A economia está abrandar, as empresas a adiarem investimentos e o pessimismo tem provocado oscilações nos mercados. Os próximos meses vão ser decisivos. Veja aqui ao que deve estar atento.
Com a economia a abrandar e os receios a aumentarem, os próximos meses vão ser determinantes para perceber se a economia mundial vai entrar em recessão ou se foi só um percalço. Mas para isto também será necessário saber como (e se) os principais governos e os bancos centrais vão agir para tentar evitar males maiores. Nas próximas semanas há vários indicadores e reuniões a ter em conta. Veja aqui a que deve prestar atenção.
O PIB, as previsões económicas e o impacto orçamental
O que ver: Os indicadores avançados para os principais blocos económicos, os valores do PIB entretanto revelados e as previsões económicas das principais instituições.
Razões para ver: A melhor forma de medir o pulso à economia é ver quanto cresce o PIB, mas nem sempre esse valor está disponível. E, numa altura em que engrossam as vozes da chegada de uma nova crise, é preciso começar a olhar para os indicadores que antecipam o comportamento da economia. Um deles é produzido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico. O indicador avançado compósito de agosto mostra um abrandamento para os EUA, Alemanha e Zona Euro. Além disso, os economistas seguem de perto o que efetivamente acontece.
Em tempos de possível viragem é fundamental olhar para as taxas de variação em cadeia, que comparam um trimestre com o imediatamente anterior, e ver o que se passa face ao mesmo período do ano anterior. Na Zona Euro, por exemplo, no segundo trimestre — o último dado conhecido — o PIB cresceu 0,2%, metade do observado no arranque do ano. Os dados do terceiro trimestre, que são conhecidos em novembro, serão fundamentais para saber se o espaço do euro volta a recuperar ou se a tese da crise ganha mais força. Os economistas vão estar particularmente atentos ao que se passa na Alemanha. Será que o coração da economia europeia entrou em recessão? É a pergunta na cabeça de economistas, investidores e políticos. A juntar a estes indicadores, a Comissão Europeia, o FMI e a OCDE atualizam previsões em outubro e novembro. Os governos dos vários países vão estar particularmente atentos a estes números. Uma economia em crise dita menos receitas fiscais e mais despesas com subsídio de desemprego. E podem ser úteis na hora de tomar decisões de política orçamental. Na Alemanha, por exemplo, o Governo discute se o pacote de medidas de resposta às alterações climáticas pode ser financiado com mais dívida pública.
Quando ver:
- Início de novembro (ainda sem data marcada) — A Comissão Europeia publica novas previsões económicas.
- 14 de novembro — A Comissão divulga a primeira estimativa para o PIB da Zona Euro referente ao terceiro trimestre do ano. Neste dia saem também dados para a Alemanha.
Um mundo conturbado
O que ver: As negociações entre os Estados Unidos e a China, entre o Reino Unido e a União Europeia e nova orientação do governo italiano.
Razões para ver: Incerteza e riscos políticos são termos habituais em todos os relatórios das principais organizações internacionais, nos comentários dos analistas e nos discursos dos políticos quando surgem nuvens negras na economia. Até ao final de outubro, a agenda será muito preenchida no que à política diz respeito.
- Brexit: Era a 29 de março, passou para 12 de abril e depois para 31 de outubro. Quanto mais se aproxima a data de saída do Reino Unido da União Europeia, maior é a incerteza sobre como essa saída irá acontecer (ou se será adiada novamente). As dúvidas sobre o futuro da economia britânica – que entrou em contração no segundo trimestre — e a sua relação com a União Europeia há muito que pesam na economia europeia e ausência de perspetivas de uma saída com acordo motivou vários países da União a prepararem-se para um Hard Brexit.
- Guerra comercial: Na frente da batalha estão os Estados Unidos e a China, mas a guerra comercial encetada por Donald Trump está a ter impactos globais. México e Canadá já foram alvos de restrições, assim como vários países asiáticos – entre eles a Coreia do Sul e o Japão, que começaram a sua própria disputa – e a ameaça de mais taxas sobre a União Europeia também já pesa, em especial sobre a Alemanha, cuja economia já está em contração. Numa altura em que qualquer movimento pesa nos mercados, o foco está em Washington, onde ainda não há certezas sobre se a reunião entre os responsáveis norte-americanos e chineses (e que estava prevista para este mês) se irá realizar mesmo. O novo calendário aponta para outubro.
- Novo governo em Itália: É a terceira maior economia da Zona Euro, mas o Governo populista eleito em 2018 criou uma grande incerteza sobre o futuro da economia italiana. Com a segunda maior dívida da União Europeia, Itália tem furado as metas orçamentais exigidas por Bruxelas e não tem demonstrado um plano claro para estimular uma economia que está estagnada. Com a saída de Matteo Salvini e da sua Liga do Norte do Governo, e a entrada do mais moderado Partido Democrático – que se juntou ao Movimento 5 Estrelas – espera-se agora uma posição mais alinhada com a Europa, mas muito vai depender do próximo Orçamento.
- Alemanha: A maior economia europeia, e quarta maior do mundo, já está em contração devido ao abrandamento do comércio internacional e por terras germânicas já se levantou a hipótese de serem implementados estímulos à economia. Mas se há coisa que os alemães são zelosos é do seu equilíbrio orçamental e já houve quem colocasse água na fervura. O Orçamento germânico vai começar a ser discutido em breve, o que vai permitir perceber afinal como Angela Merkel e Olaf Scholz pretendem responder às dificuldades que a economia alemã enfrenta.
- Nova Comissão Europeia: There’s a new sheriff in town… mas ainda não se sabe bem o que quer. Ao contrário dos cabeças-de-lista pelos principais grupos políticos europeus, Ursula von der Leyen era praticamente uma desconhecida até os líderes europeus acordarem nomeá-la como solução de recurso para a presidência da Comissão Europeia. Ser escolha de última hora fez com que a antiga ministra da Defesa alemã fosse nomeada sem ter um programa, e esta terça-feira permitiu perceber um pouco do que von der Leyen quer que a Europa seja nos próximos cinco anos ao anunciar as pastas dos seus comissários. Mas ainda falta um programa completo e até perceber como a nova Comissão vai funcionar.
Quando ver:
- Ursula von der Leyen deverá tomar posse com a nova equipa a 1 de novembro. Depois disso, há o famoso discurso do Estado da União e as novas previsões económicas da Comissão Europeia para apresentar.
- Ainda sem data estão as reuniões entre os responsáveis chineses e a Administração norte-americana em Washington, mas estava prevista para setembro.
Uma curva de rendimentos invertida
O que ver: as taxas de juro cobradas pelos investidores para deter dívida pública dos Estados Unidos a três meses serem superiores às taxas cobradas pela dívida a dez anos.
Razões para ver: É um indicador que historicamente não falha e ao qual os investidores, especialmente nas bolsas, prestam muita atenção. Em teoria (e habitualmente), os investidores exigem um juro mais elevado pela dívida a mais longo prazo, o que reflete o risco e o custo de ter o capital parado durante mais tempo. O cenário muda quando há receios de que a economia venha a travar, no futuro próximo, com os investidores a fugirem da dívida de mais curto prazo, o que leva a um aumento das taxas.
Nos Estados Unidos, esta inversão da curva de rendimentos antecipou todas as recessões nos últimos 50 anos, incluindo a crise financeira de 2008. Só por uma vez a curva inverteu sem que a maior economia do mundo tenha entrado em recessão, mas mesmo nesse caso a economia norte-americana abrandou de forma pronunciada. Sendo um indicador a que os investidores prestam muita atenção, e que pode levar a dias de pessimismo nas bolsas, a verdade é que este comportamento também está afetado pela compra de dívida de longo prazo pela Reserva Federal dos Estados Unidos, podendo limitar o seu uso.
O abrandamento que se sente nas principais economias mundiais está a fazer com que as empresas adiem investimentos e isso está a ter reflexo na economia. Esse abrandamento levou a Reserva Federal norte-americana a cortar a taxa de juro de referência em julho passado em 0,25 pontos percentuais – o primeiro corte desde dezembro de 2008 — e, de acordo com o Wall Street Journal, já há discussões para que volte a fazer um corte na mesma dimensão na reunião de dia 18 deste mês, apesar dos votos contra a decisão na última reunião.
Na Europa, já é ponto assente que o Banco Central Europeu (BCE) vai avançar com novos estímulos. Mario Draghi avisou, em meados de junho, no seu discurso no Fórum do BCE em Sintra, que caso a economia europeia não melhorasse a instituição ia avançar com novas medidas e que nenhuma hipótese estava fora do baralho, incluindo novas reduções na taxa de juro. Na última reunião antes do verão, Draghi disse que “as perspetivas económicas estão cada vez piores” e “o Conselho de Governadores está determinado a agir”. Entretanto, saíram dados que demonstram um abrandamento da economia na zona euro, uma contração na Alemanha e estagnação em Itália.
Quando ver:
- Na quinta-feira o BCE anuncia as suas decisões sobre taxas de juro (e outras medidas de estímulo que venha a tomar durante a reunião)
- No dia 18 é a vez de Jerome Powell anunciar as decisões da Reserva Federal no mesmo sentido.
A incerteza transforma-se em pessimismo?
O que ver: se a produção continua a abrandar ou a cair, e se o consumo privado começa a acompanhar a tendência.
Razões para ver: Fala-se muito das incertezas e do impacto que têm na economia, mas como se verifica um sentimento? Felizmente em economia há todo um vasto leque de dados que permite tomar o pulso aos diferentes agentes económicos. O efeito incerteza provocado pela guerra comercial, por exemplo, tem deixado as empresas mais pessimistas e estas produzem menos, adiam decisões de investimento e essas decisões têm impacto na economia.
Até agora, os problemas do lado da oferta ainda não passaram para o lado da procura, o que faz com que a economia esteja a abrandar, mas ainda não em recessão. Se os receios dos investidores e das empresas passarem para os consumidores, a travagem nas compras pode levar a um círculo vicioso: os consumidores gastam menos devido às perspetivas pouco animadoras; as empresas perdem receitas e são obrigadas a dispensar trabalhadores; os consumidores perdem rendimento e reduzem ainda mais os gastos; e o círculo autoalimenta-se levando a uma queda na economia.
A parte da oferta já tem demonstrado alguns sinais negativos, com a queda na produção industrial e o abrandamento do investimento. Os próximos dados sobre o sentimento económico, a confiança dos consumidores e a produção industrial vão permitir perceber se a economia global consegue escapar a este círculo ou se pode estar mesmo a caminhar para uma recessão.
Quando ver:
- Na segunda metade de setembro serão conhecidos os dados sobre a produção industrial, o sentimento económico e as vendas a retalho na China e o sentimento económico na Alemanha.
O impacto no emprego
O que ver: As perspetivas de criação de emprego, a evolução do PIB e a taxa de desemprego. Um aumento brusco na taxa de desemprego, mesmo que a partir de uma taxa baixa.
Razões para ver: Quando as economias abrandam, ou mesmo quando as previsões de crescimento pioram, as empresas investem menos na expectativa de que a procura vai desacelerar. Esta é uma primeira fase de reação perante cenários de abrandamento. Para acompanhar estes desenvolvimentos há dois indicadores relevantes a seguir. Um deles consta dos indicadores de sentimento económico e de confiança — nas perguntas feitas aos empresários nestes inquéritos tanto o Eurostat como o Instituto Nacional de Estatística (INE) em Portugal incluem uma questão específica sobre as perspetivas de procura nos próximos meses. Mas nem sempre estes desenvolvimentos chegam ao mercado de trabalho. E, por isso, num cenário de crise, é preciso acompanhar também as respostas dos empresários sobre perspetivas de criação de emprego. Por fim, os investidores e economistas olham para a taxa de desemprego, que mede quantas pessoas, entre as que querem trabalhar, não têm emprego. Os manuais de economia dizem que o mercado de trabalho demora nove meses a reagir aos desenvolvimentos económicos e, por isso, para já é natural que as atenções se concentrem nas respostas dos empresários sobre perspetivas de procura e de criação de postos de trabalho. Os últimos dados do Eurostat revelam que em julho a taxa de desemprego no bloco do euro foi de 7,5% e as últimas previsões de Bruxelas ainda falavam de crescimento económico assente numa criação sólida de emprego.
Quando ver:
- No final do mês, o Eurostat publica a taxa de desemprego referente a agosto para todos os países da União Europeia
- A 4 de outubro o Departamento do Trabalho dos EUA volta a publicar dados sobre a criação de emprego na maior economia do mundo.
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