Sorteios electrónicos dos processos mais controlados ainda na gaveta. PS prepara nova lei

Diplomas, à data chumbados pelo PS, apareceram depois de casos como o de suspeitas de distribuição irregular de processos na Operação Marquês e depois de conhecida a "Operação Lex".

O Ministério da Justiça deixou cair as duas leis que definiam um controle mais apertado aos sorteios eletrónicos dos processos para os tribunais judiciais e para os Administrativos e Fiscais — mas prepara uma nova proposta.

“Em fase de regulamentação das mesmas, o Ministério da Justiça detetou algumas questões que carecem de aperfeiçoamento e aprofundamento, de forma a garantir a absoluta transparência do procedimento de distribuição eletrónica de processos nos Tribunais Judiciais e nos Tribunais Administrativos e Fiscais (TAF). Tem estado, por isso, a trabalhar numa proposta que deverá apresentar em breve. Consciente da vital importância do reforço deste procedimento na promoção da transparência, o Governo tudo tem feito para chegar a uma solução que fortaleça a credibilidade do sistema de justiça”, disse fonte oficial do gabinete da ministra da Justiça, Catarina Sarmento e Castro.

Em agosto de 2021, o Parlamento aprovou as leis que estabelecia mecanismos de controlo da distribuição eletrónica de processos judiciais, prevendo a presença de um representante da Ordem dos Advogados para assegurar o controlo dessa distribuição. No entanto, o Governo não chegou a regulamentar essas leis, apesar de a lei prever um prazo de 30 dias para o efeito, inviabilizando assim a sua aplicação. Todos os partidos votaram a favor, à exceção do PS.

Segundo estes diplomas que não chegaram a ver a luz do dia, o sorteio eletrónico de processos passaria a ser presidido por um juiz, assistido por um oficial de justiça, um magistrado do Ministério Público e, se possível, de um advogado designado pela Ordem dos Advogados.

Os diplomas surgem numa altura em que se conheciam as suspeitas sobre alguns dos sorteios dos processos mais mediáticos da Justiça portuguesa, maioria destes atribuídos ao juiz de instrução Carlos Alexandre. Uma das situações — relativamente ao sorteio do processo da Operação Marquês, na fase da instrução –– encontrava-se atualmente em investigação no Ministério Público.

O texto final do projeto-lei aprovado, e da iniciativa do PSD sublinhava que o mesmo “visa aumentar a fiabilidade do sistema de distribuição eletrónica dos processos judiciais, que tem sido, nos últimos tempos e em mais do que uma instância, posta em causa, por possibilitar a manipulação dos sorteios dos processos”, segundo o comunicado do Conselho de Ministros.

Por outro lado, determinava-se regras claras a que deve obedecer a distribuição, nomeadamente os processos distribuídos por todos os juízes do tribunal, ficando a listagem anexa à ata e, se for distribuído um processo a um juiz que esteja impedido de nele intervir, deve ficar consignada em ata a necessidade de fazer nova distribuição por ter sido distribuído a um juiz impedido, constando expressamente o motivo do impedimento, bem como anexa à ata a nova listagem. Por outro lado, as operações de distribuição são obrigatoriamente documentadas em ata, elaborada imediatamente após a conclusão daquelas e assinada pelas pessoas nelas presentes, a qual contém necessariamente a descrição de todos os atos praticados.

Operação Lex na origem da mudança de regras

Em setembro de 2016, começava a investigação do chamado caso “Operação Lex”. A mesma centrou-se na atividade desenvolvida por três juízes desembargadores do Tribunal da Relação de Lisboa (TRL) que utilizaram tais funções para a obtenção de vantagens indevidas, para si ou para terceiros. Os três magistrados na acusação são Rui Rangel, Fátima Galante e Luís Vaz da Neves. Segundo a Procuradoria-Geral da República, as vantagens obtidas superaram os 1,5 milhões de euros. A acusação deu-se em 2020, um ano antes da aprovação destes dois diplomas.

Rui Rangel, ex-presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, foi expulso da magistratura após estas suspeitas. Está acusado pelos crimes de corrupção passiva para ato ilícito (dois), recebimento indevido de vantagem, abuso de poder (quatro), falsificação de documento (seis), fraude fiscal (seis), usurpação de funções e branqueamento de capitais.

Por sua vez, Luís Vaz das Neves, ex-presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, jubilou-se em 2016 e foi substituído na presidência do TRL por Orlando Nascimento, que também já abandonou o cargo. O Ministério Público acusa Vaz Neves de violar os seus deveres funcionais de isenção e imparcialidade com a ordenação da distribuição manual de processos, permitindo que Rangel obtivesse benefícios económicos ilegítimos. Em causa estão os crimes de corrupção passiva para ato ilícito e dois crimes de abuso de poder.

No banco dos arguidos está também Luís Filipe Vieira, ex-presidente do Benfica, Fernando Pagamim Tavares, ex vice-presidente do Benfica, e Jorge Rodrigues Barroso, advogado e ex-assessor de Vieira. O ex-presidente do Benfica está a ser acusado pelo crime de recebimento indevido de vantagem, em coautoria com Fernando Pagamim Tavares e Jorge Rodrigues Barroso. Em causa está o facto de ter tentado obter informação privilegiada de um processo fiscal que envolvia a empresa do filho. Por decisão conhecida em dezembro passado, os arguidos esperam agora o julgamento.

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