Diogo Lacerda Machado gostava que Fernando Pinto continuasse à frente da TAP, elogia o gestor e defende o acordo entre o Estado e os privados. E mantém a confiança em Miguel Frasquilho.
Fernando Pinto anunciou há dias que não vai continuar como presidente executivo da TAP no próximo mandato e será substituído por Antonoaldo Neves. Para Diogo Lacerda Machado, o gestor brasileiro saiu nas condições que quis. E num ano extraordinário. Lacerda Machado, também ele administrador não executivo da TAP, não revela os resultados de 2017, mas adianta que “são bons”. E mantém a confiança em Miguel Frasquilho.
Fernando Pinto merecia ter continuado como CEO da TAP?
Fernando Pinto cumpriu exemplarmente a missão, primeiro a de ser o gestor profissional que dirigia uma equipa profissional quando foi recrutado, e de assinalar aí uma mudança no que era a escolha habitual das equipas de gestão da TAP. Veio para a privatizar e esta aconteceu realmente agora. O engº Fernando Pinto tinha todo o direito a escolher o momento em que achasse oportuno sair. Era o mínimo e o primeiro dos reconhecimentos que lhe era devido. Se eu gostava, pessoalmente, que ele continuasse? Com certeza. Mas o engº Fernando Pinto fez a sua escolha e acho que sai numa altura extraordinária, no fim de um ano extraordinário e de sucesso. A TAP deu a volta. Hoje, é uma empresa interessantíssima.
Sai no ano em que a TAP volta a dar lucros…
Sai no ano em que a TAP volta a dar lucros, em que tem um horizonte muito promissor e que é um caso sério num ambiente imensamente competitivo, que é a aviação profissional. Portanto, o engº Fernando Pinto tinha direito a isso e escolheu um momento para sair realmente bom.
Mas foi uma escolha sua ou de um acionista privado da TAP?
Foi uma escolha do engº Fernando Pinto. O acionista privado começou por escolher o engº Fernando Pinto e isso, aliás, posso revelá-lo aqui, facilitou imenso aquela negociação que foi feita: quando perguntados sobre quais seriam os seus propósitos, os próprios acionistas privados disseram “nós tencionamos manter o engº Fernando Pinto”. Tinha sido a escolha absolutamente consensual de todos os governos ao longo de 15 anos. Foi um daqueles momentos do processo de reconfiguração acionista em que estavam todos de acordo. Fernando Pinto também foi escolha dos acionistas privados e, por isso, foi uma escolha absolutamente consensual.
O atual governo decidiu mudar o acordo com os privados da Atlantic Gateway e o Estado passou a ter 50% da companhia, mas, com a saída de Fernando Pinto, a comissão executiva de três membros passou a ser totalmente indicada pelos privados. Afinal, quem manda na TAP?
A primeira resposta é relativamente simples. O Estado tem 50% do capital da TAP e não há aqui nenhuma deliberação orgânica que possa ser tomada no seio da TAP que não tenha o acordo do Estado. Mas o Estado também não pode impor nada com 50%. Não pode, por si só, se todos os outros 50% votassem contra. Costumo recordar o exemplo do Governo, de que tive a honra de fazer parte, que, digo por graça, “não tinha nem maioria absoluta nem maioria relativa, tinha uma maioria absurda de 115 [deputados] igual à oposição”. O acordo na TAP é uma espécie de solução virtuosa em que o Estado tem 50%. Se o modelo anterior tivesse prevalecido hoje, o Estado não existia na TAP. Não tinha nada na TAP.
Tinha 39%…
Não, não tinha. Porque, naturalmente, volvidos dois anos, os acionistas privados tenderiam a exercer a opção e comprariam o resto do capital, pagando praticamente nada, como sabe. E o Estado, hoje, não existiria na TAP, não teria nenhuma ação na TAP. Esta solução equilibrada permite conciliar o essencial da salvaguarda dos princípios estratégicos do que a TAP é, do que a TAP foi ao longo de 70 anos, do que tem de ser, não me atrevo a dizer dos próximos 70, mas oxalá. Portuguesa, em Portugal, contribuindo para a economia portuguesa de uma forma extraordinária. É a segunda maior exportadora de serviços do ponto de vista da balança de pagamentos total. Tem uma importância enorme, é uma das maiores empregadoras do país, construindo um hub em Lisboa. O que sucede é que os parceiros privados que o Estado passou a ter são capazes de dar uma contribuição extraordinária para a TAP, designadamente no saber e na competência. Os resultados, aliás, estão à vista. E o que se passa é que esta comissão executiva tem poderes delegados do conselho de administração. Está acima…
Todas as decisões têm de ter a anuência do Estado? E todas as decisões estratégicas são tomadas pelos investidores privados?
Não, pelo contrário. Faz parte do acordo que foi assinado: Tudo o que é estratégico, ou é decidido no conselho de administração ou na assembleia geral. E, aí, o Estado tem sempre 50%. E no conselho de administração, o Estado tem metade dos membros e tem ainda o presidente do conselho de administração, que tem o voto de qualidade para desempatar. Todavia, eu tenho a ideia de que não será nunca preciso. Estimo que não seja necessário que a questão sequer se ponha, porque há um alinhamento de interesses muito interessante. É muito simples. Há um plano estratégico, um plano de negócios. Este conselho de administração, esta comissão executiva, estão ali para executar esse plano estratégico e esse plano de negócios e entregar os resultados. É naturalmente nisso que estamos empenhados, e eu, na parte pequena que me compete. Não há nenhuma dúvida do que é que a TAP tem de ser no futuro ou sobre o que é que deve fazer.
Recordo-lhe o que disse Rui Moreira, presidente da Câmara Municipal do Porto, há uns meses: “Mas afinal por que é que o Estado tem 50% quando o Porto é esquecido na estratégia da TAP”.
Como sabe, o Porto, atrevo-me a dizer, tem um serviço muito melhor do que tinha antes.
Por causa das ligações diárias?
Claro. A ideia da ponte aérea, do engº Fernando Pinto, é um sucesso extraordinário. Tem mais de um milhão de passageiros. Hoje em dia, os passageiros a partir do Porto chegam muito mais depressa — e melhor — a todos os destinos da TAP, quase tão bem como aquelas três ou quatro cujas ligações diretas que foram suprimidas e parte delas, aliás, estão para ser retomadas.
Reconhecendo, se calhar, o erro de ter acabado com essas ligações.
Não. Provavelmente, é o resultado da capacidade da TAP ter feito uma coisa que não fazia há oito anos: Aumentando a sua oferta, a TAP, pela primeira vez, inverteu um ciclo inexorável de perda de passageiros para as chamadas ‘low cost’. A TAP começou a recuperar passageiros. Também houve um crescimento absoluto e, portanto, hoje, em função de ter uma oferta mais adaptada, faz todo o sentido voltar a oferecer algum tipo de serviço ao Porto com capacidade para competir como deve ser.
Agora, o Estado tem também uma responsabilidade sobre a dívida que não tinha no anterior modelo.
Falando do passivo da TAP, vale a pena dizer que era uma espécie de lastro que existiu na companhia desde 1998. Depois, vale a pena perceber que o Estado, enquanto único acionista, respondia ilimitadamente sobre a totalidade desse passivo. Depois, vale a pena lembrar que, naquela privatização, e naquele modelo de 15 de novembro de 2015, na 27ª hora, o Estado não se libertava em grande medida desse passivo. A própria banca portuguesa sentia-se bastante confortável. Aliás, uma das razões da saudável demora do processo de concretização da reconfiguração foi esse trabalho com os bancos de conduzir a uma solução, que é a que existe, em que o Estado responde na mesma linha que os privados. Sublinho, hoje o Estado responde pelo passivo da TAP da mesma maneira que os privados respondem sobre o passivo da TAP. Houve um jornalista que escreve num órgão virado para a economia que disse: “Enganaram-nos, porque há aí umas prestações suplementares que estão nos estatutos e que, portanto, o Estado vai meter dinheiro.” Era um daqueles que não gosta consabidamente deste Governo. Esqueceu-se de ler que aquilo vale rigorosamente tanto para o Estado, através da Parpública, como vale para o acionista Atlantic Gateway. Sublinho que, em função do notável desempenho que a TAP está a ter, está muito longe dessa eventualidade e a sair com números muito folgados sobre os rácios exigidos.
Já nos pode dar os resultados de 2017?
Não, não disponho deles. É o engº Fernando Pinto que está a finalizá-los e ele próprio, seguramente, estará no dia da apresentação, porque acho que vai ter um justificadíssimo orgulho em fazer isso. Mas são bons.
Foi notícia que Miguel Frasquilho, o chairman da TAP indicado pelo Estado, recebeu transferências da ES Enterprise – a caixa negra do grupo de Ricardo Salgado – quando trabalhava no BES. Frasquilho tem condições para manter-se em funções?
Aprecio bastante o desempenho do dr. Miguel Frasquilho na TAP. Ainda hoje de manhã estivemos a trabalhar e não sinto nenhuma mudança na capacidade e competência ou desempenho do dr. Miguel Frasquilho para desempenhar a função. Ele deu as explicações que entendeu dar. Insisto: não vi nenhuma modificação, nem no comportamento, nem na capacidade, nem na competência do dr. Miguel Frasquilho para desempenhar a sua função. Naquilo que eu vi, é impecável.
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Diogo Lacerda Machado: “Se gostava que Fernando Pinto continuasse na TAP? Com certeza”
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