Operação Tutti Frutti. Ministério Público arquiva investigação a Medina e acusa 60 arguidos
Entre os arguidos acusados neste caso estão o presidente da Junta de Freguesia da Estrela, Luís Newton, o deputado do PSD Carlos Eduardo Reis e o ex-deputado social-democrata Sérgio Azevedo.
O Ministério Público acusou 60 pessoas, entre elas autarcas das mais importantes juntas de freguesia de Lisboa, funcionários e empresários, no âmbito do processo Tutti Frutti, avançou a CNN Portugal e confirmou o ECO. Em causa estão crimes de corrupção, prevaricação, abuso de poder, tráfico de influência e participação económica em negócio, segundo a acusação, a que o ECO/Advocatus teve acesso.
As imputações relativas a Fernando Medina, ex-ministro e ex-autarca socialista, foram todas arquivadas. Entre os arguidos acusados neste caso estão o presidente da Junta de Freguesia da Estrela, Luís Newton, o deputado do PSD Carlos Eduardo Reis e o ex-deputado social-democrata Sérgio Azevedo. Em autoria estão em causa três de corrupção passiva (um agravado), dois de corrupção ativa, sete de branqueamento, dois de tráfico de influência. Além das dezenas de crimes imputados aos vários arguidos, o MP pediu ainda a perda de mandato para aqueles que foram eleitos para cargos autárquicos.
“Os arguidos Sérgio Azevedo, Rodrigo Gonçalves, Vasco Morgado, Nuno Firmo, Luís Newton, Ângelo Pereira, Fernando Braamcamp, Ameetkumar Subhaschandra, Patrícia Brito Leitão, Rodolfo de Castro Pimenta, Ana Sofia Oliveira Dias, Inês de Drummond e José Guilherme Aguiar praticaram os factos de que vêm acusados no exercício de mandato autárquico, valendo-se dos respetivos cargos para satisfazer interesses de natureza privada em prejuízo do interesse público, em grave violação dos deveres inerentes às suas funções de autarcas”, escreve o MP no despacho.
“Da prova recolhida nos autos, não é possível extrair que Fernando Medina, acedendo às insistências de Sérgio Azevedo e acabando por resolver a situação de encontro aos interesses da XV -Associação Amigos do Rugby de Belém que lhe chegaram representados por este, o tivesse feito com o propósito inequívoco de os beneficiar por via de uma atuação conscientemente contrária ao direito”, diz a acusação. “A factualidade descrita revela comportamentos, incluindo de Fernando Medina, que se desviam e atropelam as normas que enquadram o exercício das funções públicas, e, por isso, ilícitos, reveladora de um modo de gestão e funcionamento da res publica merecedor de um juízo de censura. Porém, não sendo o crime em causa punido a título de negligência, mas de dolo, in casu até específico, sendo evidente que existia uma vontade de todos de que o resultado ocorresse, como ocorreu, não existe, contudo, a prova de uma intenção de desvirtuar as normas jurídicas e afastá-las para benefício dos mesmos”, acrescenta o despacho do Ministério Público.
Fernando Medina prestou declarações, dizendo, em síntese, “que não teve intervenção no procedimento conducente à atribuição do apoio financeiro, o qual competia aos serviços da Câmara Municipal de Lisboa, ao vereador responsável pelo pelouro do desporto e ao executivo camarário, não tendo sequer estado presente na reunião de executivo na qual foi deliberada a respetiva atribuição”, dizem os magistrados. “Referiu, ainda, que agendou a reunião a pedido de Sérgio Azevedo, desconhecendo os interesses que o mesmo pudesse ter na atividade da XV, e que nessa reunião ouviu os interessados, na presença do vereador do Desporto, e que o que daí saiu foi que a Câmara Municipal de Lisboa apoiaria a construção do campo, o que o próprio, intimamente, apenas admitiria na circunstância de estarem reunidos os pressupostos legais para o efeito. Negou ter comprometido o município com a sua atuação e ter interferido no procedimento, acrescentando que o município apoia financeiramente outros clubes na cidade e que, inclusivamente, Lisboa preparava-se para ser Cidade Europeia do Desporto, considerando que o apoio concedido era, também por isso, de interesse para a cidade”.
Neste processo são investigados, desde 2018, alegados favorecimentos a militantes do PS e do PSD, através de avenças e contratos públicos, estando em causa suspeitas de corrupção passiva, tráfico de influência, participação económica em negócio e financiamento proibido.
Fernando Medina anunciou a 29 de julho, em comunicado, que o MP solicitou a sua audição na qualidade de arguido no âmbito do processo “Tutti Frutti”, acrescentando, na altura, ter solicitado à Assembleia da República o levantamento da imunidade parlamentar “com a maior brevidade possível” para poder, “pela primeira vez em tantos anos, ter a oportunidade de esclarecer em sede própria as dúvidas que o MP tem”. No mesmo comunicado esclareceu ser suspeito da “prática de um alegado crime de prevaricação”.
A factualidade descrita revela comportamentos, incluindo de Fernando Medina, que se desviam e atropelam as normas que enquadram o exercício das funções públicas, e, por isso, ilícitos, reveladora de um modo de gestão e funcionamento da res publica merecedor de um juízo de censura. Porém, não sendo o crime em causa punido a título de negligência, mas de dolo, in casu até específico, sendo evidente que existia uma vontade de todos de que o resultado ocorresse, como ocorreu, não existe, contudo, a prova de uma intenção de desvirtuar as normas jurídicas e afastá-las para benefício dos mesmos”.
Em causa está a atribuição alegadamente indevida, “por mim, enquanto Presidente da Câmara Municipal de Lisboa, em 23 de março de 2017, de um apoio financeiro no valor de duzentos mil euros – a realizar em dois anos – à XV – Associação Amigos do Rugby de Belém, no âmbito do apoio ao associativismo desportivo”, explicou então Fernando Medina. O deputado disse ter visto, “com perplexidade, que a fundamentação do MP assenta num erro grosseiro e inexplicável”, recusando qualquer ilegalidade. E salientou que já decorreram mais de sete anos desde o início do inquérito e de se ter manifestado disponível para prestar declarações.
A operação batizada de “Tutti Frutti” investiga desde 2018 alegados favorecimentos a militantes do PS e do PSD, através de avenças e contratos públicos, estando em causa suspeitas de corrupção passiva, tráfico de influência, participação económica em negócio e financiamento proibido.
Pedro Nuno lamenta demora “preocupante”. “Finalmente livre”, desabafa Duarte Cordeiro
Questionado sobre o facto de as imputações relativas a Fernando Medina terem sido todas arquivadas, o secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos salientou que essa é uma “boa notícia”, mas criticou que “as pessoas que tiveram o seu nome na praça pública envolvido neste caso tivessem de esperar oito a nove anos pelo arquivamento do processo”.
“Isso sim é preocupante e deve-nos fazer pensar a todos. Porque estes processos têm impacto na vida das pessoas e, por isso, os processos têm de ser mais céleres, para protegermos a nossa democracia e o Estado de direito. Portanto, a notícia boa é a do arquivamento, a notícia má é do tempo que demorou até ao arquivamento”, concretizou o líder socialista, em declarações aos jornalistas transmitidas pela RTP3.
Entretanto, também Duarte Cordeiro, igualmente ilibados no âmbito deste processo, recorreu às redes sociais para assinalar que fica “finalmente livre” depois de “anos a lidar com especulação e suspeita”. “Ficou clarificado o que sempre disse. Não há nada que surpreenda no que me diz respeito e só lamento o tempo que demoram estes processos a concluírem as suas investigações. Relembro que nunca fui sequer ouvido”, escreveu no Instagram.
(Notícia atualizada às 14h50 com reação de Duarte Cordeiro)
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