Social, “procedendo-se regularmente às transferências previstas na lei, que devem deixar de depender da evolução da situação económica e financeira”.
Do lado dos patrões, há um foco também na desburocratização e simplificação. Além disso, defende-se a suspensão da entrada em vigor da obrigação de submissão do SAF-T, sendo que esta é uma velha batalha dos empresários e contabilistas. Estes defendem a revogação dessa obrigação, mas até agora só têm conseguido adiamentos. Os patrões têm também várias medidas viradas para a capitalização das empresas, nomeadamente a revisão do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
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