Dos pontos ao SMN. As três grandes dúvidas de Marcelo sobre os aumentos na Função Pública

Marcelo Rebelo de Sousa deu o seu "sim" ao aumento da base remuneratória da Função Pública, mas disse ter dúvidas sobre diploma, dando até eco a algumas das reivindicações dos sindicatos.

Quase um mês depois de ter sido aprovado em Conselho de Ministros, o aumento da base remuneratória da Função Pública para 635 euros recebeu “luz verde” do Presidente da República. Apesar de ter dito “sim” a esta medida, Marcelo Rebelo de Sousa fez questão de levantar “dúvidas” sobre a “opção política” tomada pelo Executivo de António Costa, fazendo ecoar algumas das reivindicações que têm sido feitas pelos sindicatos.

“Apesar das dúvidas que uma opção política desta natureza sempre suscita, nomeadamente no tratamento similar de situações porventura diversas, na preterição de outros escalões administrativos e na comparação com o salário mínimo nacional, considerando que a não promulgação implicaria mais um sacrifício para uma fração da Administração Pública muito significativa em número e sobretudo em rendimentos recebidos, o Presidente da República promulgou o diploma”, lê-se na nota divulgada no site da Presidência.

Em causa está a concentração dos 50 milhões de euros reservados no Orçamento do Estado para 2019 para valorizações remuneratórias na Administração Pública apenas nos escalões mais baixos. O Ministério das Finanças escolheu, assim, usar esse montante para aumentar a limite salarial mínimo para o valor equivalente à quarta posição da Tabela Remuneratória (TRU), deixando de fora os cerca de “600 mil funcionários” que há dez anos não recebem subidas deste tipo.

Esta medida foi apresentada em dezembro aos sindicatos, tendo gerado fortes críticas e até uma greve geral da Administração Pública.

Poucos dias depois dessa paralisação — e quase um mês após a aprovação do diploma referido em Conselho de Ministros –, o Presidente da República definiu, por fim, a sua posição, dando luz verde ao decreto-lei. Ainda assim, Marcelo Rebelo de Sousa deixou três grandes dúvidas que vão ao encontro de algumas das reivindicações que têm sido feitas pelas estruturas sindicais.

“Tratamento similar de situações diversas”

A primeira preocupação adiantada por Marcelo Rebelo de Sousa é relativa ao eventual “tratamento similar de situações diversas”. Sob esta alçada (e segundo as reivindicações que têm sido feitas pelos sindicatos), cabem pelo menos duas situações: a dos trabalhadores que também chegam à quarta posição da TRU por via da progressão (e não por via administrativa) e a dos trabalhadores que acabaram de entrar na Administração Pública e que passam a receber o mesmo que alguém que tenha feito uma carreira mais longa.

No que diz respeito à primeira situação, estão em causa os funcionários públicos que, reunindo as condições de antiguidade para progredir (dez pontos) chegarão, este ano, à quarta posição da TRU. Gastam, deste modo, os seus créditos, mas ficam na mesma posição remuneratória que aqueles abrangidos pela atualização administrativa da base salarial.

As estruturas sindicais têm defendido que estes funcionários deveriam manter esses dez pontos, permitindo o seu uso na passagem da nova base remuneratória para o escalão seguinte (683 euros).

A propósito dos pontos, quem chegar aos 635 euros pela via administrativa também usa (e perde) esses créditos. De acordo com os sindicatos, esse “apagão” coloca no mesmo nível trabalhadores que tenham acabado de entrar para a Função Pública (e que tenham conquistado apenas um ponto) e funcionários que já tenham uma carreira, por exemplo, de nove anos (e que tenham acumulado, por exemplo, nove pontos).

“Preterição de outros escalões administrativos”

A partir deste ano, a base remuneratória da Função Pública passa para o valor equivalente ao quarto escalão da TRU, extinguindo-se essas três primeiras posições.

Segundo têm defendido os sindicatos, essa concentração devia ser acompanhada por uma revisão da TRU de modo a garantir a hierarquia nas carreiras e a valorizar também os restantes funcionários. O Executivo não tem, contudo, mostrado flexibilidade para satisfazer essa reivindicação.

Apesar desta posição do Governo, Marcelo Rebelo de Sousa nota que a “preterição de outros escalões administrativos” é um dos pontos mais frágeis desta proposta.

“Comparação com salário mínimo nacional”

A remuneração mínima mensal garantida subiu, este ano, de 580 euros para 600 euros. O valor chegou a ser negociado pelo Executivo com os parceiros sociais, mas acabou por fazer caminho sem que fosse conseguido um consenso.

Na mesma noite em que Vieira da Silva anunciou, à saída da reunião da Concertação Social, esse aumento, o Ministério das Finanças colocou em cima da mesa a subida do salário mínimo da Administração Pública para 635 euros, ou seja, 35 euros acima do valor que acabava de ser estabelecido para guiar todo o país.

Na ocasião, o ministro do Trabalho fez questão de sublinhar que essa diferença não coloca em causa o princípio da “universalidade” do salário mínimo, já que o Estado (como qualquer empresa) é livre de definir e negociar a remuneração mínima que considerar adequada.

Esta terça-feira, Vieira da Silva foi ainda mais longe, sublinhando que o Estado nem sequer é o único empregador nacional com um patamar remuneratório mínimo superior ao salário mínimo nacional. “Em 2018, 50% das convenções coletivas que foram acordadas entre sindicatos e patrões fixaram salários mínimos acima dos 580 euros”, disse o governante, lembrando os números que já tinham sido adiantados em janeiro.

Apesar destas justificações, certo é que a comparação entre a base remuneratória da Função Pública e a remuneração mínima garantida nacional constitui uma das três grandes dúvidas deixadas por Marcelo Rebelo de Sousa sobre este decreto-lei.

Ainda sobre este ponto, é importante notar que o Ministério das Finanças avançou aos jornalistas que dos 50 milhões de euros que tinham sido reservados, 20 milhões de euros serão usados para concretizar a atualização dos salários em linha com o novo salário mínimo nacional (600 euros). Os restantes 30 milhões servem para o aumento de 35 euros da base remuneratória em relação ao SMN (quer por via das progressões, quer por via administrativa).

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