Fosso entre salários praticados em Lisboa e no resto do país agrava-se
Diferença entre salários de Lisboa e das demais regiões do país agravou-se e agora é de 8,6%, mostra novo estudo da Korn Ferry. Empregadores nacionais estão a contar dar aumentos de 4,1% em 2025.
A diferença entre os salários praticados em Lisboa e os oferecidos nas demais regiões do país tem estado a aumentar ao longo deste ano. Em declarações ao ECO, Duarte Silveira, da consultora Korn Ferry, avisa que estas disparidades “complicam a captação de talentos“, agravam as desigualdades e podem até colocar em causa “alguma coesão social“.
De acordo com um novo estudo da referida consultora (que teve por base as respostas de mais de 550 empresas com presença em Portugal e que são representativas dos diferentes setores de atividade), em 2024, Lisboa tem reforçado a sua posição como região com os salários mais elevados em Portugal, tendo a discrepância nos vencimentos base crescido “cerca de 2% face ao ano anterior”.
Com este agravamento, o fosso entre os salários base dos lisboetas e os das demais regiões do país está situado, neste momento, em 8,6%, o que pode ser explicado, identifica Duarte Silveiro, pela “grande concentração do setor de serviços e financeiro” na capital (tendo em conta que estas são atividades que contratam, tipicamente, trabalhadores mais qualificados), mas também pelo aumento do custo de vida.
“Nos últimos dez anos, estima-se que só o custo imobiliário aumentou 60%, por exemplo. Estas situações, em conjunto com a inflação e as políticas de retenção de talento, têm colocado nesta região uma especial pressão face ao resto do país“, sublinha o head of digital da Korn Ferry Portugal.
Diferença salarial face à região de Lisboa
Região norte -6,2%
Região centro -6,6%
Região sul -7,4%
Ilhas -14,1%
Entre as várias regiões, são os arquipélagos que pior saem na fotografia comparativa com Lisboa, em termos salariais. Entre os vencimentos praticados na Madeira e nos Açores e aqueles oferecidos na capital, há uma discrepância de 14,1%. Em comparação, o fosso face à região sul é de 7,4% e face ao norte é de 6,2%.
“As disparidades salariais entre Lisboa e outras regiões podem ter, e têm, impactos como desequilíbrios económicos, impulsionando a migração urbana, a fuga de talentos e a estagnação regional“, avisa Duarte Silveira.
E continua: “para as empresas, estas disparidades complicam a captação de talentos, aumentam os custos urbanos e fomentam desigualdades internas. Socialmente, agravam a desigualdade e podem colocar em causa alguma coesão social“.
Para as empresas, estas disparidades complicam a captação de talentos, aumentam os custos urbanos e fomentam desigualdades internas.
Ainda assim, na visão deste especialista, tanto o Governo como as próprias empresas podem mitigar estes problemas através de investimentos regionais, da promoção do trabalho remoto e da dinamização de programas de qualificação.
“Garante-se, assim, um crescimento equilibrado e evitando a excessiva dependência dos centros urbanos“, assinala o head of digital.
Aumento salarial não deverá cumprir referencial da Concertação
No acordo de salários e crescimento económico assinado no mês passado na Concertação Social, os parceiros fixaram como referencial para os aumentos salariais de 2025 o valor de 4,7%. Mas as empresas do setor privado estão a contar dar reforços remuneratórios abaixo desse nível, de acordo com o novo inquérito da Korn Ferry.
“De acordo com a informação recolhida junto das empresas, o setor privado em Portugal tem uma previsão de 4,1% de incremento médio para 2025, um valor pouco abaixo do objetivo de 4,7% definido no recente acordo tripartido sobre valorização social e crescimento económico, assinado em sede de Concertação Social”, revela a consultora.
Questionado sobre essa diferença entre o referencial e as intenções dos empregadores, Duarte Silveira argumenta que o que pode ser concluído é que o Governo e os parceiros sociais “têm uma visão mais otimista sobre o crescimento e competitividade da economia portuguesa, quando comparado com a média do setor privado”.
“Nesse sentido, a conversa não deve estar centrada em torno do ajuste ou desajuste do referencial [face à realidade do mercado de trabalho], mas, sim, por que razão o setor privado não está tão otimista com o seu próprio desempenho, face às expectativas do Governo e dos parceiros sociais”, atira o head of digital da Korn Ferry Portugal.
Apesar de a inflação continuar a ser um dos fatores a ter em conta para os aumentos salariais em 2025, este decresceu 9% face aos resultados obtidos em 2024, podendo demonstrar o início de algum ajuste do mercado, depois de um período de grande instabilidade inflacionária.
Segundo o mesmo responsável, neste momento, os fatores que estão a influenciar as decisões remuneratórios dos empregadores são a evolução dos preços (ainda que tenha agora menos peso do que há um ano), a vontade de acompanhar as tendências de incrementos salariais do mercado e a necessidade de reter o seu talento.
“Além dos motivos referidos, outros aspetos referidos pelas empresas foram o aumento do salário mínimo, a capacidade de competitividade com os mercados externos, nomeadamente em processos de internacionalização, e a manutenção de posicionamento estratégico no mercado, em alinhamento com a política salarial”, enumera Duarte Silveira.
Menos empresas a sofrer com escassez de talento
A escassez de trabalho tem sido uma queixa recorrente, especialmente, desde que a economia começou a recuperar, após a pandemia. E quase metade das empresas portuguesas continuam a enfrentar essas dificuldades. Mas em comparação com 2023 a fatia de empregadores que estão nessa situação encolheu.
“Quase metade das empresas da amostra experienciam escassez de recursos, comparativamente a dois terços em 2023, o que reflete uma maior oferta de talento, consequência também de uma menor taxa de desemprego”, salienta a Korn Ferry, que aponta as áreas de produção, logísticas e supply chain, vendas e engenharia como aquelas onde há maiores dificuldades de contratação. “A escassez é sentida é de forma muito ‘targuetizada’, principalmente em algumas tipologias de funções”, comenta Duarte Silveira.
Por outro lado, a rotatividade voluntária também tem vindo a decrescer ao longo dos últimos anos, sendo hoje praticamente nula em funções de gestão. “A menor escassez [de trabalhadores] tem efeitos ao nível de rotatividade. Quanto menor a escassez, tipicamente um pouco menor é a rotatividade. Se não há tantas empresas à procura de recursos, os recursos também não têm tantas oportunidades de sair de onde estão”, salienta o head of digital.
Duarte Silveira acrescenta que, num mercado com pleno emprego, “a escassez funcional diminui e é tipicamente focada em competências e funções mais escassas no mercado“.
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