Ministério Público aguarda “momento processualmente adequado” para ouvir António Costa na Operação Influencer
"O agendamento da data só será feito em momento processualmente adequado, tendo em conta o calendário de diligências priorizado para a investigação”, segundo soube o ECO junto de fonte do processo.
O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) ainda não encontrou “o momento processualmente adequado” para ouvir António Costa, no âmbito da Operação Influencer, a investigação que levou à demissão do ex-primeiro ministro, a 7 de novembro.
O ECO/Advocatus sabe que essa audição só acontecerá depois de algumas diligências, que são prioritárias para a investigação do DCIAP, serem realizadas. “O agendamento da data para o efeito só será feito em momento processualmente adequado, tendo em conta o calendário de diligências priorizado para a investigação”, segundo apurou o ECO junto de fonte ligada ao processo.
Quase seis meses depois da demissão de Costa, na sequência de buscas feitas ao palácio de São Bento, nada aconteceu. Nem Costa foi ouvido nem tão pouco constituído arguido. Questionado pelo ECO/Advocatus, fonte oficial do gabinete de Lucília Gago, a titular da investigação criminal em Portugal, não deu qualquer resposta.
Há precisamente um mês – a 2 de abril – António Costa pedia para ser ouvido “com a maior celeridade possível” pela Justiça portuguesa. “Dei instruções para hoje mesmo [o advogado] apresentar o requerimento junto do senhor coordenador do Ministério Público no Supremo Tribunal de Justiça para que possam proceder à minha audição para se esclarecer qualquer dúvida que tenham”, disse, à saída da tomada de posse do novo Executivo de Luís Montenegro. Mas, entretanto, o processo saiu da alçada do Supremo para o DCIAP. Contactado pelo ECO/Advocatus, o advogado João Lima Cluny não quis prestar qualquer esclarecimento sobre o processo.
“Não há nada pior do que haver uma suspeita e ela não ser esclarecida”, insistiu Costa, antes de acrescentar que “agora é tempo para que as suspeitas se esclareçam”. O ex-primeiro-ministro demitiu-se a 7 de novembro depois do seu nome ter sido citado num comunicado da Procuradoria-Geral da República sobre uma investigação judicial ao centro de dados de Sines e a negócios ligados ao lítio e hidrogénio. Costa diz estar “totalmente disponível para colaborar com a Justiça” e reiterou que “quem está sujeito a uma suspeição pública”, como a que existia sobre si, “deve preservar as instituições”.
Quinze dias depois destas declarações, o inquérito relativo às suspeitas que recaem sobre António Costa ‘ganhava’ uma magistrada responsável, a procuradora Rita Madeira, que coordena o combate à corrupção do DCIAP e é também responsável pelo processo de alegada corrupção na Madeira. A resposta do gabinete da PGR ocorria 24 horas depois de o ECO ter noticiado que o DCIAP ainda não tinha designado um procurador para ser titular do processo.
António Costa é suspeito do crime de prevaricação devido a uma lei alegadamente negociada entre João Tiago Silveira e João Galamba para beneficiar Start Campus. Segundo o Ministério Público, o ex primeiro-ministro é suspeito da alegada prática do crime de prevaricação devido à aprovação do novo Regime Jurídico de Urbanização e Edificação no Conselho de Ministros do dia 19 de outubro de 2023.
Em abril, o Supremo Tribunal de Justiça decidiu entregar a investigação ao DCIAP. Ou seja, o processo de António Costa passou para a primeira instância, igual a qualquer cidadão, perdendo o foro especial de primeiro-ministro. Mas estará a ser investigado de forma autónoma às restantes investigações que envolvem Vítor Escária, Diogo Lacerda de Machado e Rui de Oliveira Neves.
Uma Operação em que não houve influência?
No dia 17 de abril, os juízes do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) não encontraram quaisquer indícios de que tenha havido conversas entre António Costa e Diogo Lacerda Machado em que se “tenha falado, alguma vez, sobre a construção do data center em Sines”. O TRL decidiu contra o Ministério Público (MP) e manteve os arguidos da Operação Influencer apenas sujeitos a Termo de Identidade e Residência, a medida de coação menos gravosa prevista nas leis penais.
No acórdão a que o ECO/Advocatus teve acesso – com mais de 300 páginas – os magistrados explicam mesmo que o nome de António Costa não foi sequer invocado em “centenas de reuniões de trabalho” que Diogo Lacerda Machado realizou com a Start Campus.
“Não há nos autos qualquer indício de que o arguido tenha falado, alguma vez, com o primeiro-ministro sobre o projeto de construção e instalação do data center, em Sines, pela empresa Start Campus; tão pouco com o seu amigo António Costa. Como jamais invocou o nome do chefe do Executivo, ou do seu amigo António Costa, em qualquer das muitas dezenas, ou mesmo centenas, de reuniões de trabalho em que participou com o Conselho de Administração e as equipas de colaboradores da Start Campus, com outras empresas, fornecedoras de bens e serviços para aquela, e com diferentes autoridades públicas, nacionais e da União Europeia”, diz a decisão do tribunal de segunda instância.
A única referência de algum episódio concreto que envolve António Costa terá sido a sua presença num evento de apresentação do projeto (do data center), depois do início da implementação do mesmo, no dia 23 de abril de 2021, no qual também estiveram presentes, juntamente com o arguido Afonso Salema, o então secretário de Estado Adjunto e da Energia, João Galamba, e o então ministro da Economia, Pedro Siza Vieira.
Os juízes consideram que deveria estar descrito “algum comportamento objetivo do primeiro-ministro passível de mostrar alguma recetividade ou predisposição para ouvir e acatar o que Diogo Lacerda Machado, o seu melhor amigo, teria para lhe dizer”. Seja em decisões sobre “políticas públicas e medidas legislativas no ambiente, nas energias renováveis, nos objetivos da transição energética e da transição digital, no campus de data center promovido pela Start Campus, S.A, no âmbito do Projeto Sines 4.0. ou sobre qualquer outro assunto da governação”. Mas tal não aconteceu.
O que é a Operação Influencer?
Em novembro, os cinco arguidos inicialmente detidos ficaram em liberdade. A decisão do juiz de instrução Nuno Dias Costa – colocado no chamado “Ticão” apenas desde setembro — ficou muito aquém do pedido de promoção do Ministério Público, que queria a prisão preventiva para Diogo Lacerda Machado e Vítor Escária (os dois homens próximos de Costa), cauções de 200 mil euros para Afonso Salema e 100 mil para Rui Oliveira Neves (os administradores da Start Campus), e a suspensão do mandato do autarca de Sines, Nuno Mascarenhas. Nuno Dias Costa também não validou os crimes de prevaricação e de corrupção ativa e passiva que estavam imputados a alguns arguidos.
O juiz Nuno Dias Costa considerou ainda que não existia indiciação de qualquer crime relativo ao presidente da Câmara Municipal de Sines, Nuno Mascarenhas. Segundo o comunicado do Tribunal Central de Instrução Criminal, o juiz considerou que Lacerda Machado e Vítor Escária estão “fortemente indiciados” em coautoria e na forma consumada de um crime de tráfico de influência.
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