Desemprego está a subir, mas economistas ainda não veem motivo para alarme
Há seis meses que o desemprego registado pelo IEFP está a subir. E em 2023 os despedimentos coletivos chegaram ao nível mais elevado desde o arranque da pandemia. Economistas recomendam monitorização.
Depois de vários meses a dar provas de resiliência, o mercado de trabalho português fechou o ano de 2023 com sinais que “merecem atenção”. Desde 2013 que não havia tantos despedimentos coletivos. Há seis meses que o número de desempregados inscritos no Instituto do Emprego e Formação Profissional (IEFP) não para de crescer. E no penúltimo mês do ano o lay-off chegou a máximos de quase duas décadas. Os economistas explicam que o abrandamento da economia justifica este cenário e antecipam que o desemprego deverá continuar a subir ao longo de 2024.
Vamos por partes. O IEFP terminou 2023 com 317 mil desempregados inscritos. Nos primeiros meses do ano, o número de indivíduos registados nos centros de emprego ainda encolhera, apesar dos múltiplos desafios que já se faziam sentir, da inflação aos juros. Mas em julho o caso mudou de figura e, desde então, o desemprego registado pelo IEFP não tem parado de aumentar (ver gráfico abaixo).
Há seis meses que o desemprego registado pelo IEFP está a subir
Fonte: IEFP
Em dezembro, por exemplo, a subida em cadeia foi de 1,7%, o equivalente a mais 5.000 indivíduos inscritos no IEFP do que no mês anterior. Já em termos homólogos, o salto foi de 3,5%, ou seja, Portugal terminou 2023 com mais 10.654 inscritos do que tinha finalizado 2022.
“Há dois fatores interligados que contribuem para esta situação”, identifica Paulo Marques, coordenador do Observatório do Emprego Jovem e professor do ISCTE. “O abrandamento da atividade económica ao longo do último ano (em Portugal e na União Europeia) e a política monetária do Banco Central Europeu, que tem vindo a contribuir para uma diminuição do consumo e do investimento privado”, detalha.
João Cerejeira, professor da Universidade do Minho, e Pedro Braz Teixeira, diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade, concordam com essa leitura e salientam que esses são números que merecem ser monitorizados. Mas, para já, não são motivo de alarme.
São sinais a indicar necessidade de monitorização, mas não propriamente alarme. A economia está a desacelerar e deverá permanecer fraca até ao final do 1º semestre de 2024, podendo recuperar a partir daí, com a descida de taxas de juro pelo BCE.
Outro dado que ajuda a sentir o pulso do mercado de trabalho são os despedimentos coletivos. E em 2023 atingiram-se máximos desde 2020. Em concreto, foram comunicados 431 destes despedimentos, mais 101 do que no ano anterior. Ou seja, é preciso recuar ao início da pandemia — altura em que por força das restrições associadas à crise pandémica muitas empresas reduziram os seus postos de trabalho — para encontrar um valor mais elevado.
A estes números soma-se ainda a evolução do lay-off, regime que permite aos empregadores em crise suspenderem os contratos de trabalho ou reduzirem os horários dos trabalhadores, ao mesmo tempo que recebem uma ajuda da Segurança Social para o pagamento dos salários.
Em novembro, quase 16 mil trabalhadores foram abrangidos por este regime, o valor mais elevado de toda a série estatística, que arranca em 2006. Entretanto, em dezembro, o universo de trabalhadores cobertos pelo lay-off recuou (para 9.782), mas mantém-se bem acima dos valores que tinham sido registados nos primeiros meses de 2023 (ver gráfico abaixo).
Lay-off atingiu máximos de quase duas décadas em novembro
Fonte: Segurança Social
O diretor do gabinete de estudos do Fórum para a Competitividade explica a evolução destes dois indicadores (despedimentos coletivos e lay-offs) com a reestruturação da economia e a subida das taxas de juro, “que tem pressionado muitas empresas”. E antecipa que, após o primeiro semestre de 2024, a economia deverá começar a ganhar ritmo, o que poderá dar outro ânimo ao mercado de trabalho.
Desemprego nos setores expostos ao estrangeiro merecem maior atenção
Nem todos os setores de atividade estão a viver da mesma forma este período de desafios. Enquanto os setores ligados à procura interna não têm sofrido um abrandamento considerável, alguns dos ligados às exportações — como o setor da moda — têm enfrentado “choque externos“, o que ajuda a explicar o agravamento do desemprego, retrata João Cerejeira.
Ora, de acordo com o IEFP, dos três grandes setores, foi na indústria que mais cresceu o número de indivíduos registados como candidatos a um novo emprego. Enquanto aí houve um salto de 6,4%, em termos homólogos, nos serviços o aumento foi de 4,9% e na agricultura foi de 2,9%.
Dentro da indústria, as atividades ligadas aos produtos de couro e ao vestuário estão em destaque, com aumentos, respetivos, de 76,8% e 15% dos desempregados inscritos em dezembro de 2023 face a dezembro de 2022. “São setores exportadores, muito afetados pelo clima económico nos principais destinos das exportações portuguesas“, salienta Paulo Marques.
E também no lay-off e nos despedimentos coletivos a indústria aparece em realce. Os dados disponibilizados recentemente pelo Ministério do Trabalho ao Jornal de Negócios mostravam que a indústria explica três quartos dos lay-offs. E os números da Direção-Geral do Emprego e das Relações do Trabalho dão conta que foi o setor das indústrias transformadoras o que mais despedimentos coletivos comunicou em dezembro.
2024 deverá ser sinónimo de mais desempregados
Os três economistas ouvidos pelo ECO concordam entre si: com a economia a abrandar, o desemprego deverá continuar a subir. Estima-se, assim, um aumento da taxa de desemprego em 2024, ainda que não expressivo. “Antecipo um aumento ligeiro da taxa de desemprego, de entre 6,5% e 6,6% em 2023 para entre 6,6% e 6,8% em 2024“, prevê Pedro Braz Teixeira.
Já o coordenador do Observatório do Emprego Jovem acrescenta que setores muito intensivos em trabalho — como o do alojamento e restauração — deverão continuar a criar emprego, daí que, apesar dos desafios, o desemprego deva aumentar apenas ligeiramente, e não ao ritmo observado, por exemplo, durante a crise financeira de 2008.
Entre as várias instituições, o Banco de Portugal é, neste momento, o mais pessimista: vê o desemprego a chegar a 7,1% em 2024. Em comparação, o Governo, no Orçamento do Estado para este ano, apontou para uma taxa de desemprego de 6,7%. Já o Conselho das Finanças Públicas e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico têm as projeções mais otimistas, prevendo uma taxa de 6,3%, isto é, abaixo do registado em 2023.
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