Cavaco Silva defende reforço da zona euro para responder a Trump
O antigo Presidente diz que para reforçar a defesa na União Europeia "só há uma solução", a mutualização da dívida europeia, com a emissão de "uma dívida comum".
O ex-Presidente da República Aníbal Cavaco Silva defendeu esta quarta-feira que perante a “situação internacional muito complexa”, agravada pela reeleição de Donald Trump nos EUA, a Europa deve “renovar a sua ambição” e reforçar a zona euro.
“O que é mais importante como primeiro passo será reforçar a zona euro, que é o núcleo duro” da União Europeia (UE), onde “existe uma partilha de soberania” mais forte, disse Cavaco Silva, referindo-se ao conjunto dos países que têm a moeda única europeia.
“Precisamos aqui de uma frente europeísta que possa travar movimentos populistas e eurocéticos, avançando numa zona euro mais aprofundada”, acrescentou o antigo chefe de Estado e ex-primeiro-ministro, num debate em Toledo, Espanha, sobre os 40 anos da assinatura do tratado de adesão dos dois países da Península Ibérica à UE, em junho de 1985.
Em declarações aos jornalistas no final do debate, em que também participou o ex-primeiro-ministro espanhol Felipe González, Cavaco Silva explicou que defende o aprofundamento da zona euro (nomeadamente, completar “a arquitetura” da união económica e monetária ou do mercado de capitais) para “que se reforce a posição do euro como uma moeda mundial, para que ganhe força no diálogo internacional com os outros blocos económicos e em particular com os Estados Unidos e a sua nova administração”.
Durante o debate, o ex-Presidente português considerou as tarifas comerciais anunciadas por Trump “a decisão mais irracional” que se poderia imaginar, tanto “para os Estados Unidos, como o mundo geral”, e que põe em risco “o futuro do dólar como moeda mundial”. Cavaco Silva referiu ainda o desafio que enfrenta atualmente a Europa com a necessidade de reforçar capacidades em segurança e garantir a sua própria defesa, assim como outras necessidades de financiamento para aumentar a competitividade do bloco comunitário.
A este propósito, lembrou que o designado “relatório Draghi” sobre a competitividade europeia sublinhou o “problema do custo da energia” e quantificou em 800 mil milhões euros os recursos financeiros necessários para a Europa “recuperar o atraso” em relação a países como a China ou os EUA.
“Os líderes europeus são capazes de perceber aquilo que é preciso fazer”, mas “não sabem onde encontrar o dinheiro”, disse Cavaco Silva, que defendeu que “só há uma solução”, a mutualização da dívida europeia, com a emissão de “uma dívida comum“, como aconteceu na resposta à crise provocada pela pandemia de covid-19.
Para o antigo Presidente da República, a emissão de dívida comum europeia não pode ser feita “a título excecional” e “para responder às insuficiências em matéria de defesa e segurança da UE é preciso recorrer a dívida comum emitida nos mercados financeiros internacionais”, algo que também seria um “contributo importante para aproximar o mercado do euro do mercado de emissões em dólares”.
Depois de, tal como Felipe González, manifestar por diversas vezes preocupação com o momento geopolítico atual, insistindo no avanço dos populismos e dos eurocéticos, Cavaco Silva sublinhou que, porém, a história da integração europeia e da UE é “uma história de sucesso” e mostrou-se otimista.
“A União Europeia passou por muitas crises (…), mas uma coisa pode dizer-se: nunca parou, em cada crise ganhou nova ambição para se renovar” e a ideia de que “não soube responder” às crises “não é verdade”, considerou.
Cavaco Silva, que foi primeiro-ministro na primeira década de integração de Portugal na UE, realçou os benefícios da entrada no bloco comunitário e do acesso a fundos europeus, mas considerou que igualmente importantes foram as “reformas estruturais” que o país fez naquela época, sem as quais “não teria tirado todo o benefício da adesão”, sendo que “a primeira grande revolução” foi a revisão constitucional para eliminar a “irreversibilidade das nacionalizações” ou acabar com “o monopólio estatal da televisão”, a par de “muitas outras reformas no sistema fiscal, financeiro ou educativo”.
O ex-Presidente, que nos dez anos à frente do Governo teve como homólogo em Espanha o socialista Felipe González, destacou, por outro lado, que a entrada na UE mudou também as relações económicas e políticas entre os dois países, que sempre “coordenaram posições” nas “grandes questões europeias” e “se reencontraram” após décadas de ditaduras.
Felipe González, por seu turno, lembrou que a entrada de Portugal na UE “se resolveu” antes de 1985, mas atrasou-se porque teve de esperar por Espanha, por decisão das instituições europeias, que quiseram que a entrada dos dois países ocorresse em simultâneo. O ex-chefe do Governo espanhol considerou, como Cavaco Silva, que perante a geopolítica atual é necessário das “um novo avanço” à construção europeia, incluindo na área da defesa e segurança.
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