Fintechs portuguesas captam mais 3% de investimento com IA e cripto
Valor captado pelas empresas foi de 1,2 mil milhões de euros entre 2017 e 2025. Inteligência artificial domina a agenda, mas as moedas virtuais "estáveis" é que representam a mudança de paradigma.
As empresas tecnológicas e financeiras (fintechs) portuguesas acumulam um investimento de cerca de 1,20 mil milhões de euros entre 2017 em 2025. O valor representa uma ligeira subida de 3% em relação aos valores captados até ao ano passado, de acordo com o mais recente “Portugal Fintech Report” divulgado esta terça-feira.
O crescimento deveu-se ao desenvolvimento da inteligência artificial (IA), mas também à colaboração entre startups e grandes instituições financeiras, “mais rápida e eficaz” do que em anos anteriores. É um sinal de “confiança dos investidores no talento nacional e no potencial exportador das fintechs portuguesas”, segundo os autores do relatório.
Em 2025, mais de 200 parcerias entre estes players foram mapeadas e mais de metade (53%) concretizaram-se em menos de seis meses, assinala o estudo elaborado pela Portugal Fintech em parceria com a consultora KPMG, a sociedade de advogados Morais Leitão e a empresa de pagamentos Visa.
O contacto direto com altos executivos (C-Level) continua a ser o principal canal para as fintechs se relacionarem com empresas tradicionais. No entanto, entre as que fecharam parcerias este ano, disseram que os parceiros do ecossistema foram o segundo maior ponto de ligação.
A radiografia anual às startups que unem o digital às finanças mostra um setor mais maduro e colaborativo e (ainda) mais tecnológico nos últimos 12 meses, marcados por avanços na regulação europeia e na digitalização, entre os quais o MiCA ou o euro digital. É também por essa razão que se começam a sentar mais vezes à mesa com a banca e as companhias de seguros, apesar de a “lentidão” na tomada de decisões, as diferenças culturais e os “complexos” sistemas tecnológicos continuem como os maiores obstáculos entre as partes.
“Foi um ano não só de sedimentação do setor, em que se muitas das fintechs existentes solidificaram as suas posições no mercado, mas também de muito crescimento através da aparição de novas startups a alavancar tecnologias disruptivas como a IA generativa. Isto pode ser visto no contínuo crescimento do investimento no setor”, comentou João Freire de Andrade, fundador e managing partner da Start Ventures, ao ECO.
Fintechs de seguros dominam
Apesar desta maturidade das fintechs nacionais, continua a haver novos operadores no mercado. Quase um terço (28,7%) das empresas desta área foram fundadas nos últimos dois anos. Para a associação Portugal Fintech, esta dimensão demonstra que “a inovação financeira está longe de abrandar” no país.
Dentro deste ecossistema, que move dinheiro pela web ou aplicações, os seguros digitais mantêm-se na liderança. Praticamente duas em cada dez fintechs em Portugal pertencem à categoria de seguros, portanto insurtechs (19,1%), seguindo-se de empréstimos e créditos (12,2%) e de pagamentos e transferências monetárias (12,2%). Todavia, é notório o crescimento das verticais de regulação (regtech) com 9,6%, infraestruturas financeiras e interfaces de programação de aplicações (API) com 5,2% e gestão de fortunas e sustentabilidade (ESG) com 9,6%, sendo que em anos anteriores nem surgiam na listagem.
Mais de metade das fintechs integra IA
O impulsor tem uma sigla bem conhecida: IA. “A inteligência artificial é hoje o motor do setor: 74% das fintechs portuguesas já integram IA nos seus produtos e 90% utilizam-na nas suas operações internas. Entre os principais casos de uso de IA, o estudo aponta áreas como a prevenção de fraude, a integração automatizada e a avaliação de risco a personalização da experiência do utilizador e a gestão de marketing e operações”, lê-se no documento.
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Lisboa e Porto continuam — sem surpresas — a concentrar a maioria das fintechs nacionais, que pretendem estar perto dos grandes bancos e seguradoras (os chamados incumbentes) e de outros potenciais parceiros. Ainda assim, o “Portugal Fintech Report 2025” confirma para a emergência de polos regionais que diversificam o mapa de talento e recebem iniciativas locais de apoio ao crescimento empresarial. Neste campo destaca-se Leiria, porque atingiu o pódio dos berços de fintechs. Leiria chegou ao terceiro lugar “impulsionada pelo desenvolvimento do ecossistema empreendedor feito pelas autoridades locais e pela Portugal Ventures”.
Stablecoins podem mudar paradigma
A abordagem futura às moedas virtuais também consta deste relatório, no qual se conclui que Portugal tem uma “oportunidade estratégica” para se posicionar como ponte nos pagamentos digitais entre a Europa e países lusófonos através das stablecoins, as criptomoedas suportadas em euros ou dólares. Além da capacidade que estas cripto “estáveis” têm para transformar remessas internacionais, almeja-se ainda os seus efeitos na mudança do paradigma deste setor.
Por exemplo, emissores de stablecoins como a Circle e a Tether detêm agora mais títulos do Tesouro norte-americano do que muitas nações, figurando entre os 20 maiores detentores globais. Ou seja, passaram de “curiosidade de mercado para infraestrutura de pagamentos com impacto macroeconómico”.
“Quando criámos a internet, esquecemo-nos de adicionar monetização nativa. As stablecoins corrigem isso. São dinheiro digital, nativo da internet, garantido por moeda tradicional, baseado em blockchain e utilizável por qualquer pessoa, em qualquer lugar”, explica Diogo Mónica, cofundador e presidente da Anchorage Digital e sócio da Haun Ventures.
Identifica-se uma oportunidade concreta para Portugal: servir de ponte entre a conformidade regulatória europeia e os corredores de remessas para o Brasil, Angola e Moçambique, dado que “os corredores de remessas entre Portugal e estes países são candidatos naturais para infraestruturas de pagamento em stablecoins euro-real ou euro-kwanza“.
Porém, evidencia-se um equilíbrio entre otimismo e prudência, reconhecendo que estas moedas abrem possibilidades de eficiência e inclusão financeira, embora exijam enquadramentos regulatórios que protejam a estabilidade do sistema financeiro e garantam transparência sobre garantias e governação.
Empresas a ‘sprintar’ em seis meses
A Fintech House aproveitou o lançamento deste relatório para anunciar a segunda edição do programa de aceleração “Sprint”, cujo objetivo é preparar os empreendedores, durante seis meses, para a sua primeira ronda de financiamento e fazer a validação da ideia. As candidaturas abrem precisamente neste dia 4 de novembro e as selecionadas para 2026 terão acesso a espaço de escritório no centro da capital, uma rede alargada de mentores e apoio especializado em desenvolvimento de produto, angariação de dinheiro e estabelecimento de parcerias.
“A primeira edição do Sprint apoiou seis fintechs que, no seu conjunto, levantaram 450 mil euros em capital e fecharam mais de 10 parcerias estratégicas. Estes resultados mostram-nos que um acompanhamento estruturado faz toda a diferença. Para a segunda edição, reforçámos o programa em áreas onde identificámos maior necessidade: desenvolvimento de produto, preparação para fundraising e acesso a uma rede alargada de mentores especializados”, conta a diretora da Fintech House, Mariana Gorjão Henriques.
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