Importações da UE de gás natural liquefeito russo batem máximos, meses antes das novas sanções
Em 2024, importações da UE de gás liquefeito russo atingiram valores recorde. França, Espanha e Países Baixos importaram os níveis mais altos, meses antes da entrada em vigor das novas sanções.
Numa altura em que a União Europeia procura reduzir a dependência energética da Rússia, e antes da entrada em vigor do novo pacote de sanções, as importações de gás natural liquefeito russo (GNL) para o bloco europeu atingiram níveis recorde. Se, em 2023, as importações deste combustível em estado líquido registaram um decréscimo, em 2024 voltaram a aumentar e atingiram o valor mais alto de sempre.
Ao ECO, fonte oficial da Comissão Europeia não comenta os recordes de importações, apontando para a França, Espanha e os Países Baixos, por serem os “maiores importadores de GNL” na União Europeia. Embora não tenha “informação detalhada sobre os contratos”, o executivo comunitário liderado por Ursula von der Leyen frisa não fazer “parte dos contratos comerciais de fornecimento de gás”, remetendo quaisquer questões adicionais para “os Estados-membros e as empresas em causa”.
Certo é que os compromissos com o fim da dependência do gás russo mantêm-se, tal como prevê o REPowerEU. Aliás, o executivo comunitário relembra que o novo comissário para a Energia e Habitação, Dan Jorgensen, “foi incumbido de apresentar um roteiro para a eliminação progressiva das importações de energia russas”, plano que deverá ser apresentado nos próximos meses.
Segundo os dados do Independent Commodity Intelligence Services (ICIS), uma consultora especializada nos mercados globais de commodities, em 2024, as importações de GNL russo para o bloco europeu atingiram os 15,8 milhões de toneladas (Mt) solidificando a posição de Moscovo de segundo maior fornecedor deste combustível à UE, atrás dos Estados Unidos.
Em 2023, o valor situou-se nos 12,7 Mt, mas no ano anterior as importações totalizaram os 13,5 mt. Em 2021 e 2020, antes do início da guerra na Ucrânia, a União Europeia tinha importado da Rússia 10,4 milhões de toneladas de gás em estado líquido, uma quebra face a 2019 (12 Mt), segundo os dados do ICIS.
“O recorde de importações de GNL russo expõe a fragilidade da posição geopolítica da UE em relação à Rússia, destacando uma desconexão entre retórica e prática“, aponta ao ECO Paulo Monteiro Rosa, economista sénior do Banco Carregosa, prevendo que, enquanto continuarem a existir “incentivos económicos para importar gás russo, é provável que alguns países europeus continuem a recebê-lo”.
A dependência persistente da Rússia é um claro entrave à credibilidade do bloco. Para superar este desafio, a UE deve priorizar a coesão interna, a implementação eficaz das suas políticas e o investimento em infraestrutura que reduza a sua vulnerabilidade estratégica.
Mas não é só a ICIS que chega a estas conclusões. A Rystad Energy contabiliza que os navios metaneiros provenientes de Moscovo trouxeram para a Europa 17,8 Mt, em 2024, um aumento de mais de dois milhões de toneladas em relação ao ano anterior, cita o The Guardian. Ao jornal britânico, Jan-Eric Fähnrich, analista de gás da Rystad Energy, aponta que os fluxos de GNL não só estão a aumentar, como também “em níveis recorde”.
À semelhança destes dois, também os dados do Centro de Investigação sobre Energia e Ar Limpo (CRAE, na sigla em inglês) mostraram que as importações de GNL russo pela UE ascenderam 17,5 milhões de toneladas, o que equivale a 7,32 mil milhões de euros, avança o jornal britânico.
Ao The Guardian, o analista da CRAE, Vaibhav Raghunandan, afirma que o fenómemo é justificado pelo facto de o GNL russo estar a ser vendido “com desconto face a fornecedores alternativos”.
“Sem sanções impostas à mercadoria, as empresas estão a agir no seu próprio interesse e a comprar quantidades crescentes de gás ao fornecedor mais barato”, aponta o analista.
Mas a tendência não deverá manter-se por muito tempo. Afinal, o 14º pacote de sanções da União Europeia contra a Rússia visa bloquear os transportes de GNL provenientes da Rússia e com destino ao bloco europeu. Mas essas sanções só deverão entrar em vigor a partir de março. Até lá, os Estados-membros deverão continuar a beneficiar do canal aberto e reforçar as reservas de GNL.
"A Rússia está atualmente a utilizar as instalações portuárias da UE para descarregar o gás natural liquefeito russo dos seus grandes quebra-gelos para navios mais pequenos e mais baratos, otimizando assim o transporte do seu gás para o resto do mundo. A UE não deve continuar a facilitar o transporte e a venda de GNL russo, permitindo que a Rússia reduza os seus custos logísticos. Esta terá de encontrar instalações de transbordo alternativas, aumentando assim os seus custos.”
Assim que as sanções entrarem em vigor, a convicção da Comissão Europeia é de que os Estados-membros saiam ilesos devido aos esforços que têm sido colocados em campo para mitigar os impactos com o fim da dependência dos combustíveis fósseis russos.
“A proibição do transporte afeta apenas os custos logísticos da Rússia para exportar GNL, mas não proíbe (nem visa de forma alguma) as importações para a UE ou para qualquer outro lugar. O abastecimento de GNL à UE não será afetado“, garante o executivo comunitário numa nota publicada na sequência do 14º pacote de sanções.
Bruxelas frisa ainda não contar que haja uma reação nos mercados a nível dos preços, “uma vez que o GNL é um mercado global em que os preços são determinados pela interação entre a procura e a oferta a nível mundial”.
“A oferta global não seria afetada por esta proibição do transporte”, asseguram.
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