“Inteligência artificial pode ser grande aliada para enfrentar desafios”, diz CFO da EDP
Rui Teixeira, chief financial officer da EDP, diz que as empresas de energia estão cada vez mais a aproveitar ferramentas da inteligência artificial para melhorar a eficiência e a sustentabilidade.
Rui Teixeira, administrador financeiro da EDP, é um dos nomeados para o prémio de melhor CFO da 36.ª edição dos Investor Relations and Governance Awards, da consultora Deloitte. Em resposta por escrito a questões do ECO, afirma que o grupo foi capaz de mitigar a subida da taxa juro média, ainda que a descida dos preços da energia tenha obrigado a EDP a atualizar o plano de negócios.
O chief financial officer (CFO) aponta outras desafios que a elétrica enfrenta, como condicionamentos de natureza regulatória, fiscal e logística que afetam os mercados mais relevantes para o grupo, com destaque para os EUA.
Rui Teixeira considera que a inteligência artificial “pode ser uma grande aliada para enfrentar desafios” e aponta exemplos de como a EDP a estar a aplicar em projetos como o Analytics4Vegetation e o Electrial Dots.
A persistência de taxas de juro mais elevadas por mais tempo é o principal desafio que os administradores financeiros irão enfrentar este ano? Que outros destacaria?
Taxas de juros mais elevadas por um período mais prolongado de tempo são efetivamente uma preocupação essencial pela pressão que colocam no custo de capital e consequentemente nas decisões a tomar quanto à sua alocação, de forma a preservar a robustez do balanço das empresas, em particular da EDP.
No entanto, no contexto atual também há que ter em consideração outras preocupações igualmente importantes e específicas do nosso setor, com as taxas de inflação igualmente elevadas e persistentes, nomeadamente na Europa e principalmente nos EUA, pelo impacto nos custos operacionais e de investimento. Assistimos ainda a uma redução das curvas forward dos preços de energias, com impacto nas receitas esperadas, bem como a condicionamentos de natureza regulatória, fiscal e logística que afetam os mercados mais relevantes para o grupo, com destaque para os EUA, onde se tornou premente um reposicionamento na cadeia de fornecimento dos painéis solares, favorecendo fornecimento e montagem local, bem como a diversificação do número de fornecedores.
Como é que a EDP se adaptou a este contexto de taxas de juro mais altas? Os níveis de investimento tiveram de ser revistos? Foi necessário cortar custos?
Começaria por destacar que foi possível mitigar de forma muito relevante a subida da taxa juro média do grupo em resultado de diferentes fatores. Por um lado, a política de gestão financeira do grupo, que considerando o seu perfil de negócio, preconiza uma elevada proporção de taxa fixa (em 2023/24 entre 70/80%), o que permite diferir de forma muito material o impacto em cash flow da subida de taxas de juro.
Por outro, no início do ano de 2023, considerando a forma como se perspetivava a evolução dos mercados, foi tomada a decisão de executar uma pré-cobertura de cerca de 50% das necessidades de refinanciamento em 2023 e 2024, para euros e dólares, assegurando assim uma mitigação adicional do impacto da subida das taxas de juro (mil milhões de euros a 1,8% e mil milhões de dólares a 2,6%).
Adicionalmente, a reavaliação dos targets de cobertura do investimento líquido em moeda estrangeira resultou no rebalanceamento da dívida em dólares, mediante redução do seu peso na dívida do grupo (de quase 40% em março de 2023 para pouco mais de 20% a março de 2024), o que tem impacto positivo nos custos financeiros da empresa.
Além disso, o plano de financiamento que foi definido no âmbito do Plano de Negócios 2023-26 contemplava como principais fontes de financiamento o cash-flow operacional, os aumentos de capital, o programa de asset rotation e tax equity, sendo o crescimento de dívida financeira uma variável mais residual (em média mil milhões ao ano), o que também mitiga o impacto do contexto atual de taxas de juro.
E, por fim, é importante referir que a porção de dívida a taxa variável está alinhada com o nível de exposição dos nossos ativos à inflação no Brasil, onde prevalece um princípio de cobertura natural, onde a subida das taxas de juro se vê compensada pela subida das receitas.
Numa perspetiva mais abrangente, o contexto de mercado mudou rapidamente nos últimos 12 meses, não apenas no que se refere ao comportamento das taxas de juro e de inflação, mas sobretudo no que diz respeito ao contexto dos mercados energéticos – em particular da queda dos preços da energia. Estas alterações levaram a EDP a atualizar o seu Plano de Negócios para reforçar a posição do grupo e manter o balanço forte num contexto desafiador, aliando uma revisão de targets e o adiamento do plano de investimento a medidas de eficiência e otimização capazes de acelerar a execução, extrair mais sinergias das operações e maximizar a extração de valor do portefólio dos nossos negócios.
Prevê um alívio nas condições financeiras ainda este ano?
Existe ainda alguma incerteza quanto ao ritmo de redução das taxas de referência, antecipando-se, no entanto, que o movimento esteja mais eminente na Europa que nos Estados Unidos, muito ligado ao diferente comportamento dos indicadores de inflação em cada uma dessas regiões, ligando também à diferente origem da inflação que as afeta.
Espera-se que o Banco Central Europeu (BCE) possa começar a reduzir a taxa de referência já em junho de 2024. O mercado antecipa um intervalo provável de 2 ou 3 cortes de 25 pontos base para este ano, sendo que a taxa de referência poderá ficar entre os 2% a 3% no final de 2025, nomeadamente em função da evolução da taxa de inflação.
O contexto parece estar a evoluir favoravelmente, esperando-se que a inflação regresse de forma sustentável ao objetivo em meados de 2025.
Que impacto é que os avanços na inteligência artificial poderão ter no negócio?
A inteligência artificial (IA) é um tema com cada vez mais importância, que já está a transformar as nossas vidas e traz reflexões profundas, nomeadamente sobre novas abordagens de trabalho. É fundamental entender que a IA veio para ficar e que pode ser uma grande aliada para enfrentar desafios. Para a EDP, a IA é fundamental para os nossos compromissos de transição energética e a nossa ambição de sermos uma organização global ágil e preparada para o futuro.
A IA tem várias aplicações altamente relevantes no nosso setor e, por isso, as empresas de energia estão cada vez mais a aproveitar estas ferramentas para melhorar a eficiência e a sustentabilidade das suas operações, seja no aperfeiçoamento das previsões de oferta e procura, na identificação de locais para investimento, na melhoria da experiência dos clientes ou na gestão das redes de distribuição.
A EDP também tem trabalhado para estabelecer um caminho claro para acelerar a implementação de aplicações de IA e apoiar a democratização do acesso a esta tecnologia, com uma forte cultura e governança de dados.
Um dos projetos mais relevantes e já com resultados visíveis para o negócio é o Analytics4Vegetation, que tem como objetivo controlar, gerir e melhorar a deteção da vegetação ao redor das linhas de alta e média tensão para evitar falhas de energia e aumentar a eficiência operacional, garantindo a continuidade do fornecimento de energia e a proteção da floresta. Mas há outros exemplos, como o PREDIS, que usa inteligência artificial com tecnologia de Big Data para prever o consumo e a geração de energia para todos os clientes e ativos de rede em tempo real, através diagramas de carga. Ou o Electrial Dots, que tem como objetivo definir, com ajuda da IA, um plano eficaz de expansão da rede pública de carregamento elétrico para alinhar a procura e as necessidades dos utilizadores de veículos elétricos com os planos de investimento das empresas.
Como é que os temas do ESG estão a mudar o papel dos CFO?
As questões ESG estão a desempenhar um papel cada vez mais importante nas decisões dos CFO, uma vez que existe uma maior procura de informações ESG, incluindo políticas, boas práticas e metas ambiciosas por parte de investidores, compradores, analistas e legislação. Recentemente, surgiram vários enquadramentos regulatórios e normas como o CSRD, TCFD e a Taxonomia da UE, com vários aspetos em comum.
Exigem direção, supervisão e controlo de alguém que possua as habilidades de gestão necessárias, e uma extensa rede entre departamentos e unidades de negócios para ativar os stakeholders internos e externos corretos. Identificam a necessidade de existir um gestor experiente em garantir a precisão e transparência de indicadores-chave, bem como um responsável com experiência em gestão de riscos e planeamento de cenários para criar uma estratégia sólida. E exigem ainda alguém que possua as capacidades de comunicação adequadas para traduzir números em argumentos convincentes, de maneira a garantir a adesão dos stakeholders.
Os CFO já possuem essas capacidades e, por isso, devem encarar a integração dos aspetos ESG nas suas tarefas e responsabilidades como uma oportunidade para gerar vantagens competitivas, antecipar os impactos financeiros do ESG e, assim, garantir o sucesso a longo prazo do negócio.
Para além disso, os temas ESG são assim cada vez mais importantes para atrair capital nomeadamente para a EDP, uma vez que há um aumento de acionistas que investem em função das nossas políticas, práticas e objetivos ESG, a maior parte da nova dívida da EDP é financiamento verde e recebemos RFPs com critérios de sustentabilidade, principalmente para PPAs.
Em linha com este contexto, e tendo em conta a crescente relevância de temas ESG para os nossos investidores, a EDP integrou as equipas de ESG e de Investor Relations em 2022. Assim, a pessoa responsável pela supervisão dos temas de ESG na EDP é o CFO, o que permite ao grupo ter uma visão mais completa e transversal dos aspetos ESG e financeiros, e de como interagem.
Neste sentido, a EDP reporta informação não-financeira em conjunto com a informação financeira, adotando o modelo de Reporte Integrado, o que dá também uma melhor visibilidade de como os temas ESG estão integrados na estratégia da EDP.
Isto é particularmente importante para a EDP tendo em conta que, como refletido no Plano de Negócios, a nossa missão enquanto empresa é liderar a transição energética enquanto contribuímos para todas as vertentes do ESG, tendo como objetivo principal a descarbonização enquanto empoderamos as nossas comunidades, protegemos o nosso planeta, envolvemos os nossos parceiros, e fomentamos uma cultura ESG internamente.
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