Bruxelas falha na aplicação de correções financeiras à política de coesão
A Comissão “não fez qualquer correção financeira nas três auditorias a Portugal que constam da amostra do Tribunal de Contas Europeu”, revelou ao ECO fonte oficial da instituição.
Até ao final de abril de 2025, a Comissão Europeia iniciou 28 procedimentos de correção financeira: 18 foram concluídos e apenas um levou Bruxelas a decidir aplicar uma correção financeira, revela a mais recente auditoria do Tribunal de Contas Europeu. Por isso, a instituição liderada por Tony Murphy conclui que a “Comissão Europeia não aplica correções financeiras como devia para proteger o orçamento europeu de despesas irregulares na política de coesão”.
“Todos os anos, as despesas da política de coesão têm muitos erros”, de acordo com o relatório do Tribunal de Contas divulgado esta quinta-feira. “Porém, a Comissão Europeia demorou mais de uma década a aprovar a primeira correção financeira para o período de 2014-2020 (fazendo-o apenas em setembro de 2025)”, critica o documento, que “aponta falhas nas regras legais e na forma como são aplicadas”.
Desde o início do período de 2014-2020 – o correspondente à vigência do Portugal 2020 – os controlos da Comissão Europeia levaram os países-membros a fazer correções financeiras de mais de mil milhões de euros, que puderam ser usadas novamente. Mas, na sequência das auditorias do Tribunal de Contas Europeu, foram feitas novas alterações, com os países do bloco a aplicarem correções de quase 200 milhões de euros. No entanto, o relatório revela que “várias correções propostas foram depois reduzidas ou mesmo descartadas sem uma boa justificação”.
Fonte oficial da instituição revelou ao ECO que a Comissão “não fez qualquer correção financeira nas três auditorias a Portugal que constam da amostra do Tribunal de Contas Europeu”.
As correções financeiras efetuadas pelos Estados-membros resultam de auditorias realizadas pelas autoridades nacionais de auditoria (3,4 mil milhões de euros desde o início do período de 2014-20208) e de verificações de gestão, mas também de auditorias da Comissão, do seguimento dado às auditorias do Tribunal e de inquéritos do Organismo Europeu de Luta Antifraude (OLAF), explica o relatório. Auditorias que detetam as despesas irregulares que devem ser excluídas do financiamento comunitário. As correções consistem na dedução das despesas irregulares dos pedidos de pagamento à Comissão que podem ser substituídas por outras “legais e regulares” no âmbito do mesmo programa operacional, mantendo assim o seu nível global de financiamento da UE.
Nos seus relatórios anuais, o Tribunal calcula sistematicamente que a taxa de erro é superior ao limiar de materialidade de 2% ao nível da política de coesão, o que “demonstra o potencial para a tomada de medidas corretivas adicionais”. Nos últimos anos, esta taxa tem ficado significativamente acima deste limiar.

Se a Comissão ou o Tribunal de Contas Europeu detetarem irregularidades que revelem uma deficiência grave no funcionamento do sistema de gestão e controlo de um Estado-membro e que não tenham sido sinalizadas, comunicadas e corrigidas pelo mesmo, a Comissão tem de realizar uma correção financeira, independentemente de o Estado-membro concordar e não pode substituir as despesas irregulares.
Ora, de acordo com os relatórios anuais de atividades relativos a 2024, os Estados-membros realizaram correções financeiras de 1,4 mil milhões de euros desde o início do período de 2014-2020, na sequência das suas próprias auditorias (em 79% dos casos), das auditorias do Tribunal (em 14%) e de inquéritos do OLAF (em 7%). E, no final de setembro de 2025, a Comissão tinha aprovado a primeira decisão que impôs correções financeiras relativas ao período de 2014-2020.
Demorar mais de dez anos a aprovar a primeira correção leva o tribunal a considerar que as “regras do mecanismo de correção financeira são complicadas e nada fáceis de compreender”. A instituição dá como exemplo a necessidade de as irregularidades resultarem de “um ato ou omissão de um operador económico”. “Ou seja, as autoridades públicas, que são quem gere os fundos nos países, mas não são operadores económicos, ficam fora das correções da Comissão Europeia, apesar de serem quem provavelmente comete os maiores erros. Além disso, as orientações e os critérios para avaliar as deficiências graves não são muito claros nem são aplicados sempre da mesma forma”.
O Tribunal de Contas Europeu analisou 16 casos que cumpriam estes critérios e concluiu que, até setembro de 2025, Bruxelas só tinha iniciado o processo de recuperação em dois deles, não tendo ainda feito as correções obrigatórias.
Além disso, Bruxelas precisa de 588 dias antes de começar o processo de controlo, ou seja, “em parte para tentar chegar a acordo com o país sobre a correção a aplicar e que, a partir desse momento, demora mais de dois anos”. Para a instituição, com um “período tão longo (no total, entre três e quatro anos), é impossível dar uma resposta a tempo e fazer uma boa gestão financeira”, e o problema é que as regras do atual período de reprogramação 2021-2027 “não melhorem muito a situação”.
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