Adán Plaza Used, um dos líderes tecnológicos da Accenture Europe, garante que "não existe" talento suficiente para responder às necessidades das tecnológicas: "Temos de criar DaVincis".
Chama-se Adán Plaza Used e é um dos líderes da Accenture Europe para o negócio da tecnologia, que é cada vez mais o “novo normal” para esta que é uma das quatro grandes consultoras ao nível mundial. São já 25.000 engenheiros programadores a trabalhar em tecnologias emergentes, assentes na inteligência artificial e no machine learning, mas também na blockchain. Admite que são grandes chavões, quase clichês, mas garante que já estão a transformar a sociedade.
Em entrevista ao ECO, à margem do Web Summit que decorreu no início de novembro, o gestor aborda o novo paradigma da implementação de tecnologia nos negócios e explica como o tecido empresarial precisa de um “efeito combinatório” dessa tecnologia, ao invés de uma abordagem unificada das várias tecnologias existentes. Fala ainda da retenção e da criação de talento, e garante que Portugal é um bom candidato a liderar a nova era do ecossistema empreendedor europeu.
O que é que está por vir no panorama global da tecnologia?
O que aí vem já cá está. Temos ouvido falar muito de inteligência artificial, blockchain e realidade estendida. Todos esses aspetos fazem parte daquilo que chamamos de “novas tecnologias, aspetos de inovação que devem ser incubados nos clientes. Mas o que estamos ativamente a fazer na Accenture é a escalar esta inovação até aos modelos de negócio. A tecnologia é um mercado em crescimento, mais de 50% ao ano, e isto vai tornar-se o “novo normal” para a Accenture, no imediato.
Mas são realmente “novas tecnologias”? Muitas são buzzwords e estamos sempre a ouvir falar delas. Como é que estas tecnologias podem ajudar as empresas em termos operacionais e ao nível da sustentabilidade?
Há de facto muito ruído por aí. Vemos notícias a falarem de carros autónomos, de tudo o que está a acontecer em torno das cidades inteligentes. Mas, contas feitas, são formas verticais de encarar a tecnologia e estou certo de que vai haver algum sucesso, muito sucesso, no futuro. Em relação ao que está a acontecer no dia-a-dia dos “negócios normais”, estamos a incubar e a combinar diferentes aspetos da inteligência artificial, da segurança das aplicações, ou da realidade estendida em todas as proposições que desenvolvemos para os nossos clientes.
Ou seja, no que toca a evoluir estes “negócios inteligentes” de uma forma “normal”, isso já está a acontecer agora, por exemplo, nas novas gerações de call centers, de apoio ao consumidor, graças às aplicações do machine learning. Novos ecrãs, assistentes virtuais, tecnologias através das quais se aumentam as possibilidades humanas e a interação com os sistemas existentes. Isto está a acontecer hoje. Uma vez mais, há grandes coisas que vemos que estão a impactar os negócios, mas, no dia normal, o que estamos a fazer é a incorporar e a introduzir estas inovações em todos os passos e aspetos das nossas vidas.
Quais são as tecnologias e tendências a que os nossos gestores e presidentes executivos devem prestar mais atenção?
Há dois aspetos: em termos de tecnologia, e em termos de como é que vamos estar a integrar essas tecnologias. O machine learning, a inteligência artificial, a blockchain, a realidade estendida, aplicam-se todas. Mas, para as aplicar de forma rápida e flexível e com grande impacto no negócio, temos de as adotar de uma forma diferente. Este é o primeiro tópico que deve ser tido em conta pelos gestores de TI [Tecnologias da Informação]: como é que vão reinventar as organizações tecnológicas e as especificidades culturais para criar e incorporar este efeito combinatório das “novas tecnologias” nos sistemas existentes, do ponto de vista tecnológico e dos programadores aos full-stack developers… Temos de criar “DaVincis” para o futuro.
É curioso porque, normalmente, temos tido uma abordagem muito limitada às diferentes tecnologias e agora precisamos de um efeito combinatório. Se queremos provocar um grande impacto nas empresas e na sociedade, temos de as combinar as diferentes tecnologias.
"Temos tido uma abordagem muito limitada às diferentes tecnologias e agora precisamos de um efeito combinatório.”
Acredita que as empresas estão a fazer bem isso?
A Accenture está a fazer bem isso [risos]. Na Accenture, criámos recentemente um departamento novo, chamado Intelligent Engineering Services, através do qual queremos fazer duas coisas. A primeira é escalar a inovação que está a ser aplicada hoje até uma dimensão de negócio — não a inovação do futuro, mas a inovação do presente. A segunda é criar novos frameworks para as TI. Novas fundações para o futuro. As atuais bases foram criadas há 50 anos, ou há mais de 50 anos. E se queremos escalar e encarar as novas tecnologias, temos de o fazer sobre novos alicerces de TI baseados em flexibilidade, em departamentos de cloud, em decoupled architecture, em DevOps, em novas coisas que já estão a afetar por si só os serviços, mas também a cultura das organizações.
É o que a sua equipa está a fazer?
Temos uma equipa global de mais de 25.000 programadores e full-stack engineers — na Europa, somos cerca de 12.000. A equipa está orientada para este efeito combinatório, de forma a aplicá-lo aos nossos clientes.
O ecossistema [empreendedor] norte-americano está um pouco mais avançado, mas o ecossistema que podemos criar na Europa pode ser mais consolidado.
Como é que a Accenture atrai talento na área da tecnologia?
Antes de mais, não há talento suficiente no mundo face às necessidades. Por isso, precisamos de o criar. E a Accenture está absolutamente comprometida com a criação desse talento.
Ou seja, não apenas atrair o talento que existe, mas criar novo talento?
Exatamente. Estamos a fazer acordos específicos com instituições académicas para alcançar mais universidades e institutos técnicos, através dos quais formamos o talento específico em torno das diferentes áreas que queremos desenvolver. São acordos específicos com os diferentes meios académicos, totalmente orientados para a Accenture.
A par disso, precisamos de criar uma nova forma de alcançar o talento das novas gerações. Por exemplo, criámos o programa Hour of Code em algumas geografias e temos desenvolvido algumas iniciativas de programação, como pequenos hackathonsorientados para crianças entre 10 e 15 anos de idade, de forma a educá-las para o futuro. Ou seja, não é uma abordagem tradicional — “o talento está ali, tenho de ir ali captá-lo”. Nada disso. Temos de investir, temos de colher os frutos e temos de criar o talento do futuro que atualmente está a faltar.
Está preocupado com essa falta de talento?
Não. Estou entusiasmado! Não é preocupação. Estamos a viver numa era de transição e temos de estar absolutamente seguros de que vamos estar a liderar uma parte dessa transição.
Esta é a melhor altura para se ser empreendedor?
Esta é a melhor altura, porque os empreendedores tendem sempre a ser vistos como as pessoas que têm grandes ideias. E hoje precisamos de empreendedores fora e dentro das empresas. É uma das razões que nos fez marcar presença no Web Summit. Queremos criar o nosso próprio ecossistema empreendedor, através do qual podemos escalar essas grandes ideias até às empresas que são nossas clientes.
Preocupa-se com as atuais questões com que o ecossistema tecnológico se depara atualmente, como, por exemplo, o papel da inteligência artificial na sociedade?
Uma das coisas que a tecnologia está a fazer é mudar regras. Não só as regras da sociedade como as regras humanas, a forma como interagimos com outros humanos e como interagimos ao nível da sociedade. Acredito que a transformação digital mudou alguns comportamentos, mas as novas tecnologias vão transformar a sociedade. Por isso, precisamos de desenvolver uma visão responsável, ao nível ético e de responsabilidade, com base em duas dimensões: a dimensão social e a dimensão humana. Caso contrário, vamos converter o mundo do futuro em “caixas negras”, que não são transparentes nos resultados, e isso é algo que está nas nossas mãos evitar.
Precisamos de um compromisso forte dos principais vendedores, dos principais parlamentos e das principais empresas para assinar fisicamente (ou não-fisicamente) este contrato ético. Inteligência artificial responsável é uma das práticas internas mais fortes da Accenture. Estamos ativamente a trabalhar com diferentes instituições para construir esta reposta responsável.
Como vê o mercado português? É um mercado onde as startups e os negócios podem prosperar?
Isto é uma surpresa para mim, porque estou habituado às diferentes localizações nos Estados Unidos, em que esses diferentes sítios tentam atrair empreendedores, investidores e startups, e criam ecossistemas de novas ideias e de inovação, nos quais uma em cada 100 empresas se torna um unicórnio. Isso não acontece na Europa. Não temos todos esses diferentes locais. Mas Portugal pode ser um desses locais.
Não é já?
Está no caminho. Mas temos de alinhar mais as instituições académicas, universidades, empresas financeiras, e não apenas o capital privado, as grandes empresas… Ou seja, creio que o ecossistema norte-americano está um pouco mais avançado, mas o ecossistema que podemos criar na Europa pode ser mais consolidado. E estou certo de que Portugal pode ser um dos líderes de topo neste caminho.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Accenture: “Temos de criar DaVincis para o futuro”
{{ noCommentsLabel }}