Pacto para a justiça falha no acesso à justiça, diz Marcelo
Marcelo Rebelo de Sousa refere que o pacto da justiça teve sucessos, como o Estatuto das Magistraturas, mas "limitados e precários", por exemplo no acesso à justiça.
O Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, relembrou na abertura do ano judicial o pacto da justiça que propôs em 2016/2017 e reconheceu que este teve sucessos, como o Estatuto das Magistraturas, mas “limitados e precários”, por exemplo no acesso à justiça.
“Seria, no entanto, lastimável que por essa via a dos protagonistas da justiça ou outra, como a conjugação dos parceiros políticos, económicos e sociais, se chegasse a 2026 com o apelo de uma gestão sobretudo quotidiana, pontual, casuística, de um sistema cada vez mais afastado da realidade social“, salientou.
Ainda assim, convicto de que o país dos dias de hoje é muito diferente do que existia nos anos 90, começo do século XXI ou até mesmo do início desta década, Marcelo Rebelo de Sousa salientou a modernização.
“A digitalização, ainda que tardia, abriu avenidas de inovação, mas o que mais se impõe é ir olhando para todo o edifício judicial e, quanto a ele, ir detetando o que já não corresponde aos novíssimos desafios e a uma comunidade mais aberta, mais internacionalizada, em contraponto fruto das crises mais dualista, ou seja, menos coesa, mais assimétrica, em que aceder ao bem coletivo, chamado justiça, sem constantes e como que inevitáveis chocantes desigualdades”, referiu.
O Presidente da República sublinha que é necessário repensar a jurisdição comum e administrativa e fiscal, tornar mais flexível e ajustável todo sistema, aproximar o seu tempo do tempo social, conjugar melhor os meios clássicos e os meios preventivos, reativos e inovatórios, “em vez de apenas os justapor”, criar mecanismos de monitorização permanente, disponibilizando formas de comunicação com a sociedade, e proporcionar recursos, desde logo os humanos adequados às mais necessidades.
Marcelo Rebelo de Sousa relembrou ainda que os valores sociais mudam e a democracia define-se por “respeitar e cultivar esta mudança e o pluralismo da sua expressão”. “E a mudança tem sido, felizmente, em inúmeras circunstâncias, num sentido de mais e melhores direitos”, disse.
Entre essas mudanças está em mais e melhores exigências perante a corrupção ou a opacidade, mais e melhor sustentabilidade ambiental, mais e melhor equidade entre pessoas, instituições, territórios, mais e melhor combate às pobrezas, exclusões e xenofobias. Ou seja, mais e melhor Estado Social de Direito.
“Mas se a mudança for no sentido oposto. Se a moda na opinião pública do instante for o recuo perante o Estado Social de Direito. E se essa moda se ampliar aqui e ali por fenómenos de reação emotiva ou de contestação sistémica a outros setores da comunidade. Devem a legislação, a administração, e depois a justiça necessariamente acompanhar ou mesmo acelerar essa mudança?“, questionou, relembrando os vários movimentos atuais no contexto europeu.
Marcelo sublinhou também que nem só de poder judicial em sentido orgânico se faz a justiça. Pois também se faz de legislação e de administração que ditam as regras que ao judicial compete aplicar. “Ora legislação e administração, não contestando a inegável sofisticação da ciência e da técnica legislativa e administrativa, não cessam de abundar em quantidade e carecer devagar para corresponderem a qualidade”, disse.
“Legisla-se e administra-se demais para o passado. Retroage-se ou retroverte-se em demasiada. Recorre-se ao excecional à mingua do geral e mesmo do especial. Converte-se em premente quase tudo, o premente a amiúde significa singular ou individual com ou sem rótulo. Toma-se um expediente em prescindível por uma situação bem precisa e quer-se aplicar anos a fio a uma situação aparentemente análoga, mas na verdade diversa. Leva-se a elevados patamares de imaginação a atipicidade, a natureza suis generes, a hibridez das soluções ditadas pelo remendo de ocasião”, refletiu.
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