“Obviamente”, António Costa demite-se do cargo de primeiro-ministro e sai de cena
Chefe do Governo pediu a demissão ao Presidente da República depois das buscas e detenções em torno do negócio da concessão do hidrogénio verde e do lítio. E não volta a recandidatar-se.
O primeiro-ministro, António Costa, pediu a demissão ao Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, depois de saber que é visado numa investigação autónoma pelo Supremo Tribunal de Justiça por causa dos negócios do lítio e do hidrogénio verde. Em causa estão suspeitas de crimes de prevaricação, de corrupção ativa e passiva de titular de cargo político e de tráfico de influência.
“Obviamente apresentei a minha demissão ao Presidente da República”, anunciou esta terça-feira António Costa ao fim de quase oito anos aos comandos do País. “Fui hoje surpreendido com a informação oficialmente confirmada pelo gabinete de imprensa da Procuradoria-Geral República que já foi ou irá ser instaurado um processo-crime contra mim. Estou totalmente disponível para colaborar com a justiça em todo o que é necessário para apurar toda a verdade”, afirmou a partir da residência oficial do primeiro-ministro.
Assim, é entendimento de António Costa que “a dignidade das funções de primeiro-ministro não é compatível com qualquer suspeição sobre a sua integridade e boa conduta e menos ainda com a suspeita de de qualquer ato criminal”. Foram estas as razões invocadas para pedir a demissão.
Contudo, quis deixar claro que é inocente: “Quero dizer olhos nos olhos aos portugueses que não me pesa na consciência a prática de qualquer ato ilícito ou censurável. Não sou arguido, não sei quais são as práticas ou atos sobre as quais há suspeição”.
O líder do PS revelou que “o Presidente da República aceitou a demissão com grande simpatia e não questionou as razões” que estiveram na origem de tal decisão.
Costa esclareceu ainda que não tenciona voltar a assumir funções de primeiro-ministro: “Esta é uma etapa da vida que se encerra e que encerro com a cabeça erguida, de consciência tranquila e com a mesma determinação de servir Portugal e os portugueses. Não, não me vou recandidatar ao cargo de primeiro-ministro”.
O objetivo é mesmo sair de cena. Ainda assim, Costa garantiu que a última coisa que fará é “condicionar e pronunciar-me publicamente sobre a decisão que o Presidente da República tomará”, uma vez que Marcelo pode apenas nomear um novo Governo ou dissolver a Assembleia da República e convocar eleições antecipadas.
António Costa aproveitou ainda “para agradecer aos portugueses pela confiança que depositaram e pela oportunidade que deram para liderar o país em momentos difíceis e exaltantes”.
“Quero agradecer aos órgãos de soberania, Presidência da República e Assembleia da República pela forma como mantivemos uma solidariedade saudável, às regiões autónomas, a todos aqueles que serviram nos meus três governos”, continuou António Costa que também dirigiu “uma palavra de simpatia e gratidão a todos os líderes e dirigentes partidários, aos partidos da oposição, aos partidos que mantiveram acordo de incidência parlamentar com o PS”. E, por fim, “uma palavra de agradecimento à minha família e à minha mulher”, afirmou.
Esta manhã, António Costa foi duas vezes ao Palácio de Belém, depois das buscas e da detenção de dois homens da confiança do líder socialista. Pouco antes das 10h, reuniu-se durante cerca de meia hora com Marcelo Rebelo de Sousa. O chefe do Governo quis informar o Presidente da República sobre a operação em curso. Mas pelas 13h voltou Belém, após a PGR revelar que o próprio está a ser investigado em processo autónomo pelo Supremo Tribunal de Justiça.
No âmbito de inquérito dirigido pelo Ministério Público do Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP), foram realizadas “diligências de busca para identificação e apreensão de documentos e outros meios de prova de interesse apara a descoberta da verdade”. Diz o gabinete de Lucília Gago que foram ordenadas “17 buscas domiciliárias, cinco buscas em escritório e domicilio de advogado, 20 buscas não domiciliárias, designadamente: em espaços utilizados pelo chefe do gabinete do Primeiro-Ministro, no Ministério do Ambiente e da Ação Climática, no Ministério das Infraestruturas e na Secretaria de Estado da Energia e Clima”. E ainda na Câmara Municipal de Sines e “na sede/espaços de outras entidades públicas e de empresas”.
João Galamba é um dos arguidos e o agora primeiro-ministro demissionário vê o Supremo Tribunal de Justiça analisar suspeitas de que António Costa terá tido intervenção para “desbloquear” os negócios do lítio, do hidrogénio e do data center de Sines, que estão a ser investigados.
“No decurso das investigações surgiu (…) o conhecimento da invocação por suspeitos do nome e da autoridade do primeiro-ministro e da sua intervenção para desbloquear procedimentos no contexto suprarreferido”. Tal como manda a lei, “tais referências serão autonomamente analisadas no âmbito de inquérito instaurado no Supremo Tribunal de Justiça”, diz o comunicado da PGR.
As diligências foram ordenadas ou autorizadas pelas entidades competentes – Ministério Público e juiz de Instrução Criminal – “e estão a ser executadas com o apoio operacional de elementos da Polícia de Segurança Pública (PSP) e da Autoridade Tributária e Aduaneira (AT)”.
Participam nas buscas 17 magistrados do Ministério Público, três magistrados judiciais, dois representantes da Ordem dos Advogados, cerca de 145 elementos da PSP e nove da AT. As buscas nos espaços utilizados pelo chefe do gabinete do Primeiro-Ministro estão a ser acompanhadas por juiz de Instrução Criminal.
(Notícia atualizada às 15h03)
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