Ministério da Saúde forçou INEM a ajuste direto ilegal, conclui Tribunal de Contas
Tribunal avisa que será a última vez que dá visto a um contrato deste tipo para aluguer de helicópteros e responsabilizou a tutela por não dar "cobertura orçamental que viabilizasse novo concurso".
O INEM foi forçado a contratar quatro helicópteros à Avincis Aviation por ajuste direto de 12 milhões de euros mais IVA, porque o Ministério da Saúde, de Ana Paula Martins, não deu “cobertura orçamental que viabilizasse um novo concurso”, concluiu o Tribunal de Contas (TdC) no processo de fiscalização prévia ao contrato, divulgado esta terça-feira.
A entidade considerou que o recurso sistemático ao ajuste direto por motivos de urgência imperiosa e acontecimentos imprevisíveis é “ilegal”, no entanto decidiu dar visto ao contrato, tendo em conta os entraves que a tutela colocou ao lançamento de novo concurso com um preço mais adequado ao mercado. Aliás este polémico ajuste, contestado pela ministra, levou ao despedimento do então presidente do Instituto de Emergência Médica, Luís Meira, e nem Vítor Almeida, entretanto indicado pela tutela, quis assumir o cargo. Entretanto, foi nomeado, em meados de julho, Sérgio Janeiro para a liderança da instituição.
“Não se pode afirmar a falta de diligência necessária para a contratação se realizar no quadro de um procedimento concursal. A entidade procurou fazê-lo, avisou e insistiu repetidas vezes junto da tutela para a necessidade de obter cobertura orçamental que viabilizasse um novo concurso, ou um outro meio, que, por via da internalização da atividade, como a tutela equacionou (e equaciona), permitisse satisfazer a necessidade de manutenção do dispositivo com quatro helicópteros. O condicionalismo que conduziu a este ajuste direto não foi por ela criado“, argumentou o organismo liderado por José Tavares.
Para o TdC, existe “uma necessidade permanente que tem de ser satisfeita”, sendo que “a determinação e a disponibilização dos meios, materiais humanos e/ou financeiros cabe à tutela”. “Logo, é a tutela que tem de fazer as opções que, ou por via da internalização, ou da atribuição de meios financeiros ao INEM – que permitam, face aos valores do mercado, concluir-se com sucesso um procedimento concursal –, assegurem o serviço. Se não o fizer, é a própria tutela que impõe ao INEM a realização de ajustes diretos que ferem seriamente a legalidade, por violação do princípio da concorrência”.
“Simplesmente, a ilegalidade não é do INEM, mas da tutela (a não ser, evidentemente, que seja o próprio INEM a não desenvolver de forma atempada cuidadosa, rigorosa e atempada os devidos procedimentos legais, como já ocorreu)”, escrevem os juízes conselheiros, cuja identidade o TdC preferiu não revelar, rasurando as suas assinaturas.
O Tribunal de Contas considera que “a tutela deve escolher a via para a satisfação da necessidade” ou recorrendo ao mercado ou internalizando as necessidades, nomeadamente, através da Força Aérea.
“Se optar pelo recurso ao mercado, em subsequentes procedimentos”, o TdC avisa que o Ministério deve conferir “meios financeiros ao INEM para que o preço base seja ajustado aos preços que aí se praticam, sob pena de o concurso, ou ficar deserto, ou, como sucedeu, as propostas apresentarem valores superiores ao preço base”. “Adverte-se a tutela que, se não o fizer, está, de forma indireta, a violar, ilegalmente, o princípio da concorrência, princípio esse que é estruturante da contratação pública e da tutela do interesse financeiro do Estado”, alertam os juízes conselheiros.
O ECO pediu uma reação ao Ministério da Saúde sobre as críticas da TdC. Mas a tutela respondeu apenas que, “para já o Ministério da Saúde não vai comentar a decisão do Tribunal de Contas”.
Tribunal ameaça vetar futuro ajustes diretos
Só por reconhecer que a responsabilidade no recurso a este ajuste direto é do Ministério da Saúde é que o TdC decidiu dar provimento ao contrato, mas avisou que, de futuro, irá vetar mecanismos idênticos. “Em futuros procedimentos e em face das mesmas circunstâncias procedimentais não concorrenciais considerará este Tribunal a muito provável ocorrência de fundamento de recusa de visto”, lê-se no relatório de fiscalização prévia do referido contrato com a Avincis.
O TdC sublinha que o INEM “tem sucessivamente recorrido a ajustes diretos”, invocando sempre “motivos de urgência imperiosa resultante de acontecimentos imprevisíveis”, tal como decorre da redação do artigo 24.º dos Código dos Contratos Públicos – CCP. Contudo, o organismo fiscalizador das contas públicas “tem, também, sucessivamente alertado a entidade para a necessidade de recorrer a procedimentos concorrenciais, não se podendo valer desta norma, por não ter realizado, como deveria ter feito, os devidos procedimentos concursais”.
O instituto em vez de “invocar, de forma constante, a urgência imperiosa que permite o recurso ao ajuste direto […], nos termos em que tem sido feito”, deve, “pelo contrário, planear atempadamente a aquisição dum serviço cuja necessidade é permanente e está relacionada com o core do INEM”, aconselham os juízes.
Em conclusão, o INEM “deverá ficar ciente da ausência de legalidade da previsão de adoção futura de ajuste direto para esta necessidade específica, sendo que não reunirá, de futuro, as condições para a ele recorrer, nos termos em que aqui justificou”, reforça o Tribunal.
(Notícia atualizada às 11h23 de 07/08/2024 com a reação do Ministério da Saúde)
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