Elvira Fortunato recua e, afinal, garante que não cancelou parcerias com escolas americanas
Ministra da Ciência cancelou os contratos da FCT com três escolas americanas, mas depois das críticas de que foi alvo, recua e remete a decisão para o próximo Governo.
Elvira Fortunato deu o dito por não dito. A ministra da Ciência cancelou os contratos de Parcerias Internacionais da Fundação Ciência e Tecnologia (FCT) com três universidades americanas, mas, perante as críticas públicas de personalidades como Nuno Sebastião, Pedro Siza Vieira e Carlos Oliveira, e as iniciativas privadas de empresários e académicos ao mais alto nível do Governo, Elvira Fortunato remete, agora, uma decisão para o próximo governo.
Em declarações citadas pela TSF já este domingo — a notícia do fim dos contratos foi revelada pelo Expresso na sexta-feira –, Elvira Fortunato diz que a decisão caberá ao próximo Governo por uma questão “ética”. “O Ministério não terminou nenhum tipo de parceria com nenhuma universidade americana. Aquilo que aconteceu é que o contrato que existia terminava agora no final de dezembro“, disse Elvira Fortunato, mas admite que foi enviada “uma carta com os termos de um novo contrato a ser renegociado”, mas não divulgou os seus termos.
Como o ECO revelou em primeira mão, a ministra tinha ignorado um parecer encomendado pelo Conselho Nacional da Ciência, Tecnologia e Inovação (CNTI) a um grupo de personalidades independentes como Maria Manuel Mota, Isabel Furtado e João Barros, que defendia a continuidade destas parcerias com a Carnegie Mellon University, o MIT e a University of Texas at Austin, que começaram em 2006. Foi entregue ao Conselho e à ministra em junho, mas Elvira Fortunato deu instruções para esconder o parecer do escrutínio público.
As reações públicas contra a decisão da ministra foram particularmente severas:
- “Estas parcerias são daqueles exemplos claríssimos em que investimento de longo prazo gera retorno reputacional e financeiro para Portugal”, defende o fundador da Feedzai, Nuno Sebastião. “Só mesmo uma falta de conhecimento e miopia é que pode ter uma interpretação diferente e que justifique o cancelamento (a um mês de serem renovadas) destas parcerias“, atira o empreendedor.
- “Não consigo conformar-me com esta decisão”, escreveu Pedro Siza Vieira, antigo ministro da Economia e que acompanhou estas parcerias. “A mais triste herança de uma ministra que nunca o chegou a ser, num governo que não merecia chegar ao fim de vida contrariando tudo o que defendeu nos últimos anos”.
- “Encerrar estas parcerias numa altura “fácil” de “orçamentos expansionistas” não pode ser seguramente apenas uma decisão financeira”, considerou Carlos Oliveira em artigo de opinião no ECO. “É uma escolha que reflete uma visão limitada sobre o que Portugal pode e deve ser no cenário internacional. Neste momento crítico, apelo à Ministra Elvira Fortunato para reconsiderar esta decisão, se não o fizer, estou certo de que daqui a 5 ou 6 meses o novo Governo o fará”.
As últimas 48 horas foram agitadas no meio empresarial, académico e científico português. Apanhados de surpresa pela decisão da ministra, também pelo facto de o Governo estar, do ponto de vista político, em gestão, já que as eleições legislativas estão marcadas para 10 de março, decisores empresariais e académicos desenvolveram contactos ao mais alto nível do Governo para reverter a decisão de Elvira Fortunato, fazendo valer o parecer entregue ao Conselho Nacional da Ciência, Tecnologia e Inovação.
Quem integrou este grupo que fez o parecer a pedido do conselho de ciência? Guy Villax, João Barros, Isabel Sousa Pinto, Maria Manuel Mota, Teresa Pinto Correia e Isabel Furtado. E o que concluiu o parecer que Elvira Fortunato mandou ‘meter na gaveta’? Segundo o grupo de personalidades independentes, “com base nos elementos fornecidos pela FCT e nos testemunhos adicionais que recolhemos, estamos convictos que o impacto destas parcerias foi altamente expressivo e multifacetado. Isto aplica-se tanto ao Sistema de Ciência e Tecnologia Nacional (SCTN) como aos parceiros industriais e empresariais do ecossistema nacional de inovação“. E quais foram as conclusões?
- As Parcerias Internacionais (PI)constituem um elemento basilar da estrutura do orçamento da FCT, e a parte do orçamento dedicado às PI deve manter no mínimo o mesmo grau de materialidade que no passado (5% do orçamento da FCT);
- As Parcerias Internacionais devem ser de número limitado a 3 ou 4, de mesma ordem de grandeza de valor ou daquele valor que garanta que as instituições parceiras atribuam prioridade a Portugal e às suas obrigações nas Parcerias Internacionais;
- As áreas do conhecimento a privilegiar devem incluir i) aquelas que devem continuar por terem sido e permanecerem apostas certas, nomeadamente digitalização, manufatura e inteligência artificial, ii) novas que equipem o país para fazer face aos desafios novos, nomeadamente o mar, as alterações climáticas, a degradação continuada dos recursos naturais e a perda de biodiversidade, e iii) alinhadas com a União Europeia onde Portugal pode contribuir e desenvolver vantagens comparativas para o futuro.
- Este parecer, acrescentam os membros independentes que produziram o relatório, “recebeu a maioria dos votos dos seus membros independentes (isto é excluindo [as entidades públicas] ANI; FCT e IAPMEI)“.
Os números das Parcerias Internacionais em 11 imagens
Elvira Fortunato reconhece agora, em declarações à TSF, que, na condição política em que o Governo está, o Ministério estará neste momento a “equacionar se do ponto vista ético e credível o país deve negociar acordos com caráter plurianual“.
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