Há 542 benefícios fiscais em Portugal. Mas 127 não se sabe para que servem
Grupo de trabalho fala em "aparente facilitismo" na criação de benefícios fiscais em Portugal. Em 23% dos benefícios que existem, os autores do estudo não conseguiram encontrar objetivos extrafiscais.
Em Portugal existem 542 benefícios fiscais, revela o relatório do Grupo de Trabalho dos Benefícios Fiscais em Portugal que é apresentado esta segunda-feira. Em quase um quarto dos benefícios fiscais identificados pelos autores não foi percetível para que servem estas ajudas fiscais aos contribuintes.
O número total de benefícios tinha sido avançado há cerca de um mês pelo ministro das Finanças, Mário Centeno, no Parlamento. O relatório do grupo de trabalho acrescenta que a maior parcela (147) são atribuídos em sede de IRS. O que representa a maior despesa fiscal é a dedução à coleta em sede de IRS que corresponde a uma dedução de 35% das despesas gerais familiares. Só nesta dedução, o Estado deixa de receber 1.435,39 milhões de euros, apontam o estudo, a que o ECO teve acesso, que será apresentado no Porto pelos seus autores e pelo Governo. A segunda maior fatia de benefícios vai para as empresas (121), com ajudas na hora de pagar IRC.
No entanto, metade dos contribuintes singulares não paga IRS e um terço das empresas não paga IRC o que limita a eficácia dos benefícios, já que uma franja considerável dos contribuintes não pode ter acesso a estes apoios que são concedidos por imposto.
Para esta lista de 542 benefícios foram considerados os que existiam no ordenamento jurídico em Portugal à data da criação do grupo de trabalho, isto é, em 2018. Isto significa que de fora da análise ficou uma das bandeiras políticas do Orçamento do Estado para 2019 que foi a criação de um programa de incentivo fiscal para promover o regresso dos emigrantes.
No entanto, os benefícios fiscais atribuídos pelas assembleias municipais não foram analisados pelo grupo de trabalho coordenado por Francisca Guedes de Oliveira, professora na Católica Porto Business School. Isto significa que de fora ficaram os benefícios fiscais oferecidos em sede de Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI).
A maior parte dos benefícios fiscais traduzem-se em isenções tributárias (330) e, em relação a quase um quarto (23% ou 127), os autores não identificaram objetivos extrafiscais, ou seja, que vão além do simples alívio no pagamento de imposto. Esta avaliação tem como objetivo avaliar as motivações para a criação dos benefícios fiscais.
Estes números fazem parte da lista de nove problemas principais identificados pelos 13 autores do estudo. No relatório, os especialistas apontam para um “aparente facilitismo” na criação de benefícios fiscais em Portugal, e sugerem que haja uma metodologia para a criação de futuros benefícios fiscais e monitorização dos que existem. Esta última fase dividir-se-ia em duas fases: o acompanhamento enquanto está em vigor e a avaliação próxima da caducidade do benefício fiscal.
A multiplicação de benefícios fiscais mostra o facilitismo aparente na criação dos benefícios fiscais. Os benefícios estão espalhados por mais de 60 diplomas legais.
Os autores referem ainda que, embora exista um Estatuto dos Benefícios Fiscais, “um número muito significativo” de benefícios está disperso por “legislação avulsa”. Os benefícios estão espalhados por mais de 60 diplomas, avança o relatório.
A existência de “juízos subjetivos” na classificação de um benefício fiscal, as diferenças de métodos de cálculo da despesa fiscal de documento para documento e as dúvidas quanto à contagem do prazo de caducidade de benefícios fiscais que são alterados durante o período de vigência são outros dos pontos negativos na fotografia que os especialistas tiraram aos benefícios fiscais em Portugal.
Especialistas divergem na necessidade de atribuir despesa fiscal aos ministérios
Além disso, foi identificado outro problema nos benefícios fiscais que é a ausência de uma classificação orgânica e funcional dos mesmos que permita perceber a que ministério ou função do Estado está atribuído o benefício. Apesar de fazer parte da lista de principais problemas, este não reuniu o consenso de todos os autores do Estado, revela o relatório numa nota de rodapé. “Os benefícios fiscais são parte integrante do sistema fiscal e a conceção e execução da política fiscal constituem uma atribuição do Ministério das Finanças”, argumentam alguns dos autores do estudo.
No entanto, os autores avançam uma solução para esta questão (fazendo nota outra vez da discordância de uma parte dos autores). “Fica claro que deve haver um enquadramento orgânico nos ministérios e funcional dos benefícios fiscais propostos que contribua para uma responsabilização transversal pelo controlo da despesa pública. Ao não serem imputados aos ministérios, os benefícios fiscais funcionam como bandeiras de política de um determinado ministério sem a correspondente responsabilização pelos seus custos.”
Ainda na lista de problemas, os autores do Estado elencam o facto de a apresentação dos benefícios fiscais no Orçamento do Estado não ser clara e “pode distorcer a perceção quanto à dimensão do Estado” e a dificuldade de levantamento de informação sobre benefícios fiscais.
Assine o ECO Premium
No momento em que a informação é mais importante do que nunca, apoie o jornalismo independente e rigoroso.
De que forma? Assine o ECO Premium e tenha acesso a notícias exclusivas, à opinião que conta, às reportagens e especiais que mostram o outro lado da história.
Esta assinatura é uma forma de apoiar o ECO e os seus jornalistas. A nossa contrapartida é o jornalismo independente, rigoroso e credível.
Comentários ({{ total }})
Há 542 benefícios fiscais em Portugal. Mas 127 não se sabe para que servem
{{ noCommentsLabel }}