Do currículo ao LinkedIn. Empresas dão dicas para que seja o candidato escolhido
A candidatura espontânea funciona? É importante apostar no LinkedIn? O ECO foi à feira de emprego da ISCTE Business School falar com os diretores de recursos humanos para responder às perguntas.
A Deloitte tem pedido, em alguns processos de recrutamento, a realização de um pitch. Nele, os candidatos devem dizer quem são e falar um pouco sobre a sua motivação para aquela vaga. Tudo isto de uma forma criativa e cuidada. E, por falar em criatividade, também o currículo deve primar por esta característica.
Os currículos personalizados são, de uma maneira geral, os preferidos dos empregadores. Mas há regras. A dica da EY é fazer o currículo “não pelos olhos do candidato, mas a pensar no que o empregador vai procurar”. Além disso, para os jovens recém-graduados, uma página é mais do que suficiente.
O ECO foi tentar esclarecer, junto dos diretores de recursos humanos de algumas das maiores empresas a operar em Portugal e que participaram na feira de emprego da ISCTE Business School (IBS), as dúvidas de muitos jovens que vão agora iniciar o seu percurso profissional, desde a candidatura espontânea ao perfil no LinkedIn.
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A candidatura espontânea funciona?
É uma das formas de apresentar uma candidatura a determinada empresa, sobretudo quando as organizações em questão não estão em processo de recrutamentos ou não têm vagas adequadas às competências do candidato. Perante este cenário, muitos jovens acabam por “tentar a sua sorte” através da candidatura espontânea, esperando que o seu CV seja guardado numa base de dados para, mais tarde, quando a empresa sentir necessidade, recuperá-lo.
Contudo, muitas vezes, a taxa de sucesso neste tipo de candidatura acaba por não ser tão elevada como o desejado. “Tendo em conta o GDPR [Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados, na sigla portuguesa], que incentiva prazos de retenção mais baixos (até seis meses), esta fonte de recrutamento tem, hoje, uma taxa de sucesso mais diminuta”, explica Carlos Rodrigues, diretor de recursos humanos da Samsung.
Nuno Belo, diretor de recursos humanos da Deloitte, afirma, por sua vez, que, na consultora, “a taxa de sucesso é elevada [no que toca a candidaturas espontâneas], especialmente no recrutamento de recém-licenciados”. Já para os candidatos com mais experiência, esta não é, a seu ver, a melhor forma de candidatura. “O nível de sucesso vai diminuindo à medida que o nível de experiência aumenta”, acrescenta.
Ainda na área da consultadoria, Nuno Simões, diretor de recursos humanos da PwC, salienta que é importante, antes de enviar uma candidatura espontânea, verificar sempre “se a empresa em questão tem já vagas em aberto a que possamos candidatar-nos, de uma forma mais direcionada ao que pretendemos, pois isso irá, certamente, aumentar a probabilidade de sucesso“.
Rita Mendia, diretora de recursos humanos da Boston Consulting Group (BCG), relembra que a candidatura espontânea funciona, mas é preciso que as “pessoas façam o seu trabalho de casa”. “Mandar uma candidatura espontânea para uma empresa a dizer ‘segue o meu CV e as minhas habilitações’ não funciona. Isto porque muitas vezes não há match“, explica.
Mandar uma candidatura espontânea para uma empresa a dizer ‘segue o meu CV e as minhas habilitações’ não funciona. Isto porque muitas vezes não há match.
Para os alunos universitários, Rita Mendia reforça a importância da participação em feiras de emprego, nas quais os estudantes contactam diretamente com as empresas, tendo a oportunidade de perceber como funciona o processo de recrutamento de cada uma delas.
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Qual o modelo de currículo que os empregadores preferem?
O currículo Europass foi, em tempos, o privilegiado e, de facto, a sua grande vantagem é que facilita a comparação entre candidatos, graças à estrutura normalizada. No entanto, um “currículo mais personalizado pode ser um instrumento eficaz, permitindo evidenciar características num candidato que não seriam evidenciadas no Europass”, explica o responsável de recursos humanos da Deloitte.
É unânime entre os recrutadores. O currículo personalizado pode ser, de facto, uma mais-valia, mas é também preciso herdar e manter algumas informações do modelo mais tradicional, como a “informação biográfica, académica, profissional, autoavaliação dos conhecimentos e experiência com software e línguas”, lembra Carlos Rodrigues.
Um currículo personalizado deve manter, assim, algumas regras e o número de páginas é uma delas. “Para alunos recém-licenciados ou mestrados basta uma página. Não faz sentido duas páginas”, até porque os empregadores não estão à espera de ver imensa experiência profissional num candidato que esteja a terminar, ou tenha acabado de terminar, o curso.
“[O currículo] tem de, rapidamente, salientar os achievements e os resultados, com factos bem explicados, de cada pessoa”, aconselha a diretora de recursos humanos da BCG.
"Em vez de escrever a minha biografia, tenho de antecipar respostas a perguntas que sejam significantes para o empregador.”
Margarida Dias, diretora de recursos humanos da EY Portugal, dá outra dica: “O currículo tem de ser feito, não pelos olhos do candidato, mas a pensar no que o empregador vai procurar”. “Em vez de escrever a minha biografia, tenho de antecipar respostas a perguntas que sejam significantes para o empregador”, acrescenta.
Num currículo, “não podem faltar os bullets e as datas”. Além disso, não deve fazer-se um currículo na primeira pessoa. Em vez disso, “deve usar-se uma linguagem neutra e sucinta“. O que os empregadores, de uma maneira geral, querem saber é o nível de qualificação académico ou profissional, a instituição de ensino, os dados básico de informação pessoal e, “sobretudo, do ponto de vista sociodemográfico, o que a pessoa tem feito fora da faculdade”, diz Margarida Dias.
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E o currículo em vídeo?
O vídeo é, de facto, uma forma cada vez mais utilizada em processos de recrutamento, sobretudo em fases mais avançadas, mas a verdade é que, num primeiro contacto com a empresa, não é o formato mais apropriado. “Pode ser uma opção de recrutamento e seleção, mas, na minha opinião, poderá não ser muito útil como candidatura espontânea”, afirma o responsável pela área de recursos humanos da Samsung.
Ainda que Nuno Belo, da Deloitte, partilhe da mesma opinião, conta que, em alguns processos de candidatura mais específicos, a Deloitte tem pedido aos candidatos para fazerem um pitch que sintetize quem são e que revele um pouco sobre a sua motivação para aquela candidatura. “Esses pitchs ajudam-nos, frequentemente, na triagem inicial de candidatos, pelo que recomendamos que sejam preparados de forma cuidada e criativa, sem perder o propósito para o qual estão a ser gravados”.
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LinkedIn: estamos perante um cartão de visita?
Não quer isto dizer, claro, que se deixem de visitar os sites das empresas e procurar vagas em sites de emprego mas, hoje em dia, “o LinkedIn é uma das formas mais poderosas para procurar perfis, estabelecer contactos com potenciais candidatos e publicar anúncios de vagas existentes”, diz Nuno Simões.
O LinkedIn é uma das formas mais poderosas para procurar perfis, estabelecer contactos com potenciais candidatos e publicar anúncios de vagas existentes.
“Eu diria que mais do que um perfil diferenciador, deverá existir um cuidado elevado na elaboração do nosso perfil pois acaba por ser um cartão-de-visita para os recrutadores, tanto numa vertente de análise de candidatos que responderam a um anúncio como nas pesquisas feitas a potenciais candidatos que não estão a procurar ativamente uma nova oportunidade”, continua.
Por isso mesmo – tome nota – o perfil na rede social de trabalho deve estar o mais completo possível e conter informação verdadeira e objetiva, de forma a conseguir destacar claramente a experiência e os pontos fortes do candidato.
Mas este é apenas o primeiro passo. “Após termos garantidos os pontos anteriores, poderemos começar a trabalhar outros aspetos no nosso perfil, por exemplo utilizar palavras-chaves que possam ser alvo de pesquisas pelos recrutadores — de forma a que o nosso perfil surja mais vezes e melhor posicionado nas listagens –, integrar grupos que abordem temas que nos interessam profissionalmente e tentar manter uma participação ativa na partilha de artigos, notícias, por exemplo. Aquilo que nos permita ter uma visibilidade positiva na nossa network“, explica Nuno Simões.
A sugestão da Deloitte passa por pensar no LinkedIn “como uma antevisão de uma história que se tem para contar, com uma série de experiências e acontecimentos que se organizam de forma cronológica e encadeada e que, de certa forma, refletem o profissional que somos num determinado momento”.
Ainda assim, há várias empresas que encaram o LinkedIn como um canal de recrutamento sobretudo para perfis mais seniores. “Para alunos recém-licenciados e focando no recrutamento júnior é, sobretudo, o contacto através das universidades”, diz Rita Mendia.
Na EY Portugal, o cenário é parecido. Contudo, Margarida Dias recomenda a qualquer estudante que esteja a pensar, a curto médio prazo ingressar no mercado de trabalho, ter o seu perfil no LinkedIn. “Mal não faz. Quantos mais elementos de exposição usar, melhor“, afirma. “E só porque eu não consegui nada desta vez no LinkedIn, não quer dizer que exclua a minha conta ou que deixe de atualizar o meu perfil”, acrescenta a diretora de recursos humanos da EY Portugal.
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Soft skills e/ou hard skills?
A chave não está na predominância de uma delas mas sim na integração de ambas. Se, por um lado, as hard skills continuam a ser critérios de seleção absolutamente necessários, por outro, as soft skills são cada vez mais valorizadas num candidato. “As hard skills — excelência académica, capacidade de resolver problemas e capacidade analítica — continuam a ser critérios de seleção e vão continuar a ser sempre”, diz a diretora de recursos humanos da BCG.
Contudo, o mesmo destaque merecem as soft skills, que “são cada vez mais necessárias”. “Um aluno de uma escola de topo e com média de 18, mas que não consiga explicar se pratica um desporto, se faz voluntariado, se é escuteiro ou se intervém ativamente na comunidade — porque não o fez — é uma pessoa que não nos serve. Nós somos muito mais do que uma média, temos de ser pessoas completas, temos de ser capazes de olhar para o próximo. Não estou a querer denegrir o 18 mas, nos dias de hoje, não basta ter apenas o 18″, exemplifica.
Além dos conhecimentos mais académicos, Rita Mendia refere que, atualmente, são precisas pessoas com espírito de equipa, com orientação para resultados, com capacidade de empatizar e comunicar, com proatividade e flexibilidade. “Essas características comportamentais em pessoas tão novas desenvolvem-se, na minha opinião, nas atividades extracurriculares”, acrescenta.
Na Samsung, diz o diretor de recursos humanos, numa primeira fase são avaliados ambas as skills. Contudo, “as soft skills são o elemento diferenciador na fase final do processo”.
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