Quanto vai custar o novo edifício do Banco de Portugal? “O valor final a Deus pertence”

Novas instalações do Banco de Portugal vão custar mais de 192 milhões de euros, mas Centeno não sabe dizer quanto mais. "Faltam as alcatifas, os móveis, a decoração", explicou o ainda governador.

Mário Centeno ainda não sabe quanto vai custar o novo edifício do Banco de Portugal. “O valor final a Deus pertence”, disse o ainda governador no Parlamento, criticando a “forma truncada” com que os dados do projeto foram transmitidos para os jornais.

Esse custo não existe hoje, porque as decisões que vai levar a esse custo não foram tomadas. Alcatifas, móveis, decoração… são tudo decisões que vão ter de ser tomadas, com o mesmo rigor”, explicou Centeno perante as dúvidas dos deputados da Comissão do Orçamento, Finanças e Administração Pública.

Mais tarde, Centeno penitenciou-se. “Não se deve invocar o nome de Deus em vão. Estava a tentar passar uma mensagem”, contextualizou.

O Banco de Portugal anunciou em maio passado um acordo com a seguradora Fidelidade no valor de 192 milhões de euros para a compra do novo edifício de escritórios nos moldes core & shell e que será erguido nos terrenos da antiga Feira Popular. Mas o negócio revelou-se polémico perante as notícias a darem conta dos riscos que foram detetados em auditorias e do custo que vai ficar acima do anunciado.

Centeno assegura que “não há nenhuma dúvida nem risco em cima do valor de aquisição do imóvel nas condições contratuais” negociadas com a Fidelidade. “O projeto que está a ser adquirido para as novas instalações não tem nenhuma incerteza sobre o seu custo. Esse valor está fechado. A resolução das linhas vermelhas que incidem sobre o projeto é da exclusiva responsabilidade do promotor e não há acréscimo de custo decorrente dessas linhas”.

Foram levantadas 13 contingências relativamente ao projeto das novas instalações — e não nova sede, porque essa continuará na Baixa lisboeta –, algumas das quais estão superadas ou praticamente superadas. E em relação aos outros riscos? “Se não forem resolvidos, o Banco de Portugal sai do negócio sem nenhuma despesa”, assegurou Mário Centeno.

Venda de imóveis pagam dois terços do novo edifício

Há já uma fatura adicional: os 1,4 milhões de euros do contrato com a empresa de arquitetura e design Openbook para ajudar com os acabamentos. Centeno adiantou que o projeto para os interiores “tem valores máximos e o senhor ministro das Finanças sabe esses valores”. Porém, “se o Banco de Portugal puser esse valor na praça pública, fica refém desse valor (…) Fragiliza a nossa posição negocial”, declarou, recusando as críticas de falta de transparência ou falta de capacidade para comunicar.

O governador prefere falar em investimento em vez de custo de um projeto que será financiado em dois terços através da alienação de edifícios (como Almirante Reis, Matinha) e da venda do terreno no Alto dos Moinhos (que custou 40 milhões em 2017 e só mais recentemente recebeu licenciamento).

“O Banco de Portugal vai trocar componentes do seu ativo — dinheiro e imóveis — por outro imóvel. Não estamos a transferir riqueza, damos outra forma”, observou.

Por outro lado, estima uma poupança de 140 milhões de euros ao longo de 25 anos, com Centeno a lembrar que o beneficiário último dos dividendos do Banco de Portugal é o Estado.

Banco e IGF estudam enquadramento legal da auditoria

Por conta da polémica, o Ministério das Finanças solicitou à Inspeção-Geral de Finanças (IGF) uma auditoria ao projeto. Mas a lei orgânica do Banco de Portugal e as regras do Eurosistema travam o escrutínio do supervisor por parte de entidades controladas politicamente para não colocar em causa a independência.

Centeno adiantou que as duas partes estão a “trabalhar sobre o enquadramento legal da auditoria”. “Ninguém no Banco de Portugal tem legitimidade se não houver esse quadro legal”, frisou o governador.

Decisão à 25.ª hora?

Os deputados do PSD e do CDS criticaram o timing da decisão das novas instalações do Banco de Portugal — quando Centeno se encaminhava para o final do mandato. “Foi à 25.ª hora”. “Porquê tanta pressa?”.

“O processo não começou em abril de 2025, nem em abril de 2024. (…) Agora tínhamos de explicar ao promotor que tinha de por o imóvel fora do mercado durante este tempo todo. Não é razoável”, realçou. “Esperam lá e não ponham isto no mercado durante uns meses porque vem aí um novo governador”.

Centeno disse depois que “a decisão foi consensual no conselho de administração e que não se tratou de uma decisão do governador”, lembrando que a decisão deu resposta a uma ambição e necessidade com 40 anos.

“Respeite o Parlamento!”

A audição pedida pelo CDS começou de forma tensa, com o deputado centrista Paulo Núncio e Mário Centeno a envolverem-se numa troca de galhardetes por causa dos documentos do novo edifício que foram solicitados ao Banco de Portugal.

Núncio começou por acusar Centeno de “falta de transparência” e de “total falta de respeito” pelo facto de ter pedido os documentos há mais de dois meses. “O governador decidiu não entregar esses documentos”, afirmou.

O presidente da COFAP, o deputado do Chega Rui Afonso, lembrou que por conta das férias o requerimento do CDS só foi aprovado pelos deputados no início de setembro e que o pedido ao Banco de Portugal seguiu apenas no dia 10. Também recordou que o COFAP aceitou ouvir as explicações do governador mesmo sem estar na posse dos documentos.

Centeno indignou-se com a postura do deputado do CDS, a quem lembrou que só teve três dias úteis para dar seguimento ao pedido (que ocorrerá na próxima semana). “Respeite o Banco de Portugal”, atirou o governador, enquanto Núncio respondia: “Respeite o Parlamento”.

No final, o deputado do PSD Hugo Carneiro criticou a falta de “civismo institucional” do governador. O presidente da COFAP reconheceu que “foram ultrapassados alguns limites” e desabafou que “foi uma audição longa e difícil”. Após quatro horas, Paulo Núncio prometeu nova audição com Centeno mas já com os documentos na mão.

(notícia atualizada às 22h10)

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