As cinco vitórias e cinco derrotas do Governo no Orçamento do Estado para 2026
Foram aprovadas 163 propostas, a maioria das quais da oposição, mas o rombo no excedente não vai ser assim tão grande. Serão cerca de 100 milhões, pelas contas do Governo.
O Orçamento do Estado para 2026 afinal “não foi desvirtuado”, apesar do leilão de medidas da oposição que foram aprovadas e que poderão custar aos cofres públicos cerca de 100 milhões de euros, segundo o primeiro-ministro, Luís Montenegro. Ao todo, o Governo soma cinco derrotas e cinco vitórias. Um empate.
O excedente de 0,1% do PIB ou de 260 milhões é beliscado, mas o Governo ainda tem folga para manter o saldo positivo. Alterações com maior impacto como o aumento estrutural e permanente das pensões ou o IVA zero num conjunto de bens alimentares essenciais, propostas por Chega e PS, acabaram por ficar pelo caminho. O ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, bem pode respirar de alívio pelo facto de os dois maiores partidos da oposição não se terem unido em torno destas duas matérias.
Pelo contrário, o Parlamento deu luz verde a 163 iniciativas, a maioria da oposição. Isenção de portagens, congelamento de propinas, redução do IVA das obras de arte ou o reforço de verbas para o Tribunal Constitucional estão entre aquelas que mais vão pesar no bolso do Estado e que passaram em coligação negativa de Chega e PS contra a vontade do Executivo.
O Orçamento do Estado para 2026 foi aprovado esta quinta-feira em votação final global com a ajuda do PS, que se absteve de forma “exigente”. Os socialistas chamaram a si o ónus da responsabilidade de evitar que o país mergulhasse numa crise política, uma vez que toda a oposição votou contra a proposta orçamental. “Se não fosse o PS, Portugal mergulharia numa crise política”, afirmou o secretário-geral do PS, José Luís Carneiro, na sessão de encerramento da votação do documento.
Mas Luís Montenegro não poupou críticas a Chega e PS por se terem juntado em várias iniciativas: “Infelizmente e lamentavelmente, os dois maiores partidos da oposição não resistiram à tentação de invadir a esfera de decisão que cabe ao poder executivo. Esta forma arbitrária com que todos os anos alguns partidos e alguns deputados entendem gerir o processo orçamental de forma a leiloar propostas à la carte não me parece que seja uma forma madura de encarar o processo orçamental”.
Isenção de portagens
O Parlamento aprovou uma proposta do PS para isentar de portagens dois troços da A6 e A2, no Alentejo, mas apenas para residentes ou trabalhadores, no primeiro caso no Alto Alentejo e Alentejo Central e no segundo caso no Baixo Alentejo e Alentejo Litoral.
A isenção incide sobre os troços da A6 entre o nó A2/A6/A13 e Caia e da A2 entre o nó A2/A6/A13 e Almodôvar e funciona através da utilização de dispositivo eletrónico associado à matrícula do veículo. O PS estima que a medida custe aos cofres do Estado 20,5 milhões de euros, mas a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO) aponta para um impacto mais elevado: 23,8 milhões de euros no cenário base ou 26,8 milhões de euros no cenário mais grave.
Para além disso, foi viabilizado o fim das portagens na totalidade da A25. No ano passado foi aprovado a eliminação das portagens na Beira Litoral e Alta, mas os socialistas realçam que “restou um pequeno troço onde se manteve a cobrança de portagens, pelo que se propõe agora corrigir esta incongruência”.
Os socialistas viram ainda aprovada a proposta que estipula, até ao final de 2026, a suspensão da cobrança de taxas de portagem aos veículos pesados que utilizam a autoestrada A41 CREP e a autoestrada A19, no troço entre São Jorge e Leiria Sul (nó A8/A19) e a A8 entre Leiria Sul (nó A8/A19) e Pousos.
Por sua vez, a intenção do Chega de abolir gradualmente o pagamento de portagens, executada através de um plano faseado de redução e isenção progressiva de portagens em todo o país, que identifique fontes de compensação financeira às concessionárias, quando aplicável, ficou pelo caminho.
Congelamento das propinas
O valor das propinas do ensino superior está congelado desde 2021, fixando-se em 697 euros, e assim se vai manter no próximo ano letivo, na sequência da viabilização de uma proposta socialista, inicialmente chumbada, mas aprovada depois de uma mudança do sentido de voto de contra para a favor do Chega.
Com esta aprovação, fica também estipulado que, no próximo ano letivo, não se aplica qualquer limite mínimo do valor de propina nos ciclos de estudos conferentes de grau académico superior.
Na mesma sequência, a proposta do PSD e o CDS-PP previa que as propinas do ensino superior fossem atualizadas à taxa da inflação no ano letivo de 2026/2027 foi rejeitada. A iniciativa referia que, no ano letivo de 2026-2027, nos ciclos de estudos conducentes ao grau de licenciado e doutorado e nos cursos técnicos superiores profissionais, o valor máximo das propinas nas instituições de ensino superior públicas é igual ao valor fixado no ano letivo de 2025-2026, acrescido da taxa de variação média do índice de preços no consumidor (IPC), sem habitação, referente ao ano civil de 2025.
Pensões podem ter direito a bónus
As propostas do Chega, do PS e do PCP que previam um aumento extraordinário das pensões foram chumbadas pelos deputados. Ainda assim, caso haja margem orçamental, o Governo dará um novo suplemento aos pensionistas em 2026, o que, a confirmar-se, acontecerá pelo terceiro ano consecutivo.
O Chega propôs que as pensões até 1.567,5 euros fossem aumentadas 1,5%, de forma extraordinária e permanente. Esse reforço foi chumbado esta quinta-feira, com os votos desfavoráveis do PSD, Iniciativa Liberal e CDS, a abstenção do PS, PCP e Livre, e com os votos favoráveis das demais bancadas. Já o PS tinha proposto um modelo diferente. Em 2026, qualquer suplemento extraordinário (pago uma única vez) atribuído pelo Governo deveria ser convertido numa atualização extraordinária permanente para efeitos da atualização do valor da pensão. Mais à esquerda, o PCP propôs que, a partir de 1 de janeiro de 2026, a atualização para todas as pensões correspondesse a 5% do valor da pensão, “não podendo o montante da atualização ser inferior a 75 euros por pensionista”. As três propostas acabaram por ser rejeitadas.
E passou apenas a iniciativa de PSD e CDS que apenas indica que, em 2026, o Governo procederá ao pagamento de um suplemento extraordinário das pensões “em função da evolução da execução orçamental e das respetivas tendências em termos de receita e de despesa”.
Suspensão do agravamento das tributações autónomas
Empresas que registem prejuízos voltam a escapar por mais um ano a uma penalização em 10 pontos percentuais nas tributações autónomas em IRC, de acordo com uma proposta de alteração do PSD e CDS. Esta norma do código do IRC tem vindo a ser suspensa, de forma transitória desde a pandemia, mas o Governo não a incluiu na sua proposta de lei do Orçamento do Estado.
Em causa está um imposto adicional que se aplica sobre determinadas despesas ou encargos das empresas, sendo as mais relevantes as que abrangem as viaturas usadas pelas sociedades. E à partida não há como escapar-lhes, nem mesmo nos casos em que a empresa, por registar prejuízo, não tenha IRC a pagar.
O código determina que as taxas de tributação autónoma são “elevadas em 10 pontos percentuais” para as empresas que no ano fiscal em causa apresentem prejuízo fiscal, a menos que estejam no primeiro ou no segundo ano de atividade.
Reforço de verbas para o Tribunal Constitucional
O PS deu a mão ao Chega ao ajudar a viabilizar o reforço de verbas para o Tribunal Constitucional, que vai assim receber uma verba adicional de 1,6 milhões de euros, conforme pedido em audiência pelo presidente da instituição, José João Abrantes.
O diploma prevê que o Governo deve, em 2026, “reforçar a dotação orçamental destinada ao Tribunal Constitucional, à Entidade das Contas e Financiamentos Políticos e Entidade para a Transparência, num valor global de 1.600.000 euros”. Na iniciativa, pode ler-se que o reforço que permite um orçamento total da instituição de 12,9 milhões de euros é destinado às despesas de funcionamento da instituição, bem como “às despesas de funcionamento da Entidade para a Transparência e da Entidade das Contas e dos Financiamentos Políticos”.
O PS, PAN, Livre, PCP, BE e JPP apresentaram igualmente uma proposta conjunta para um reforço das verbas atribuídas ao Tribunal Constitucional no mesmo valor, mas acabou por ser rejeitada com os votos contra de PSD, CDS e Chega, depois de um aceso debate sobre se a iniciativa deveria ser admitida a votação ou não, com o presidente da COFAP, Rui Afonso, a mostrar-se contra.
Dedução do IVA na cultura e obras de arte a 6%
O IVA da compra de livros, bilhetes para teatro, espetáculos de música e de dança ou entradas em museus passa a ser dedutível em IRS a partir do próximo ano, no quadro das despesas por exigência de fatura, à semelhança do que acontece com as despesas em alojamentos e restauração, cabeleireiros, mecânicos ou veterinários. A medida resulta da aprovação de uma proposta do PS.
Deste modo, a partir de 1 de janeiro de 2026, os contribuintes poderão deduzir o correspondente a 15% do IVA, com o limite global de 250 euros por agregado familiar, que conste de faturas de despesas realizadas no comércio a retalho de livros, em estabelecimentos especializados, atividades de teatro, de música, de dança e outras atividades artísticas e literárias, exploração de salas de espetáculos e atividades conexas, atividades das bibliotecas e arquivo, atividades dos museus, atividades dos sítios e monumentos históricos.
Para além disso, PS e Chega votaram a favor das propostas um do outro para “cortar” o IVA das obras de arte vendidas em galerias e outros revendedores para a taxa reduzida de 6%, que hoje está na taxa normal, de 23%. A reivindicação do setor das galerias não foi votada favoravelmente pelo PSD e CDS, os partidos que apoiam o Governo, apesar de a ministra da Cultura, Margarida Balseiro Lopes, ter reconhecido que faria “naturalmente sentido” essa redução, mas remetendo a decisão para a Assembleia da República, soberana em assuntos fiscais.
Cheque e-book
Por proposta do Chega, o Parlamento aprovou o alargamento aos e-books do cheque-livro atribuído aos jovens que façam 18 anos em 2026. Com a medida, a legislação passa a prever que “na edição de 2026 do Programa Cheque-Livro, é criado um cheque e-book, nos mesmos termos do cheque-livro para livros físicos, no valor de 60 euros, beneficiando deste as pessoas singulares, residentes em território nacional, detentoras de cartão de cidadão e que perfaçam 18 anos nesse ano civil”.
Aumento das PPP na saúde
PSD e o CDS-PP conseguiram fazer aprovar esta segunda-feira uma proposta de alteração que inscreve no documento o compromisso do Governo em promover ações e decisões para adjudicação de contratos de Parcerias Público-Privadas (PPP) na saúde.
A proposta prevê que, em 2026, “o Governo promove ações e decisões tendentes à adjudicação de contratos de Parceria Público-Privada na área da saúde, sempre que tal contribua para a obtenção de mais ganhos em saúde para as pessoas destinatárias, especialmente quando doentes” e “se afigure vantajoso para o interesse público, nomeadamente face à consideração do binómio qualidade-custos”.
Subsídio de patrulha e antigos combatentes
O Chega viabilizou, mudando o seu sentido de voto, uma proposta socialista que aumenta o subsídio de patrulha da PSP e da GNR. A proposta, inicialmente rejeitada em comissão, seria avocada a plenário e viabilizada no dia seguinte com a mudança do sentido de voto do partido de André Ventura. Para além disso, e com os votos favoráveis dos partidos de esquerda e do Chega, foi aprovada uma proposta do PS que aumenta o suplemento especial de pensão dos antigos combatentes.
IRC na Zona Franca da Madeira
O benefício fiscal em sede de IRC dirigido às empresas licenciadas para operar na Zona Franca da Madeira (ZFM) foi alargado por mais cinco anos, até 31 de dezembro de 2033, devido à aprovação da proposta de alteração apresentada pelos deputados do PSD Madeira. Se esta alteração não fosse aprovada, o regime terminaria em 2028, de acordo com a atual redação do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
Assim, e de acordo com a proposta agora aprovada, “os rendimentos das entidades licenciadas para operar na Zona Franca da Madeira a partir de 1 de janeiro de 2015 e até 31 de dezembro de 2026 são tributados em IRC, até 31 de dezembro de 2033, à taxa de 5%”.
Para além disso, “os sócios ou acionistas das sociedades licenciadas para operar na Zona Franca da Madeira, que beneficiem do presente regime, gozam de isenção de IRS ou de IRC, até 31 de dezembro de 2033”, tal como acontece atualmente, sobre os lucros colocados à sua disposição por essas sociedades, com exceção dos que resultam de operações realizadas com entidades residentes ou com domicílio em paraísos fiscais.
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