Concertação está de volta, com mudanças à lei do trabalho na mira
Governo de Montenegro senta-se pela primeira vez à mesa com confederações patronais e centrais sindicais. Já disse que quer revisitar mudanças à lei do trabalho, o que os empresários apoiam.
A primeira reunião do novo Governo com as confederações patronais e com as centrais sindicais acontece esta terça-feira. Na agenda para este encontro está pouco mais do que a apresentação dos cumprimentos institucionais, mas o programa de Luís Montenegro já deixa adivinhar que a lei do trabalho deverá ser um dos temas quentes a serem debatidos na Concertação Social nos próximos tempos. Os empresários apoiam, pedindo a revogação das normas que consideram inconstitucionais, enquanto os representantes dos trabalhadores mostram receio, apelando à estabilidade.
“O Governo vai retomar o diálogo com a Concertação Social, que foi negligenciado no passado. Impõe-se que o deixe de ser”, sublinhou a ministra do Trabalho, Maria do Rosário Ramalho, num debate recente no Parlamento.
De acordo com o programa do Executivo, e com as pistas deixadas pela governante nessa discussão na Assembleia da República, a lei do trabalho — em concreto, as alterações feitas na primavera do ano passado, no âmbito da Agenda do Trabalho Digno — será um dos temas fortes sobre os quais os parceiros sociais serão chamados a contribuir.
“É urgente que a revisão laboral ocorra em sentido inverso àquele que a Agenda do Trabalho Digno consagrou no Código do Trabalho”, defende já Francisco Calheiros, presidente da Confederação do Turismo de Portugal, em declarações ao ECO.
Por sua vez, Álvaro Mendonça e Moura, presidente da Confederação dos Agricultores de Portugal (CAP), avisa que o Governo deve avaliar o “timing correto e se dispõe de condições para propor uma revisão da legislação do trabalho”.
O Governo tem que avaliar o timing correto e se dispõe de condições para propor uma revisão da legislação do trabalho.
De notar que qualquer mexida na lei do trabalho implica o “sim” do Parlamento e o PSD não dispõe de maioria absoluta nesse órgão. Logo, mudar a lei depende de serem estabelecidas alianças no Parlamento, o que pode ser desafiante face ao atual desenho político.
“Qualquer revisão deverá sempre ser precedida de debate aprofundado em sede de Concertação Social. A seu tempo, a CAP gostaria de avançar com uma proposta de alteração sobre o regime jurídico do trabalho intermitente“, acrescenta Álvaro Mendonça e Moura.
Já João Vieira Lopes, presidente da Confederação do Comércio e Serviços de Portugal (CCP), alertou numa entrevista recente ao ECO que os patrões querem aproveitar esta revisão potencial da lei do trabalho para retirar as normas consideradas inconstitucionais que foram introduzidas na primavera passada.
“O que deve cair? As confederações empresariais apresentaram um documento onde consideraram que algumas dessas medidas são inconstitucionais. Na situação atual, pensamos que provavelmente haverá maior abertura [para retirar essas medidas da lei], mas estamos à espera de ver a posição do Governo”, salientou o responsável.
E que medidas são essas? Em causa estão a proibição de outsourcing depois de um despedimento coletivo, o alargamento do direito à atividade sindical onde não há trabalhadores filiados e a remissão abdicativa dos créditos dos trabalhadores são inconstitucionais.
Entretanto, também a Provedora de Justiça levantou dúvidas quanto a algumas dessas normas, tendo enviado duas delas (incluindo o tal travão ao outsourcing após despedimentos coletivos) para o Tribunal Constitucional.
Porém, até ao momento, nada se ouviu da parte dos juízes do Palácio Ratton, uma vez que, segundo escreveu o ECO, não têm prazo para o fazerem.
Ainda assim, João Vieira Lopes defende que, primeiro, há que fazer uma “discussão bastante aprofundada” sobre a lei do trabalho, que inclua medidas para enfrentar a escassez de mão de obra, com o qual se debatem as empresas de vários setores há vários anos, mas também medidas para reter os profissionais jovens no país.
Em contraste com as confederações patronais, as centrais sindicais mostram menos entusiasmo quanto à vontade do Governo de revisitar a lei do trabalho. Sérgio Monte, secretário-geral adjunto da UGT, já defendeu que é importante haver um “período de estabilidade”.
Com a AD, as alterações à legislação laboral seriam sempre no sentido de fragilizar os trabalhadores e beneficiar o grande capital.
E Tiago Oliveira, secretário-geral da CGTP, teme que as mudanças que serão feitas servirão para fragilizar os trabalhadores. Avisa, desde já, que a central sindical que lidera vai estar “na linha da frente do combate pela valorização do trabalho e dos trabalhadores“.
Além das normas já referidas, a lei do trabalho foi sujeita a dezenas de outras alterações na primavera do ano passado, e foi nesse âmbito que se criou o mecanismo que abre a porta que os estafetas sejam considerados trabalhadores das plataformas. Esse poderá ser outro dos pontos a rever nesta legislatura.
“Se vamos acabar com a presunção de laboralidade do artigo 12.º-A? Depende daquilo que os parceiros quiserem”, sublinhou a ministra do Trabalho, que ruma esta tarde ao número 8 da rua João Bastos para arrancar os trabalhos.
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